Domingo, 28 de junho de 2015
Apesar das negativas do secretário de
Transportes na gestão de Agnelo Queiroz (PT), os parlamentares estão
convencidos de que o certame foi prejudicial aos cofres públicos
Daniel Cardozo — Jornal de Brasília
O depoimento de Galeno Furtado na CPI dos Transportes confirmou
boa parte das suspeitas dos deputados distritais. O ex-presidente da
comissão de licitação disse ter sido influenciado pelas orientações do
advogado Sacha Reck, que também teria ligação com a empresa que elaborou
o edital. Apesar das negativas do secretário de Transportes na gestão
de Agnelo Queiroz (PT), os parlamentares estão convencidos de que o
certame foi prejudicial aos cofres públicos e à qualidade do sistema.
Mesmo com o recesso parlamentar durante o mês de julho, a
Câmara Legislativa chega perto de atestar as fraudes no processo de escolha das
empresas que vão operar o transporte pelos próximos dez anos. A exemplo da CPI
de Curitiba, que recomendou a anulação da escolha das empresas, os distritais
querem fazer o mesmo no Distrito Federal e já veem grande possibilidade de isso
acontecer.
Depoimentos
A CPI colheu depoimentos conclusivos. Nas semanas
anteriores, foram chamados ex-servidores do DFTrans e da Secretaria dos
Transportes e o empurra-empurra na responsabilidade irritou os integrantes da
comissão. Enquanto os nomes do governo passado se eximiram da responsabilidade,
os atuais gestores se limitaram a fazer avaliações técnicas do sistema. Assim,
os depoimentos de Galeno Furtado e José Walter Vasquez trouxeram expectativa.
O primeiro deles precisou ser convocado quatro vezes para ir
até a Câmara prestar esclarecimentos. Os distritais aprovaram a primeira
convocação há duas semanas, mas o ex-presidente da comissão de licitação alegou
estar nos Estados Unidos.
Em depoimento na última quinta-feira, Furtado admitiu
conhecer a ligação de Sacha Reck com a empresa que realizou o edital. Ainda
assim, ele garantiu que recebeu pareceres favoráveis da Procuradoria do DF para
a continuidade.
A afirmação causou estranheza nos membros da CPI. O relator,
deputado Raimundo Ribeiro (PSDB), avaliou o caso como uma situação atípica.
“Tenho a impressão de que os procuradores foram induzidos ao erro”, disse.
Inexperiência pode ter sido
estratégica
O ex-presidente da comissão de licitação demonstrou
arrependimento ao aceitar o cargo. Até então, Galeno Furtado nunca havia
desempenhado a função. Os deputados suspeitam que a falta de conhecimento teria
sido estratégica para direcionar a concorrência a determinados grupos
econômicos.
O presidente da CPI, deputado Bispo Renato (PR) afirma que
já é possível chamar a licitação de “fraude de cartas marcadas”. E isso só foi
possível graças à atuação de Furtado. Ainda assim, o parlamentar crê na
boa vontade do depoente de colaborar. “Ele não procurou esconder o que estava
acontecendo. Mas parece pelos depoimentos que ele era uma marionete, que estava
sendo comandado por alguém e não tinha, ainda que seja economista, muita
realidade daquilo que estava fazendo. Até hoje, Galeno parece não ter muita
noção do que aconteceu”, avaliou.
Mesmo diante das irregularidades e de ter sofrido ameaças, o
responsável pela licitação seguiu adiante e não cancelou o certame. A quebra
dos sigilos fiscal e telefônico de Galeno Furtado foram autorizados.
Celina
Leão culpa governo passado
Os responsáveis por
defender o caso na Procuradoria também foram convidados a falar. Os advogados
revelaram episódios curiosos sobre a licitação.
A Secretaria de
Transportes teria quebrado o protocolo comum a casos dessa natureza, já que
Sacha Reck - designado apenas como consultor - era quem repassava as
informações técnicas utilizadas na batalha judicial travada. Foram mais de 200
liminares contra o processo licitatório. Apesar de terem sido negadas as ações
que pediam paralisação imediata da licitação, o mérito do caso ainda tramita na
Justiça e o certame pode ser inviabilizado, uma vez que os processos ainda
estão sendo avaliados.
Investigação
Os parlamentares já
convidaram vereadores de Curitiba que participaram de uma CPI similar. A
presidente da Câmara, Celina Leão (PDT) já vinha em contato com eles após
descobrir que os mesmos envolvidos atuaram de maneira parecida no edital da
cidade. Segundo a distrital, a capital paranaense era conhecida como modelo de
sistema de mobilidade urbana, mas os novos contratos trouxeram prejuízo
financeiro e menor eficiência na operação.
As suspeitas de
irregularidades começaram há mais de dois anos. Por isso mesmo, Celina quer uma
investigação rigorosa para comprovar a culpa dos gestores do governo passado, o
qual a deputada fazia oposição. “O GDF teve todas as condições do mundo de
suspender essa licitação e fazer um processo sério. Quando começamos a alertar
os problemas que haviam, a licitação ainda não havia sido assinada. Isso mostra
o caráter e a intenção de cometer o crime”, criticou.
Ex-secretário
defende licitação
Os supostos avanços
da licitação foram defendidos com unhas e dentes pelo ex-secretário de
Transportes, José Walter Vasquez. O depoimento à comissão contou até com
apresentação de slides e mostrou dados sobre as condições anteriores e atuais
do sistema: ganho em número efetivo de veículos rodando, menos poluição e mais
acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida teriam sido as vantagens da
nova operação.
Apesar da redução
oficial de 860 veículos, a nova operação teria mais ônibus, porque as quebras
seriam minimizadas. “Tinha empresário com 80 carros novos escondidos, enquanto
colocava para rodar apenas ônibus velhos”, criticou o ex-secretário.
O ex-secretário negou
ter recebido influência de autoridades. “Ninguém queria se aproximar, porque
essa licitação era considerada um fracasso certo”, disse.
Tempo
de viagem
Ainda assim,
Vasquez admitiu que faltou fazer as mudanças adequadas para que o sistema
mudasse de lógica. Segundo ele, apenas a troca da frota não seria suficiente
para aumentar a qualidade do transporte coletivo. Os planos do governo de
Agnelo Queiroz (PT) eram fazer com que os passageiros se acostumassem com viagens
com baldeações, ao invés de ir de um ponto a outro. “A troca de ônibus não é
confortável para ninguém, mas se o usuário comprasse essa ideia, retribuiríamos
com menor tempo de viagem”, explicou.
Vasquez chegou a
defender que, caso confirmadas as irregularidades, as empresas que fraudaram a
concorrência sejam excluídas.
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília