Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)
Mostrando postagens com marcador professora Fátima Sousa. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador professora Fátima Sousa. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Servidor Público: valorização e reconhecimento de quem cuida do Brasil

Segunda, 28 de outubro de 2024


Professoras Fátima Sousa

Hoje, 28 de outubro, celebramos o Dia do Servidor Público, data que se apresenta como um convite à reflexão sobre o nosso papel na sustentação do Estado brasileiro e na materialização de políticas que afetam a vida de milhões de pessoas, famílias e comunidades. Longe de ser apenas uma celebração formal, esta data nos leva a discutir a importância de um compromisso permanente com a humanização e valorização de nossa categoria profissional, que, em nossas diversas funções, tornamo-nos agentes de transformação social.

Em tempos de incertezas e mudanças, nós, servidoras/es públicos representamos o núcleo vital dos serviços essenciais, especialmente em áreas fundamentais como a educação, a saúde, a segurança, a assistência social, só para falar de alguns. Nesse sentido, é crucial reconhecermos o nosso trabalho, mulheres servidoras, que em grande parte compõem a base dessas categorias, com uma presença marcante e historicamente resiliente. Mulheres que não apenas garantem o funcionamento do Estado, mas também trazem uma sensibilidade necessária para lidar com questões complexas e emergentes.

O desafio da docência no setor público: pilar da formação social

Entre os diversos segmentos, nós, professoras e professores, nos destacamos como um dos pilares da formação social e humana. Não apenas porque produzimos e traduzimos o conhecimento, mas também iluminamos consciências críticas, comprometidas com um futuro mais equitativo. Contudo, a precariedade estrutural que marca a educação, tanto em âmbitos municipais quanto estaduais e federais, impõe desafios diários que ainda comprometem a efetividade de nossa missão.

No Brasil, o corpo docente da rede pública de ensino é formado por cerca de 2,54 milhões de profissionais, conforme os dados mais recentes do Censo Escolar 2023, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Desse total, aproximadamente 1,5 milhão de professores atuam nas escolas municipais, que são responsáveis pela maior parte da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental. As escolas estaduais contam com cerca de 940 mil docentes, principalmente nas etapas finais do ensino fundamental e no ensino médio. Já a rede federal, composta por universidades e institutos federais, emprega cerca de 100 mil docentes, segundo o Cadastro Docente do Ministério da Educação (MEC).

Esses profissionais estão presentes em todos os 5.570 municípios brasileiros, desempenhando um papel fundamental na formação de cidadãos críticos e conscientes, desde os grandes centros urbanos até as áreas mais remotas. Valorizar esses professores, assegurando condições dignas de trabalho, remuneração justa, apoio psicológico e oportunidades de desenvolvimento, é essencial para promover uma educação de qualidade e construir um futuro mais justo e equitativo para o país.

A humanização da carreira no serviço público transcende o oferecimento de boas condições materiais. Ela abarca a necessidade de resgatar o valor humano nas relações de trabalho, onde o cuidado com a saúde mental, o respeito à diversidade e a equidade de gênero devem ser elementos centrais. Servidores públicos que atuam na linha de frente da saúde, como enfermeiros, médicos, técnicos e agentes comunitários, exemplificam essa dimensão, exercendo funções que exigem não apenas competência técnica, mas também uma empatia profunda com aqueles que atendem.

A valorização desses trabalhadores, especialmente as mulheres, também é uma questão de justiça social. Muitas vezes sobrecarregadas por jornadas duplas e expectativas sociais arraigadas, as servidoras enfrentam barreiras adicionais que precisam ser reconhecidas e superadas. Por isso, pensar na humanização implica também revisar políticas de apoio, ampliar espaços de escuta e promover mudanças estruturais.

Conquistas e perspectivas: caminhos para o futuro do serviço público

O fortalecimento do serviço público depende de um olhar atento aos desafios históricos que marcam a trajetória de seus profissionais. Houve avanços na defesa de direitos, como a criação de programas de capacitação e planos de carreira, mas é necessário vislumbrar novas formas de apoio que estejam em sintonia com as transformações da sociedade. As inovações tecnológicas, por exemplo, exigem novas competências e um investimento em letramento digital, essencial para que os profissionais possam se adaptar e continuar a oferecer um serviço de qualidade.

A valorização do servidor público não se restringe ao presente. Ela aponta para um projeto de futuro em que o serviço público se torne um ambiente mais inclusivo, solidário e inovador. Para isso, é fundamental uma articulação entre governos, sindicatos e sociedade civil, de modo a construir políticas que assegurem o reconhecimento e a dignidade desses trabalhadores, abrindo espaço para novos modelos de carreira que dialoguem com a complexidade contemporânea.

Neste Dia do Servidor Público, mais do que uma homenagem, devemos reafirmar um compromisso coletivo de reconhecimento genuíno e ações concretas que assegurem um ambiente de trabalho humanizado, justo e eficiente. Que os gestores e governantes compreendam que a excelência do Estado começa pela valorização de quem o compõe e o faz funcionar, todos os dias, por meio de sua dedicação.

Essa data não é apenas um marco para celebrações, mas um ponto de inflexão para repensar o serviço público, ampliando horizontes de conquistas e promovendo um futuro em que todas as vozes sejam ouvidas e respeitadas. É dessa forma que construiremos um Estado mais forte, justo e solidário, capaz de atender às demandas da população e de promover um futuro melhor para todos.


===================

Professora Fáima Sousa

Paraibana, mais de 44 anos dedicados a saúde e a gestão pública; 
Professora e pesquisadora da Universidade de Brasília;
Enfermeira Sanitarista, Doutora em Ciências da Saúde, Mestre em Ciências Sociais; 
Doutora Honoris Causa;
Implantou o ‘Saúde da Família’ no Brasil, depois do sucesso na Paraíba e em São Paulo capital; 
Implantou os Agentes Comunitários de Saúde;
Dirigiu a Faculdade de Saúde da UnB: 5 cursos avaliados com nota máxima;
Lutou pela criação do SUS na constituinte de 1988;
Premiada pela Organização Panamericana de Saúde, pelo Ministério da Saúde e pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde.

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Crise humanitária brutal: A OMS/ONU tentam assegurar cuidados a saúde, Paz e vida,

Quarta, 12 de outubro de 2023

Professora Fátima Sousa
Ataque do Hamas a Israel e revide das Forças Armadas israelenses: cerca de 2,5 mil mortos e de 8 mil feridos, oficialmente registrados, apenas nos cinco primeiros dias de guerra; destruição absurda de residências, infraestrutura, escolas, serviços de saúde, com números crescentes a cada dia. Cerca de 150 reféns inocentes (e alguns militares israelenses) nas mãos do Hamas. Bloqueio total na Faixa de Gaza, com 2,1 milhões de pessoas, metade com menos de 20 anos, amontados num território de 350 km2 (41 km x 10 km): Israel suspendeu o abastecimento de água, eletricidade e combustível, não chegam mais nem medicamentos, nem comida, nada. A estupidez e a irracionalidade de um, respondidas igualmente pelo outro. Uma crise humanitária brutal instalada, com promessas de mais destruição, mais feridos, mais mortos. Civis inocentes são as maiores vítimas de ambos os lados.

Os poucos e frágeis serviços de saúde palestinos estão sendo destruídos ou estão sem eletricidade, água, medicamentos, soros, vacinas e insumos cirúrgicos, imprescindíveis para feridos de guerra. A OMS e outras agências da ONU buscam desesperadamente acordos mínimos para assegurar insumos médicos para Gaza. O pessoal de saúde está seriamente ameaçado na sua ação de salvar vidas. A violência não poupa a ninguém. A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA)1, que mantém funcionários e instalações em Gaza, informou que 11 de seus funcionários foram mortos desde o início do conflito, a 7 de outubro2. O Crescente Vermelho já perdeu cinco funcionários. O Brasil enviou aviões da FAB para repatriar brasileiros, a partir de Tel Aviv.

CADERNOS CRIS/FIOCRUZ

Profa Fátima Sousa —Professora associada do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília.

FS/UnB

sexta-feira, 7 de abril de 2023

Saúde para quem cuida da nossa saúde

Sexta, 7 de abril de 2023
Professora Fátima Sousa*

Chegamos a mais um dia dedicado à saúde mundial [7 de abril], quando todos se voltam à consciência coletiva em defesa da saúde global, direito fundamental de todo ser humano enquanto bem universal, que potencializa a produção de riqueza das nações e contribui para a sua redistribuição. Este ano quero dedicar minhas reflexões aos profissionais de saúde distribuídos nos quatro cantos do globo, mas em particular aos do meu país, um dos mais assolados pelo número de vítimas (mais de 700 mil óbitos) e por sequelas pandêmicas.

Quem sobreviveu à maior pandemia dos últimos 100 anos certamente saberá reconhecer sentido da gratidão dirigida cada profissional que esteve na linha de frente e na retaguarda da saúde, colocando diariamente suas vidas e as de suas famílias em risco. Sim, sobrevivemos, muitos profissionais de saúde também, mas estudos apontam que mais de 13,6 mil deles morreram durante o auge da pandemia de Covid-19 somente no Brasil.

Além desses números, há um outro ainda indefinido de casos de medo, estigma e preconceitos sofridos, além dos sintomas de fadiga, falta de ar, dor, tontura, sudorese, calafrios, tosse, perda de peso, ansiedade, falta de atenção, distúrbios no sono, articulações doloridas, lapsos de memória e enxaqueca, considerados como heranças malditas.

Todos nós acompanhamos a luta desses profissionais no Brasil, trabalhando sem os equipamentos de proteção adequados, exauridos pelas sucessivas explosões do número de casos, sobrecarregados por sempre haver muitos colegas em quarentena. Muitos tiveram que se afastar dos familiares, outros tiveram que trabalhar sob o luto das perdas, alguns vivendo a angústia da culpa por se suspeitarem veículos de contaminação.

Não podemos voltar ao passado, mas lembrá-lo, nos impede de cometer os mesmos erros, como atrasar o ciclo vacinal, negligenciar suportes materiais e técnicos para as unidades de tratamento, promover desinformação ao promover o estímulo ao uso de medicamentos ineficazes, reduzir o valor de benefícios sociais, evitar que imunizantes tenham seus lotes vencidos antes de chegar à população, desvalorizar os salários das categorias de saúde, entre tantos erros que não podem ser repetidos.

A sucessão de erros cometidos na saúde pública de 2016 até 2019 só ameaçaram e fragilizaram os grandes feitos do país nas últimas décadas com a construção do Sistema Único de Saúde (SUS). Apesar dos desserviços, deve-se ao próprio SUS, com a capilaridade de sua rede e a dedicação de seus profissionais, termos evitada catástrofe ainda maior. Por isso, neste Dia Internacional da Saúde, venho agradecer a todas as categorias de profissionais da saúde, bem como àqueles trabalhadores invisibilizados, como recepcionistas, seguranças e vigilantes, agentes de limpeza e sepultadores, entre outros, por tudo que têm feito por nosso povo e nosso país.

Precisamos renovar as tintas do quadro da saúde pública no Brasil dando lugar a um novo retrato esperançoso para o projeto da saúde que precisamos. Para isso, é preciso renovar nossas forças para reerguermos o país e nossa casa, o Distrito Federal. Não podemos esquecer que não há saída fora da política, e que a boa política é um bem ético e uma enorme força civilizatória. Assim, seguiremos saudando a ciência, o SUS e nossos profissionais. Esses são nossos maiores patrimônios em saúde. Que possamos, enfim, contribuir para a reconstrução da história na perspectiva de um pacto social no país e de uma cooperação global solidária e justa, na permanentemente defesa, incondicional da saúde, em ambientes democráticos. Afinal democracia é saúde.

*Professora associada do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília. Doutora honoris causa pela Universidade Federal da Paraíba e pós-doutora pela Université du Québec à Montréal.

quarta-feira, 23 de março de 2022

Precisamos entender o futuro dos jovens.

Quarta, 23 de março de 2022
                                                         Foto: Agência Brasil

Professora Fatima Sousa*

Durante esta última semana, diversos jornais deram destaque à pesquisa realizada em parceria pela USP e pelo INSPER, conduzida pelos professores Luciano Salomão e Naercio Menezes Filho e publicada no final de fevereiro, que demonstrou estatisticamente os efeitos positivos da educação em municípios brasileiros.

Os pesquisadores criaram um novo indicador de qualidade do ensino, denominado IDEB-ENEM, construído pela integração de dois tipos de dados: (1) a porcentagem de alunos que se matriculam no 1º ano do ensino fundamental na idade ideal (6/7 anos) e conseguem completar o ensino médio dez anos depois; e (2) a nota média desses alunos no ENEM. Eles investigaram as relações da variação desse indicador nos municípios entre 2009 e 2019 com outros três aspectos: as mudanças do número de homicídios, do número de matrículas no ensino superior e do número de novos empregos.

Entre os resultados mais interessantes está a confirmação de que a quantidade de jovens que prestou o ENEM aumentou entre 2009 e 2016, mas depois declinou até 2019. O novo indicador IDEB-ENEM aumentou entre 2009 e 2014 em todas as regiões. O mais impressionante, entretanto, é a demonstração matemática de que o crescimento de um ponto no IDEB-ENEM esteve associado a uma diminuição de 25% nos homicídios, um aumento de 15% nas matrículas em cursos superiores e um notável aumento de 200% na geração de empregos.

Dados do Ipea mostram que, nos últimos 20 anos, a educação brasileira vinha passando por uma significativa transformação positiva de investimento em educação, que variou de 3,8% do PIB em 1994 a 5,6% em 2014. Um estudo do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB/UERJ) demonstrou que os investimentos em educação e ciência do governo Bolsonaro nos três últimos anos foram os mais baixos no Brasil desde o ano 2000. O MEC tem este ano um pequeno aumento para R$ 3,45 bilhões em investimentos, valor muito aquém do apresentado entre 2009 e 2015, que variou de 10 a 20 bilhões.

Por isso, nosso primeiro desafio é conseguir um orçamento digno para os investimentos em educação. Um grande esforço político precisará ser feito junto à nova Câmara Federal para dobrar a percentagem do PIB investido, atualmente na casa dos 3,5%, visando a aproximá-lo dos valores investidos por países com os melhores resultados em educação. Essa mudança orçamentária tornaria possível o cumprimento da meta de universalização do ensino médio presente em nossa Constituição; facilitaria, por exemplo, a integração prevista na lei do ensino municipal e estadual, compondo uma espécie de Sistema Único da Educação. Isso também permitiria maiores investimentos na formação e na remuneração dos docentes, com a criação de um plano de carreira nacional para o ensino fundamental e o médio.

Entretanto, os desafios não se resumem à questão orçamentária. A realidade da educação tem causas sobretudo estruturais, e o enfrentamento de questões estruturais só pode ser feito com base em decisões políticas socialmente e cientificamente orientadas. As pastas ministeriais e das diversas secretarias de educação nas três esferas de governo têm sido ocupadas repetidamente por pessoas leigas, que pouco ou nada conhecem de pedagogia e sistemas educacionais. Daí a necessidade de revigorar os conselhos de educação, que, como as demais instâncias de controle social, foram esvaziados pelo atual governo, quando não simplesmente dissolvidos. Isso inclui também uma mais ampla garantia de retomada das políticas compensatórias de ingresso nas universidades e nos institutos federais.

Outro desafio a ser mais profundamente discutido com a sociedade é o fato de existir uma descentralização da operacionalização da educação, que permite a diversificação dos processos de ensino-aprendizagem, mas uma centralização da avaliação, que desconsidera os contextos. Permanecem também a questão da “promoção automática” no ensino fundamental, independentemente do desempenho, e a da criação e difusão, em todo o território nacional, de escolas públicas de tempo integral, que comprovadamente protegem as crianças contra ambientes de violência e abuso domiciliar e melhoram o desempenho escolar.

As eleições de 2022 poderão ser um divisor de águas para uma governança da educação nacional, de forma que possamos nos próximos cinco anos discutir dados ainda mais impressionantes que os alcançados pela pesquisa da USP/INSPER e assim contribuir para uma sociedade em que a esperança continue a habitar o coração da juventude.

=================
*Professora Fátima Sousa
Paraibana, quatro décadas da sua vida dedicados a saúde e a gestão pública;
Professora e pesquisadora da Universidade de Brasília;
Enfermeira Sanitarista, Doutora em Ciências da Saúde, Mestre em Ciências Sociais;
Doutora Honoris Causa;
Implantou o ‘Saúde da Família’ no Brasil, depois do sucesso na Paraíba e em São Paulo capital;
Implantou os Agentes Comunitários de Saúde;
Dirigiu a Faculdade de Saúde da UnB: 5 cursos avaliados com nota máxima;
Lutou pela criação do SUS na constituinte de 1988;
Premiada pela Organização Panamericana de Saúde, pelo Ministério da Saúde e pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

As iniquidades no mundo das mulheres gritam em tempos de pandemia

Quinta, 25 de junho de 2020
Por
Professora Fátima Sousa*

O mundo vive uma pandemia pela Covid-19, o Brasil é o segundo país com mais casos da doença e a linha segue em ascensão. Neste contexto, as mulheres podem ser chamadas de heroínas, guerreiras, batalhadoras, mas a verdade é que a situação demonstra, de maneira ampla, as iniquidades vividas por elas, algumas, inclusive, bem conhecidas por todos(as). E já é passada a hora de não mais romantizar a exploração e as desigualdades as quais nós, mulheres, somos submetidas.
A pandemia tem impactos desproporcionais em nossas vidas devido a causas multifatoriais e revela ainda mais a sistemática violação dos direitos humanos femininos. O relatório “Mulheres no centro da luta contra a crise Covid-19”, divulgado este ano pela ONU Mulheres, afirma que, com o distanciamento social, a violência doméstica e o feminicídio aumentaram em todo o mundo. As mulheres estão confinadas com seus agressores e distantes de suas redes de apoio e proteção como amigos(as), familiares, organizações não governamentais. Assim, os riscos sobre nós são cada vez mais elevados.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma a cada três mulheres no mundo sofre violência física ou sexual, na maioria das vezes, praticada por um(a) parceiro(a) íntimo(a). Essa violência tem piorado diante do aumento das taxas de consumo de bebidas alcoólicas e do estresse derivado da insegurança econômica causados pela pandemia.
O regime de home office, nos obriga a equilibrar o trabalho remunerado com as milhares de tarefas das jornadas múltiplas como profissionais, donas de casa e mães que somos – em especial com filhos(as) em casa. Desse modo, temos que nos desdobrar entre diversas atividades como o emprego fora de casa, trabalhos domésticos, cuidado das crianças – incluindo educação escolar, uma vez que as unidades de ensino estão fechadas – e ainda tem o amparo às pessoas idosas das quais ainda muitas de nós são cuidadoras.
Dados do IBGE (2019) apontam que as mulheres dedicam em média 18,5 horas semanais aos afazeres domésticos e cuidados de pessoas, na comparação com 10,3 horas semanais gastas nessas atividades pelos homens. O Relatório da ONU aponta que antes da pandemia de infecção pelo coronavírus, desempenhávamos três vezes mais trabalhos não remunerados que os homens, porém, com o distanciamento social e o movimento “fique em casa”, a estimativa é que este número tenha triplicado.
Somente na UnB somos uma maioria de 1648 técnicas administrativas de um total de 3213 técnicos(as) e 1308 professoras, entre os 2867 docentes de toda a Universidade, sem contar com as estudantes e terceirizadas que integram nossa comunidade. Ao observarmos nossa situação no setor saúde, mais uma vez as iniquidades são gritantes.
Somos 70% entre trabalhadores da saúde em todo o mundo, fato que nos expõe a um maior risco de infecção pelo novo coronavírus, afinal, integramos a linha de frente do cuidado profissional sanitário. De acordo com o Perfil da Enfermagem no Brasil, pesquisa realizada em 2015 pelo Conselho Federal de Enfermagem, cerca de 84,7% dos(as) auxiliares e técnicos(as) de enfermagem brasileiros(as) pertencem ao sexo feminino.
Não bastasse todo este contexto, somos maioria na saúde e em vários setores de empregos informais como trabalhadores(as) domésticos(as) e cuidadores(as) de idosos. Dessa maneira, somos as mais afetadas pelos efeitos da pandemia do coronavírus e outras modalidades de adoecimentos sociais. Entre a população idosa, há mais mulheres vivendo sozinhas e com baixos rendimentos. E apesar de sermos maioria em diversos setores, ainda não estão em esferas de poder de decisão na pandemia, pois somos apenas 25% dos(as) parlamentares em todo o mundo e menos de 10% dos chefes de Estado ou Governo.
Ainda não estamos nas estruturas de poder para tomarmos decisões determinadas, assertivas, corajosas, a exemplo da primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern. Nesse tempo de pandemia e em outros momentos da vida pública e privada, as iniquidades que nos assolam só aumentam nossas dores. As mulheres no poder fazem a diferença em todos os tempos, sobretudo em tempos de pandemia. Isso não é para romantizar, e sim para agir, com consciência sociopolítica e cultural, rumo à superação das iniquidades em nossas vidas, como nos ensina a jovem paquistanesa Nobel da Paz, Malala Yousafzai, que este mês anunciou ao mundo, via rede social, sua formatura na faculdade de Filosofia, Política e Economia da Universidade de Oxford. Nosso maior desafio à superação das desigualdades de gênero, de raça e classe reside na construção da práxis contra hegemônica pela educação.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019