OPERAÇÃO CONTENÇÃO, COP30 E ESTADO NACIONAL SEM INSTITUCIONALIZAÇÃO
“Tudo é grande na Inglaterra, mesmo o que não é bom, mesmo a oligarquia. O patriciado inglês é o patriciado, no sentido absoluto da palavra. Não há feudalismo mais ilustre, mais terrível e mais vivaz. Cumpre dizer que esse feudalismo foi por vezes útil. É na Inglaterra que este fenômeno, a Nobreza, deve ser estudado, da mesma maneira que é na França que se deve estudar este outro fenômeno, a Realeza. O verdadeiro título deste livro deveria ser a Aristocracia.” (Victor Hugo, “O Homem que Ri”, 1869).
O que significa a institucionalização de um Estado Nacional?
Por toda a História do Brasil, que começa com a chegada de Tomé de Sousa em Salvador, em março/1549, com cerca de mil pessoas, constituindo o Governo-Geral, instituindo quatro órgãos: governador-geral, capitão-mor da costa, ouvidor-mor e provedor-mor, até novembro/1930, com a designação de Getúlio Vargas para presidente do Governo Provisório, nosso País, excetuando o Ministério dos Negócios Estrangeiros, de novembro/1823, nada mais teve do que o desdobramento pelo volume de atividades e pela necessidade de gestão dos mesmos quatro órgãos fruto do Regulamento de D. João III, 15º rei de Portugal (1521-1557).
O Capitão-mor da Costa passou ao Ministério da Marinha e se desdobrou para defesa dos limites terrestres do Brasil em Ministério da Guerra. Também o Provedor-mor, com aumento das atividades econômicas da colônia, constituiu na chegada de D. João VI, o Banco do Brasil, posteriormente, em julho/1860, a Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, e o Ouvidor-mor estendeu-se com um Tribunal de Justiça.
O Brasil antes de Getúlio Vargas era um Estado privatizado. E voltou a o ser, em março/1979, com a posse de João Batista Figueiredo na presidência da República.
Faz-se uma intencional confusão dos governos militares para que o povo não distinga os três diferentes governos: de Humberto Castelo Branco, totalitário, neoliberal e entreguista; de Costa e Silva a Ernesto Geisel, com os mesmos propósitos dos tenentistas da década de 1920, apoiadores de Getúlio Vargas; e de Figueiredo, para alterar o sentido nacionalista e retornar ao neoliberal entreguista de Castelo Branco.
O golpe de outubro/1945, nada teve de democrático, pois o governo de Getúlio tinha apoio popular como se verificou nas eleições para Constituinte em 1946, elegendo-o Senador pelo Rio Grande do Sul e São Paulo e Deputado pela Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, sete dos 20 Estados brasileiros. E voltou a presidir o Brasil em 1951, “nos braços do povo”.
Por que o brasileiro se ilude com tanta facilidade?
Primeiro por ter um estado colonial e privatizado por 450 anos de sua História. Segundo por ter enfrentado, nos 30 anos de Estado Nacional, permanente campanha contra o Estado como ente público, defensor de toda população brasileira. Basta ver que por 340 anos houve escravos legalmente assim considerados, e, após 1990, e até hoje, disfarçados em microempreendedores individuais (MEIs) ou “uber”, aplicativo de mobilidade urbana.
As duas ocorrências das quais trataremos, de outubro passado, no campo da cidadania, e de 10 a 21/novembro próximos vindouros, no campo da soberania, demonstram a falta de um Estado Nacional no Brasil, como ente público. Aqui tudo é privado, por conseguinte, solerte, hábil nos meios desonestos, e corrupto, e a desinformação é maior do que a informação, pois quer no processo escolar quer na comunicação de massa, tudo se faz para não termos consciência de nosso país, de nossa nacionalidade e dos retrocessos civilizatórios.
NECROPOLÍTICA NO HOME OFFICE DOS BANDIDOS
Vivemos onde se reserva lugar apenas para os ricos, os mais ricos entre os bilionários.
Foi do brilhante jornalista Octavio Guedes de quem ouvi a palavra necropolítica, no sentido de um fracasso que se transforma em sucesso de público, aplicada à “Operação Contenção” do Governador do Estado do Rio de Janeiro, na terça-feira (28/9), nos Complexos do Alemão e da Penha, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro.
Desde 1980 o Brasil vem substituindo o Estado Público pelo Estado do “Mercado”, ou, pelo estado neoliberal financeiro apátrida, com perdas facilmente constatáveis para a cidadania.
Quais funções caracterizam a formação da cidadania onde o Estado Nacional se habilita a cumprir suas funções intransferíveis de construção de uma nacionalidade. Getúlio Vargas, no mesmo mês de novembro em que assumiu a presidência, instituiu o Ministério da Educação e da Saúde Pública. Instituições basilares para cidadania.
A Instrução Pública está a completar um século sem que tenha sido implementada na estrutura do Estado Brasileiro. Ao contrário, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), firmado por 26 notáveis brasileiros, com a redação dos professores Fernando de Azevedo e Antônio de Almeida Júnior, onde se consagra o ideal da escola como direito social, instrumento de transformação social para a construção da sociedade mais justa e igualitária, para o que só se conseguiria se fosse pública e gratuita, ou seja, democrática, ao invés de erudita e memorizadora, praticasse o respeito ao próximo, a cooperação e o senso de responsabilidade social, nem mais é estudado. E, sendo o Estado Laico, não cabe à Escola Pública doutrinar num credo religioso ou ideológico.
Entre outros signatários, o Manifesto contém a assinatura do pedagogo Anísio Teixeira, do membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e da Academia Brasileira de Filologia, Afrânio Peixoto, do geógrafo e sociólogo Delgado de Carvalho, do jurista Hermes Lima, da poeta e escritora Cecília Meireles, ícone do modernismo literário brasileiro, do filósofo da educação Paschoal Lemme, do pai da radiodifusão no Brasil, Edgard Roquette-Pinto, e seu sócio na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, Edgard Sussekind de Mendonça, do jornalista Júlio de Mesquita Filho e do senador Attilio Vivacqua.
Mas o que temos são construções de anônimos, as escolas cívico-militares, como descreve a jornalista Fabíola Mendonça, na revista Carta Capital (Ano XXXI, nº 1386, 5/11/2025). “Na esteira de um programa federal lançado por Jair Bolsonaro”, sendo o Paraná, com 312 unidades líder nacional, ocorreu o seguinte caso. “Negro e morador da periferia de Curitiba, o estudante recebia constantes ameaças para cortar seu cabelo afro, Outro aluno, não suportou as frequentes humilhações aplicadas por policiais militares responsáveis pela área disciplinar e acabou deixando a instituição”. E registra que nenhuma das 312 escolas cívico-militares paranaenses está entre as 50 melhores notas do Enem 2014.
Formados dentro de uma pedagogia segregacionista, nada surpreende a matança promovida pelo companheiro de ideal do governador paranaense, o fluminense Cláudio de Castro, e que receba apoio dos companheiros de Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Amazonas, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso de Sul e do Distrito Federal. Pobre Brasil!
E o que faz a imprensa monopolista, discute a sucessão presidencial, coloca a disputa entre esquerda e direita, quando o que está em questão é a civilização ou a barbárie, não se a arma é fabricada pelos traficantes ou importada.
COP30 OU A SUBMISSÃO AO INTERESSE ESTRANGEIRO
Um Estado Nacional que busque sua soberania necessita ter controle do suprimento de energia. Ao procurar atingir a Rússia, explodindo os gasodutos Nord Stream 1 e Nord Stream 2, que abasteciam a Alemanha pelo Mar Báltico, o país mais prejudicado foi a Alemanha que está em acelerado processo de desindustrialização pela falta de energia. E, mais dia menos dia, os Estados Unidos da América (EUA), que aparentemente foi o agente da façanha, deverá indenizar de algum modo os povos alemão e russo.
Ao fim do Governo Geisel, o Brasil havia se institucionalizado, na área da energia, para decolagem como Nação Soberana. Possuía a Eletrobrás para aproveitamento da ampla bacia fluvial na produção da hidroeletricidade, a Petrobrás, para descoberta e produção de petróleo e derivados, o Proálcool, para produção de energia da biomassa e a Nuclebrás para energia produzida por usinas nucleares. Mas não apenas no campo da operação para obtenção de energia, nas empresas e nas universidades existiam laboratórios de pesquisa para o desenvolvimento das tecnologias ligadas à energia. O sonho da autossuficiência energética já era realidade.
Desde a década de 1960, o capital financeiro agia contra o uso do petróleo, pois deixara de controlar este mais utilizável insumo energético. Para tanto criara duas fábulas: a da questão climática e a da poluição atmosférica. E a solução seria a transição energética. Até então a palavra transição tinha um sentido de futuro, de progresso. Para energia passava a significar o passado, as formas mais antigas de produção de energia: a solar e a eólica.
No Brasil, a “redemocratização” visou principalmente o desmantelamento da institucionalidade energética construída por Geisel; começou privatizando ou simplesmente fechando subsidiárias da Petrobrás, desmontando a Nuclebrás e abandonando a biomassa. Fernando Henrique Cardoso foi ainda mais fundo, substituindo órgãos da estrutura do Estado, como o Conselho Nacional do Petróleo (CNP), por verdadeiros advogados dos interesses privados, as Agências Nacionais para diversas áreas até então de ação estatal. Para o petróleo se criou a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), como se petróleo não existisse na forma líquida (óleo) e de gás natural, já cometendo no título da organização um erro conceitual.
E para a Petrobrás, ao invés de usar a grande experiência e sucesso na descoberta de reservatórios de petróleo, colocou-a para investir em cataventos oceânicos. Para o Brasil é uma decisão sumamente danosa, pois o custo de produção de um barril de petróleo em área marítima oscila de US$ 2,70 a US$ 4,50, enquanto o quilowatt (KW) instalado de eólica offshore sempre superará US$ 2.000,00, tendo custo de manutenção sempre elevado.
As finanças internacionais, apátridas, constituíram Organizações Não Governamentais (ONGs) especificamente para administrar a “transição energética” e, sob esta capa, explorar recursos naturais, agir como contrabandistas, ou outras ações marginais no Brasil, especialmente na Amazônia, onde existem mais 100.000 em operação.
Das diversas ONGs atuantes no Brasil, as voltadas de algum modo para o meio-ambiente se destacam: World Wildlife Fund (Suíça), Greenpeace, Friends of the Earth e SOS Mata Atlântica (Países Baixos), Oxfam (Reino Unido), e nos EUA: Amazon Watch (Califórnia), Wildlife Conservation Society (Nova Iorque), The Nature Conservancy (Virgínia) e Conservação Internacional (Washington).
Os interesses ambientais estrangeiros colocaram uma atuante agente de seus interesses como Ministra no Brasil, Marina Silva, do Meio Ambiente.
ENFRENTAMENTO HISTÓRICO PARA O DESENVOLVIMENTO NACIONAL BRASILEIRO
O Brasil sempre foi tratado pelos interesses estrangeiros como uma colônia. Além da população miscigenada e da abundância de toda sorte de recursos naturais, como analisa Darcy Ribeiro, aqui se desenvolveu um povo pacífico, acolhedor, que soube superar todas as agressões que lhe foram feitas, inclusive a maior delas, que ainda perdura no século XXI, a escravidão.
Mas não soubemos compreender a importância do público, pois nosso mais longevo colonizador, os portugueses, também viviam no privatismo. Isto é, valorizavam a iniciativa individual ao invés da percepção coletiva da vida.
Mas sem o público, não se sustenta a base da construção da cidadania que se funda na Instrução.
Como nos comentários da filósofa Anne Cheng à sua tradução do chinês para o francês de “Os Analectos”, de Confúcio, educação é um valor fundamental. Mas o que significa estudar? Preparar-se para ser útil à sociedade. Aqui o conhecimento sempre foi, privadamente, entendido como diferenciador das pessoas; daí nada acrescentar nem para sociedade, nem para o próprio cidadão, facilmente escravizado como MEI ou “uber”.
E assim a formação da cidadania não atinge seu objetivo: formar pessoas que atuem para seu país, para seu povo, e deste desenvolvimento ter uma vida cada vez melhor e mais segura. O massacre do governador Cláudio de Castro, como muito bem qualificou o jornalista Octavio Guedes, foi uma agressão à cidadania, um ato verdadeiramente subdesenvolvido, mas serviu ao jogo político num país de analfabetos sociais.
E o pensamento crítico se retraindo, como escreveram Lorenzo Carrasco, Silvia Palácios e Geraldo Luís Lino, na 12ª edição revisada de “Máfia Verde – O ambientalismo a serviço do Governo Mundial”: “O movimento ambientalista na América Latina apenas será capaz de atingir seus objetivos quando as ONGs e grupos comunitários estiverem plenamente estabelecidos como atores no processo político relevante”. Ou seja, a soberania irá para o brejo.
Vemos quanto há de articulação dos interesses neoliberais financeiros na privatização do Brasil, e como tão pouco instruídas são suas elites que defendem a alienação pela educação privada. E nisso se constata pelas escolas americanas, inglesas, alemãs, francesas, suíças e agora já chegando as chinesas, para preparar estas elites.
*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.
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