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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 27 de março de 2025

Julgamento de um ex-presidente no país dos bacharéis

Quinta, 27 de março de 2025

PÁTRIA LATINA - PAPO DO DIA - 27 de março de 2025
                                  Foto: Antonio Augusto/STF 

Pedro Augusto Pinho*

FATOS E PERSONAGENS

Bolsonaro não carrega ferido, isso é bem sabido, e a bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) acaba de confirmar ao receber o sexto voto, em onze, no Supremo Tribunal Federal (STF), condenando-a por portar arma em via pública. Bolsonaro ainda a acusou de ter contribuído para sua derrota eleitoral!

E quanto aos generais e autoridades que acompanham o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, na denúncia do Ministério Público Federal, iniciada na Primeira Turma do STF, na terça-feira, 25/3/2025? Terão um ato ou uma palavra de solidariedade? Quase certamente não.

Mas este julgamento e eventual condenação encerram o rol de crimes que Bolsonaro e seus aliados praticaram contra as leis e os interesses brasileiros desde quando assumiu a Presidência em 01/01/2019? Certamente não.

O Procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet Branco, acusou Bolsonaro e mais sete pessoas da prática dos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima, o Estado Federal, além de deterioração de patrimônio tombado.

São acusados:

1) Mauro Cid, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro;

2) Walter Braga Netto, general que foi ministro da Defesa e da Casa Civil no governo de Bolsonaro, além de ter sido candidato a vice-presidente em 2022;

3) Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-presidente da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) no governo Bolsonaro;

4) Almir Garnier, almirante de esquadra que comandou a Marinha no governo de Bolsonaro;

5) Anderson Torres, ex-ministro da Justiça no governo Bolsonaro;

6) Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Bolsonaro;

7) Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro.

Cada acusado tem seu próprio advogado.

Compõem a Primeira Turma do STF os Ministros: Cristiano Zanin (Presidente), Alexandre de Moraes (Relator), Carmen Lúcia, Luiz Fux e Flávio Dino.

ACOLHIMENTO DA DENÚNCIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Numa época em que o mundo se industrializava, o Brasil discutia minúcias de processos judiciais. Nomes como Teixeira de Freitas (1816-1883), Ribeiro de Andrade (1838-1919), Clóvis Beviláqua (1859-1944), Martins Torres (1865-1917), Nelson Hungria (1891-1969), Orozimbo Nonato (1891-1974), Pontes de Miranda (1892-1979), Filadelfo de Azevedo (1894-1951), Ary Franco (1900-1963), Hermes Lima (1902-1978), o penalista Roberto Lira (1902-1982) ficaram muito mais conhecidos do que os engenheiros que construíram as estradas de ferro e de rodagem, os portos e estaleiros, as fábricas que deram emprego, produtos e tecnologia, e fizeram o Brasil crescer.

Daí ter sido o Brasil cognominado “país dos bacharéis”.  

No momento em que o Brasil se desindustrializa, o capital financeiro domina a vida de todos, o País para, as redes de televisão concentram-se na transmissão de um julgamento que não resolverá qualquer problema que nos aflige como o emprego, a distribuição de renda, a habitação, que não mais nos faça conhecido como o país dos sem teto e sem comida.

Perdemos já há muito, o sentido do nacional, do trabalhismo, da instrução e da organização nacional.

Há 33 anos, o “Noticiário do Exército”, veículo oficial da instituição produzido no Quartel General do Exército, em Brasília, circulou com um raro editorial na capa. Tratava-se de uma manifestação de desapreço que circulou por todas as unidades militares no território nacional contra o então capitão Jair Bolsonaro, na época com 32 anos.

Rubens Valente, colunista do UOL, analisava o comportamento do Jair Bolsonaro. “Intitulado “A verdade: um símbolo da honra militar”, o texto de 25 de fevereiro de 1988 diz que Bolsonaro e outro capitão “faltaram com a verdade e macularam a dignidade militar”. Cita conclusões de “Conselhos de Justificação” instaurados para investigar os dois militares depois que a revista Veja divulgou, em outubro de 1987, reportagem sobre um suposto plano de Bolsonaro para estourar bombas em unidades militares. De acordo com a revista, a ideia de Bolsonaro era protestar contra os baixos salários dos militares e, assim, prejudicar o comando do então ministro do Exército, Leônidas Pires Gonçalves”.

Arruaças parecem ser constantes na vida deste “mau militar”, como o ex-presidente Ernesto Geisel qualificou Jair Messias Bolsonaro. Por que parar e comover a Nação? Porque regredimos não só no desenvolvimento industrial, na construção de um Estado Nacional Brasileiro, como na compreensão do interesse nacional com esta “Nova República” ou no processo de “redemocratização do Brasil” (sic).

Na manhã de 26/03/2025, a 1ª Turma do STF, por unanimidade, acolheu a denúncia do PGR, transformando em réus os oito indiciados anteriormente listados.

O dia 8 de janeiro de 2023 ficará na história como Intentona Bolsonarista.

Durante uns nove/dez meses, quase como uma gestação, a 1ª Turma do Supremo detalhará, inquirirá, analisará os fatos aceitos como crime e punirá, como penas individualizadas, os réus de crime contra a ordem democrática e o Estado de Direito.

Na hipótese, mesmo remota de alguma absolvição, a carreira política destes oito réus estará seriamente comprometida. Ou articularão, com apoio do exterior, um novo golpe esperando melhor sucesso.

*Pedro Augusto Pinho, do Conselho Editorial do Pátria Latina (Comunicação Independente desde fevereiro de 2002).