Terça, 24 de abril de 2012
Da PúblicaAgência de Reportagem e Jornalismo Investigativo
Na América Central, médicos apontam para
fenômeno ligado ao corte de cana sob altas temperaturas: a Doença Renal
Crônica. Empresas se recusam a reconhecer o problema e demitem
trabalhadores doentes
LA ISLA, Nicarágua — Maudiel Martinez tem 19 anos e um sorriso
tímido, cabelos pretos encaracolados e um corpo magro, com uma estrutura
muscular formada pelos anos de trabalho nos campos de cana de açúcar.
Na maior parte de sua adolescência, ele foi saudável e passava seus dias
cortando talos altos de cana com seu facão.
Agora Martinez sofre de uma doença fatal que está devastando sua
comunidade e dezenas de outras na América Central, onde já dizimou
fileiras de trabalhadores da cana. A mesma doença matou seu pai, seu avô
e castiga seus três irmãos mais velhos.
“Essa doença come nossos rins por dentro”, diz Martinez. “Não
queremos morrer, estamos tristes porque já sabemos que não há esperança
para nós.”
A doença de Martinez está no coração de um mistério letal – e do
legado de negligência por parte da indústria e de governos como o dos
Estados Unidos, que resiste a apelos para uma ação agressiva de destaque
à doença e busca de uma solução. Mais do que a vida de que colhe a
cana, as nações ricas estão focadas em estimular a produção de
biocombustíveis na indústria da cana e em manter o grande fluxo de
açúcar para os consumidores americanos e fabricantes de alimentos.
Pouco notada pelo resto do mundo, a Doença Renal Crônica (DRC) está
cortando vidas e abrindo uma clareira entre as populações mais pobres do
mundo, a faixa se estende em um trecho da Costa do Pacífico da América
Central que abrange seis países e cerca de 700 quilômetros. Suas vítimas
são trabalhadores braçais, principalmente da cana.
Em cada ano de 2005 a 2009, a insuficiência renal matou mais de 2,800
homens na América Central, de acordo com a análise dos últimos dados da
OMS feita pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos.
Somente em El Salvador e na Nicarágua, nas últimas duas décadas, o
número de homens morrendo de doenças no rim quintuplicou. Hoje, mais
homens morrem de DRC do que de HIV/AIDS, diabetes e leucemia juntos.