Da Tribuna da Imprensa Sindical
José Carlos de Assis
O
FMI e o Departamento do Tesouro norte-americano atuam como alguns
agentes da CIA: acham que tem direito de matar. Nas últimas quatro
décadas, e de forma acentuada a partir da crise financeira ocidental de
2008, milhões de pessoas no mundo sofreram as consequências mortais das
políticas de “austeridade” fiscal impostas por essas instituições aos
países do euro e em desenvolvimento do ocidente, incluindo o Brasil.
Agora, uma vez executada a matança, alguns de seus próceres reconhecem
que estavam errados.
Num
texto que seria apenas curioso caso não escondesse uma tragédia,
Olivier Blanchard, ex-economista chefe do Fundo, e Lawrence Summers,
secretário do Tesouro do presidente Clinton, ao examinarem as políticas
de estabilização depois da crise de 2008, chegam à conclusão espantosa
de que teria sido necessário apelar para políticas monetárias e
principalmente fiscais mais ativas – ou seja, expansão dos gastos
públicos e da dívida pública para favorecer a retomada da economia, no
velho estilo de Keynes.
A
propósito, o nome do artigo, “Repensando a Política de Estabilização.
De volta ao futuro”, insinua claramente uma inspiração keynesiana. A
restrição a uma volta completa vem do óbvio, ou seja, do reconhecimento
da extrema complexidade do sistema financeiro atual. Diante dela, os
dois economistas não tem prescrição segura como tinham antes. Deixam no
ar a possibilidade de novo colapso da economia mundial por força de
choques financeiros à margem de medidas de prevenção. Lembro-me da
Rainha da Inglaterra: “Mas ninguém previu essa crise”?
Desde
a emergência avassaladora do neoliberalismo, assumida por políticos e
tecnocratas de todo o mundo ocidental, que a redução dos gastos públicos
e a consolidação fiscal – estabilização ou redução da dívida pública –
tem sido a pedra de toque das políticas econômicas. Bastaria isso e mais
a plena liberdade da política monetária e estaríamos no melhor dos
mundos, com crescimento seguro e sem sobressaltos. Houve a crise de
2008, sim, mas, depois do choque, ela seria gradualmente absorvida por
conta da retomada da economia.
Sabemos
agora, não por dedução lógica mas por simples apuração de dados, que
tudo isso é falso. A área do euro continua em crise profunda, fora a
Alemanha. E justificadamente a Alemanha, porque altamente favorecida
pela moeda única e pela primazia do superávit externo, submeteu os
demais países europeus a uma disciplina férrea do tipo redução drástica
do gasto público e consolidação da dívida. O fracasso dessas políticas
tem sido óbvio, porém, entre nós, ainda não reconhecido pelos vassalos
do capital financeiro, seus principais beneficiários, que agora perdem
sua base ideológica no primeiro mundo.
Summers
e Blanchard fazem recomendações de política que trazem para a ordem do
dia as políticas desenvolvimentistas da Europa no pós-guerra,
responsáveis pela construção do mais elevado patamar civilizatório da
história, as economias de bem-estar social. Isso, em grande parte, foi
destruído pelo neoliberalismo em vários países da Europa, notadamente
Grécia, Espanha, Itália e mesmo a França. E o mantra resistente nessa
saga foi controle de gastos públicos e consolidação da dívida, ou seja,
redução e estabilização dela.
Se
Meirelles tivesse informação e critério na condução da política
econômica, e não o compromisso com o descarado favorecimento ao capital
financeiro, era o momento de o Governo recuar da infame lei de teto
orçamentário, da reforma da Previdência, da taxa de juros vergonhosa, e
da absoluta subordinação aos interesses do sistema financeiro,
contrariando as teses dos dois eminentes economistas arrependidos. Para
tudo isso, e sobretudo para liberar o desenvolvimento, haveria a
cobertura ideológica desses eminentes pensadores, tradicionalmente com
grande escola no Brasil. É o momento dos que foram condenados à morte
pelas política neoliberais reagirem.