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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Auditoria Cidadã da Dívida analisa “A escandalosa estatização de dívidas privadas”

Quarta, 10 de novembro de 2010
Análise publicada no site Auditoria Cidadã da Dívida
O Jornal O Globo de hoje [9/11] confirma a denúncia feita ontem em primeira mão por esta seção, de que a Medida Provisória 511 permite que o governo federal – ou seja, o povo – pague uma dívida que deveria ser paga por empresas financiadas pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Diversas vezes a Auditoria Cidadã da Dívida denunciou as Medidas Provisórias que permitiram ao governo federal emitir R$ 180 bilhões em títulos da dívida interna – aos juros mais altos do mundo e prazos curtos - para obter recursos a serem emprestados ao BNDES – a juros bem mais baixos e prazos longos - para que este banco financiasse empresas em condições facilitadas.

Agora, o governo edita nova Medida Provisória, simplesmente permitindo que o BNDES possa pagar até R$ 20 bilhões destes R$ 180 bilhões, caso as empresas não paguem suas dívidas com o banco. Em suma: além de bancar as taxas de juros e prazos facilitados para as empresas, agora o governo federal (ou seja, o povo) poderá arcar também com parte expressiva do principal desta dívida. Mais uma grande prova da ilegitimidade da dívida interna.

“Moral da história”: enquanto a dívida do governo (ou seja, do povo) com o setor financeiro tem de ser paga exatamente no prazo, ou até mesmo antecipadamente e com ágio (mesmo às custas da ausência de serviços públicos de qualidade, como saúde e educação), a dívida das empresas e do BNDES com a União não precisa ser paga.

Apesar da Medida Provisória prever que o BNDES tome posse das garantias dadas pelas empresas inadimplentes para poder pagar tais R$ 20 bilhões à União, não há prazo definido para isso. Aliás, se as garantias dadas pelas empresas cobrissem integralmente os empréstimos, não haveria razão para esta vantagem adicional ao BNDES.

Enquanto o governo aceita não receber parte da dívida que deveria ser paga pelas empresas, o mesmo governo faz de tudo para pagar em dia a sua dívida com o setor financeiro. Os jornais Correio Braziliense e Estado de São Paulo mostram a preocupação da futura presidente Dilma para evitar aumento dos gastos sociais no orçamento de 2011. A equipe de Dilma trabalha contra o aumento real do salário mínimo, o piso nacional para os policiais militares dos estados, reajustes de diversas categorias de servidores, ressarcimento aos estados pelas perdas da Lei Kandir (isenção de ICMS sobre as exportações), dentre outros gastos sociais.

Um detalhe interessante é que o título da notícia do jornal “Estado de São Paulo” chega a caracterizar o piso nacional dos policiais militares como “bomba fiscal de R$ 30 bilhões”, ignorando que a proposta sequer estabelece o valor de tal piso. Na realidade, “bomba fiscal” é a dívida pública, que consumirá em 2011 metade dos recursos de todo o orçamento.

Por fim, o jornal Valor Econômico divulga de forma acrítica um estudo do Banco Central mostrando que, se o país aumentar o superávit primário em 1% do PIB (ou seja, cortar quase R$ 40 bilhões de gastos sociais, valor equivalente a todo o orçamento da educação federal em um ano), a inflação se reduziria e a taxa de juros brasileira (a maior do mundo) poderia cair 1% ao ano. Um detalhe interessante: o Banco Central consultou os próprios rentistas para chegar a esta conclusão.

Cabe relembrar que o Voto em Separado da CPI da Dívida na Câmara dos Deputados, entregue ao Ministério Público, aponta tais consultas ao “mercado” pelo Banco Central como um grave indício de ilegalidade da dívida, visto que os agentes consultados pela Autoridade Monetária possuem interesse direto na definição de altas taxas de juros.
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