Segunda, 30 de novembro de 2015
Maria Lucia Fattorelli [i]
O respeitável dicionário Houaiss da Língua Portuguesa define terrorismo como o “modo de impor a vontade pelo uso sistemático de terror”.
A vontade de obter lucros excessivos com
a atividade de mineração no Brasil – de forma predatória, acelerada e
descontrolada, arrancando da Terra o máximo de minerais possível, no
menor tempo e ao menor custo – tem significado a imposição sistemática
de terror à população e ao meio ambiente.
Os únicos beneficiários desse terrorismo
têm sido os donos das grandes mineradoras nacionais e estrangeiras que
atuam no Brasil. Além de obterem lucros bilionários com a venda do
minério, utilizarem água à vontade e de graça, ainda usufruem de
diversos benefícios tributários, como incentivos fiscais à exportação,
isenção na distribuição de lucros e isenção para a remessa de tais
lucros ao exterior.
As vítimas do terrorismo têm sido:
* toda a população atingida em seu direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, e
* a própria Natureza, que além de mutilada sem o menor respeito ainda
recebe toneladas de rejeitos contaminados. A Dívida Ecológica que tem
sido gerada por esses processos é incalculável.
A Constituição Federal considera, em seu
artigo 5o, inciso XLIII, que todas as pessoas possuem a garantia de
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade, e a lei considerará crimes inafiançáveis e
insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico
ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos
como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e
os que, podendo evitá-los, se omitirem.
A questão ambiental, por sua importância
essencial à própria vida, está resguardada no Capítulo VI da nossa
Constituição Federal:
CAPÍTULO VI
DO MEIO AMBIENTE
Art. 225. Todos têm direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
Trata-se, portanto, de um direito que
perpassa todas as esferas: além de ser um direito individual e coletivo,
o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito
transgeracional, pois abrange as gerações futuras.
Os parágrafos e incisos do referido
artigo 225 exigem atuação firme do Estado e lhe impõe deveres, assim
como a reparação dos danos por condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente, independentemente de culpa, conforme o disposto em seu § 3º e
na Lei 6.938, sobre a Política Nacional de Meio Ambiente.
A violação do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade dos atingidos pela
recente tragédia em Minas Gerais é brutal; pode ser considerado como uma
verdadeira chacina ao meio ambiente e à população de diversas cidades, e
foi provocada pela vontade exacerbada de lucros, levada à ganância
alimentada por predatória e inconsequente exploração do minério de
ferro.
Tal violação ocorre em inúmeras outras
áreas de exploração mineral predatória no Brasil, o país de maior
estoque natural do planeta. O presente artigo visa ilustrar a ocorrência
de terrorismo ambiental em três exemplos de exploração de minério de
ferro, nióbio e ouro, e levantar a necessidade de avançar os estudos
sobre a “Dívida Ecológica”, especialmente diante da iminência de votação
de novo Código de Mineração” no Congresso Nacional. É preciso exigir
reparação de danos à altura e corrigir os rumos.
MINÉRIO DE FERRO
Toneladas de dejetos de mineração foram
derramados em Minas Gerais, devido ao rompimento de duas barragens da
empresa SAMARCO em Mariana.
Tal fato atingiu dezenas de vítimas
humanas, incluindo jovens e crianças inocentes; o distrito de Bento
Rodrigues [ii] ficou soterrado; dezenas de outros municípios dos estados
de Minas Gerais e Espírito Santo atingidos [iii] ficarão sem acesso a
água, comprometendo uma série de empreendimentos, atividades
profissionais e vitais, com reflexos diretos na vida de milhões de
pessoas; o Rio Doce morto [iv], completamente contaminado e exterminados
todos os peixes [v], além do aniquilamento de inúmeras espécies quando a
poluição atingir também o Oceano Atlântico…
É evidente a violação do direito à vida,
à liberdade, à segurança e à propriedade de pessoas atingidas,
aterrorizadas ante o cenário de destruição e contaminação a que foram
submetidas de assalto.
A foto abaixo ilustra como ficaram as residências de parte dos atingidos.
Quanto valem as vidas de pessoas, peixes
e animais mortos? Quanto vale o Rio Doce? Qual o valor do dano em
decorrência da falta de água e comprometimento de tantas atividades? É
necessário calcular e cobrar a Dívida Ecológica dessa gente que só
entende o valor das coisas quando lhes é atribuído um preço em dinheiro!
Fotos de satélite, tiradas antes e
depois do ocorrido [vii], mostram outra perspectiva visual do imenso
dano ambiental e patrimonial provocado pela SAMARCO, de propriedade da
Vale e da anglo-australiana BHP Billiton. Só em 2014 o faturamento bruto
divulgado pela empresa foi de R$ 7,6 bilhões!
Essas fotos mostram o soterramento da
maior parte das propriedades de Bento Rodrigues. Além disso, a lama
despejada seguiu contaminando as águas do até então belo e rico Rio
Doce.