Terça, 30 de agosto de 2016
Crédito da foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil e Mídia NINJA. Montagem: PSOL
Luiz Araújo*
Luiz Araújo*
Juliano Medeiros**
Esta semana o Senado Federal deve concluir o processo de impeachment
de Dilma Rousseff. Com isso, pela primeira vez desde o fim da Ditadura
Militar, o Brasil terá um governo ilegítimo, fruto de um golpe
parlamentar. O PSOL nunca fez parte das gestões de Lula e Dilma. Desde
sua fundação, nosso partido sempre esteve na oposição aos governos
petistas, exatamente por não concordar com as alianças feitas pelo PT
para garantir a famigerada “governabilidade” e com os rumos de sua
política econômica. Por isso, nunca tivemos cargos ou ministérios nos
governos petistas. Apesar disso, nos engajamos firmemente na luta contra
o golpe, já que consideramos inadmissível apoiar a deposição de uma
presidenta legitimamente eleita sem a comprovação de crime de
responsabilidade ou manter-se alheio à luta política que se trava no
país.
Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, Dilma não foi
afastada pela corrupção em seu governo. Ela foi afastada por decretos e
medidas fiscais (as tais “pedaladas”) que foram promovidas por todos os
ex-presidentes e por inúmeros governadores. Por isso o governo Temer é
ilegítimo: ele é produto de um impeachment realizado sem a comprovação
de crime de responsabilidade. E por que o golpe foi promovido agora?
Porque o mercado exige a implementação de medidas “impopulares” que
nunca teriam apoia da maioria da população nas eleições, como a
privatização da saúde e da educação, o fim das políticas sociais ou uma
reforma da previdência que retirará direitos das mulheres. O golpe,
portanto, é uma iniciativa do mercado e seus parceiros no Congresso
Nacional, partidos corruptos que não têm nenhum compromisso com os
direitos sociais. Por isso o PSOL disse não ao golpe e defende, com o
afastamento definitivo de Dilma, o impeachment do corrupto Temer e a
convocação de eleições presidenciais, como prevê a Constituição Federal,
para devolver ao povo o direito de decidir.
O discurso de Dilma
O discurso de Dilma, na manhã desta segunda-feira, foi o mais altivo e
corajoso realizado por ela desde sua posse como presidente da
República, em 2011. Infelizmente, foi tarde demais. Sua opção por fazer
uma denúncia do golpe em curso, ao invés de tentar “convencer” os
senadores supostamente indecisos, foi correta. Podemos dizer, com a
intervenção feita por Dilma esta manhã, que o ciclo da conciliação
chegou ao fim no Brasil. É claro que muitos partidos e lideranças não
compreenderão esse marco e seguirão buscando alianças com os partidos
que promoveram o golpe. Basta dizer que o PT, por exemplo, compôs
alianças com partidos golpistas em mais de mil municípios brasileiros
para as eleições municipais deste ano.
Se Dilma tivesse assumido a postura que assumiu esta manhã no Senado
desde o início de seu segundo mandato, talvez o golpe não tivesse se
consumado. Se não tivesse cedido às pressões do mercado implementando um
duríssimo ajuste fiscal que retirou direitos e aprofundou a recessão,
não teria minado o que restava de apoio junto às camadas populares. Se
não tivesse entregado sete ministérios ao PMDB no começo deste ano,
talvez parte da população não tivesse visto a luta em torno do
impeachment como uma briga dos “de cima”. Se não tivesse buscado um
acordo com Eduardo Cunha para evitar o processo contra si na Câmara dos
Deputados, talvez o corrupto peemedebista tivesse iniciado o impeachment
sem que o desgaste do governo Dilma agisse a seu favor. Mas a história
“contrafactual” – isto é, aquela que se escreve com os fatos que não
ocorreram – não pode explicar a realidade. Embora por vias trágicas, o
fim da era de conciliação abre novas perspectivas e desafios para os
setores democráticos, progressistas e de esquerda.
Evidentemente, o impeachment vai produzir enormes retrocessos. Sem a
presença de uma oposição parlamentar e social substantiva ao governo
Temer, ele poderá promover facilmente a retirada de direitos. Afinal é
para isso que o golpe foi promovido. Por isso é preciso construir um
novo polo social e político de esquerda que negue radicalmente a
conciliação com os poderosos de sempre. Uma das lições destes 13 anos de
governos petistas é que projetos reformistas só podem prosperar em
contextos de expansão econômica: é a chamada política do “ganha-ganha”,
em que as classes populares e as elites econômicas são beneficiados
simultaneamente pelo crescimento da economia. Em contextos de recessão,
no entanto, a disputa pelo fundo público amplia a polarização e
radicaliza os conflitos de classe, como temos visto na Venezuela, onde a
lógica da conciliação não foi o caminho adotado por Hugo Chávez.
Nossos desafios
Por isso, a destituição de Dilma e seu discurso na manhã desta
segunda-feira marcam o fim deste ciclo de conciliação. A esquerda que
surgirá dos escombros da crise petista deverá negar peremptoriamente a
dependência em relação às classes dominantes. Deverá ser uma esquerda
independente, combativa e plural. Hoje, o polo mais dinâmico desse
processo de reorganização, que se iniciou com a crise do mensalão, em
2005, e ganhou fôlego com os primeiros protestos de junho de 2013, é o
PSOL. Esse processo, no entanto, não se dará sem contradições. A figura
de Lula, por exemplo, continua sendo o mais poderoso símbolo em favor da
política de conciliação de classes. Ele segue tendo, seja por sua força
carismática, seja pelos avanços sociais promovidos em seu governo, uma
grande influência entre setores sociais fundamentais para este processo
de reorganização. Por isso, construir uma alternativa independente nas
eleições presidenciais em 2018 é uma necessidade incontornável.
Até lá, os setores sociais que lutaram contra o golpe deverão manter a
frente única que se formou nos últimos meses. Essa frente, cuja
principal expressão é a articulação em torno da Frente Povo Sem Medo,
terá como tarefa principal o combate às medidas antipopulares do governo
Temer. Esse enfrentamento começa na luta contra as propostas de
congelamento dos salários e investimentos públicos e da reforma da
previdência. Do resultado deste embate dependerá o ritmo e o sentido
geral do processo de reorganização da esquerda. O PSOL estará na linha
de frente desta luta, contribuindo com sua atuação parlamentar e nos
movimentos sociais para derrotar Temer e construir uma nova síntese
política capaz de fortalecer um projeto socialista, democrático e
popular para o Brasil.
*Luiz Araújo é presidente nacional do PSOL.
**Juliano Medeiros é presidente da Fundação Lauro Campos.
Fonte: Site do Psol
Fonte: Site do Psol