Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 15 de junho de 2020

Uma mulher conta

15 de junho

Uma mulher conta 

   Vários generais argentinos foram levados a julgamento por causa das façanhas que cometeram nos tempo da ditadura militar.
   Silvina Parodi, uma estudante acusada de atividades subversivas por viver protestando e criando caso, foi uma das muitas desaparecidas para sempre.
   Cecília, sua melhor amiga, prestou depoimento diante do tribunal, no ano de 2008. Contou os suplícios que havia sofrido no quartel, e disse que tinha sido ela quem entregou o nome de Silvina, quando não conseguiu mais aguentar as torturas de cada dia e de cada noite:
   - Fui eu. Eu levei os verdugos até a casa onde Silvina estava. Eu vi quando ela saiu, aos empurrões, às coronhadas, aos pontapés. Eu escutei ela gritar.
   Na saída do tribunal, alguém se aproximou e perguntou a Cecília, em voz baixa:
   - E depois disso tudo, como é que você faz para continuar vivendo?
   E ela respondeu, em voz mais baixa ainda:
   - E quem é que disse que eu estou viva?

Eduardo Galeano, no livro 'Os filhos dos dias'. 2ª ed., pág. 195, L&PM Editores.