Quarta, 25 de
setembro de 2013
Por Ivan de Carvalho

Isso estará fazendo vibrar todas as
patrulhas petralhas das redes sociais, mas também, muito provavelmente,
enchendo de orgulho (um sentimento que não costuma ser bom) brasileiros
corações.
O
nacionalismo, com o discurso de ontem em Nova York, estará emocionando milhões
de brasileiros, embevecidos pelo que não faltará quem qualifique de “coragem”
presidencial, embora a emoção, com certeza, esteja apenas na plateia.
E
há combustível farto para essa emoção. Leio que o bravo discurso da nossa brava
presidente entrou ao vivo no alto da “home” do site do The New York Times e também recebeu cobertura ao vivo de outros
sites, incluindo da Fox News e da CNN. Os canais CNN Internacional e BBC World
transmitiram parte expressiva do pronunciamento da chefe de Estado brasileira.
Também foi manchete no Guardian, o
jornal britânico que lidera as denúncias de espionagem eletrônica americana
baseadas na documentação obtida por Edward Snowden, corajoso com certeza.
Também
houve as qualificações que ornamentaram o discurso. Traduzido, o Guardian, como conta Nelson de Sá no
blog Toda Mídia da Folha.com, o
chamou de “contundente”, tuite de âncora da BBC o batizou de “virulento”, o
correspondente do The New York Times no Brasil disse que a presidente usou
“palavras fortes” e o correspondente da CNN as qualificou de “ásperas”. O que
mais poderia querer a grande plateia de 200 milhões de brasileiros?
No picadeiro, ou, para que não se diga
que estou abusando das palavras, na arena cujo centro é o Palácio do Planalto, tudo
é cálculo e projeto. O governo faz emergir do episódio o nacionalismo e isso
vem dando uma contribuição especial ao esforço de recuperação da popularidade
da presidente e da aprovação do governo, depois do grande tombo consumado no
final de junho.
Mas não é só desse cálculo e desse
projeto que vivem o governo e seu partido, o PT. Dilma anunciou ontem à
Assembléia Geral da ONU que vai apresentar “propostas para o estabelecimento de
um marco civil multilateral” sobre o uso da Internet e afirmou que a ONU deve
estar à frente do esforço para “evitar que o espaço cibernético seja instrumentalizado como arma de
guerra, por meio da espionagem, da sabotagem, dos ataques contra sistemas e
infraestruturas de outros países”.
E
ela disse outras coisas bonitas (está tudo na mídia) a respeito dos princípios
que devem nortear a “neutralidade da rede” – não é a de Marina Silva, que tem
sido alvo de um grande esforço para atrapalhar –, mas todo esse floreio verbal
se pode resumir na idéia já lançada antes pela presidente de que deve ser
criada uma “governança”, uma “estrutura internacional” com “organismos
multilaterais” para regular (leia-se também, por inseparável do verbo regular,
controlar) a Internet, pois outra coisa essa governança não teria mesmo a
fazer. E quem deve liderar o esforço para que o que a presidente quer venha a
acontecer? Como ela propôs ontem, a ONU, que é formada por representantes
indicados pelos governos. Trocando em miúdos: a proposta é de que os governos,
para isso instrumentalizando a ONU, se apoderem definitiva e formalmente da
Internet. Os Estados Unidos, perdão, “o Império”, é contra isso, o Google
também, mas, curiosamente, também são contra organizações como o WikiLeaks e
seu fundador, Julian Assange, que os Estados Unidos querem botar na cadeia.
O
pior, no entanto, é o projeto do Palácio do Planalto com as exigências de
resguardar informações do Brasil pelas empresas no Brasil (não fora daqui), o
que daria ao governo brasileiro, eventualmente, acesso aos dados relacionados
às comunicações eletrônicas das pessoas feitas no Brasil ou entre pessoas deste
e de algum outro país. E assim em cada país, como já ocorre, por exemplo, na
China, que tem uma rede social própria, que monitora.
Coisa
totalitária, esse negócio da China.
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Este artigo foi publicado
originariamente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista
baiano.