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(Millôr Fernandes)

sábado, 18 de junho de 2022

CULTURA POPULAR —Tradição maranhense, Bumba Meu Boi é celebrado no DF

Sábado, 18 de junho de 2022
Projeto resgata tradições nordestinas e promove ações sociais na região — Foto: Henrique Silva



CULTURA POPULAR
Tradição maranhense, Bumba Meu Boi é celebrado no DF

Festa do Boi de Itapoã acontece neste sábado (18), o evento é gratuito

Cláudia Maciel
Brasil de Fato | Brasília (DF) | 18 de Junho de 2022

O festejo de batizado do Boi de Itapoã, que já virou tradição cultural na região administrativa do Distrito Federal, acontece neste sábado, 18, a partir das 15 horas.

O evento gratuito reunirá a diversidade de expressões culturais como contação de histórias, tambor de crioula, maracatu, quadrilha, reggae, cine debate e ainda barracas com comidas típicas.

A festa é realizada há 17 anos pela Mestra Eliana Costa que nesta edição conta com o apoio do Instituto Casa da Vila e do projeto Baú das Artes. Eliana conta que o evento começou no projeto de Educação de Jovens e Adultos no Itapoã.

"Fui uma das primeiras professoras da educação de jovens e adultos. Era uma parceria entre o Centro de Desenvolvimento do Paranoá e Itapoã e o Centro de Educação Paulo Freire de Ceilândia. A culminância do nosso trabalho naquele ano era realizar uma comemoração cultural. Ao perguntarmos sobre o que gostariam de realizar culturalmente para finalizar o curso, responderam em uníssono que queriam o festejo do Bumba Meu Boi. Os alunos da Universidade de Brasília, que sempre nos ajudaram em vários projetos, fizeram uma pesquisa sobre a origem do povo que compunha a região do Itapoã e como resultado descobrimos que a maioria eram nordestinos, do interior do Maranhão, e fez todo sentido realizar essa atividade no ambiente escolar", diz.

No primeiro ano de realização da festa, Eliana conta que as roupas foram feitas com folha de bananeira. Com o passar do tempo, o festejo continuou "até chegar ao ponto em que começamos a comprar roupas oficiais e adquirimos o boi tradicional. Só que neste ano de 2022, ao invés de comprar, nós estamos fabricando as nossas vestimentas", conta a mestra.


Figurino

Em 2022, Amanda Santos Viana, 30 anos, moradora do Itapoã desde 2011, é a figurinista do festejo.

"Aprendi a fazer roupa nos anos que dancei bumba meu boi no Maranhão. Sou de Bacuri, interior do Maranhão. Lá os nossos pais compram o material da roupa ou alguém doa e vamos para uma casa que a organização do boi aluga e a gente aprende a bordar e a costurar. Aqui comecei ensaiando as meninas, ensinando-as a dançar, sem remuneração, por amor, porque dancei muito no interior do Maranhão e amo essa cultura. Danço boi desde os seis anos".

Este ano as roupas do festejo estão sendo confeccionadas pelo próprio grupo / Divulgação

A inspiração do figurino deste ano vem de uma música de nome "Minha Morena Rosa" e de um pássaro chamado Japiim conhecido no norte do Brasil. Com penas pretas e amarelas, é também chamado de xexéu, japuíra, joão-conguinho e pássaro tecelão. Não tem canto próprio. Vive a imitar o canto de outros pássaros. Já a música "Minha Morena Rosa", foi composta por Amanda em homenagem a rosa morena, mulher maranhense.

"Nosso sonho era fazer a nossa própria roupa. Essa é a primeira vez que conseguimos. Nossas vestimentas de 2022 possuem os tons vermelho, que vem da rosa e o preto e amarelo do Japiim. A índia guerreira e a mestra Eliana terão as roupas todas bordadas de rosas. A minha experiência como figurinista e coreógrafa são experiências de vida. Tenho o sonho de fazer um curso e me formar, mas é tudo experiência de vida. Eu nunca tinha desenhado croqui de roupa. Só tenho criatividade e vontade de fazer", conta Amanda.

Transformação social

Maria do Carmo, conhecida como Carmem, participa do festejo Bumba Meu Boi desde o início por meio do projeto "DF Alfabetizado", em que a Mestra Eliana era professora. Nos 17 anos em que acontece a festa no Itapoã, teve três filhas, Loys Lene, Julia e Maria Vitória. Todas cresceram e se desenvolveram dentro da cultura maranhense.

"No crescimento em geral das minhas filhas foi super importante essa cultura, principalmente na vida da Maria Vitória. Aos seis meses de idade, foi detectado pela medicina que ela possuía transtornos mentais que até hoje não há um diagnóstico exato. Minha filha não tinha coordenação motora para fazer os ensaios, aprender a coreografia e se locomover. Era muito tímida e sofria com transtorno de ansiedade. As oficinas de dança oferecidas para a festa ajudaram em seu desenvolvimento. Hoje consegue se equilibrar melhor, dança quase umas três músicas inteiras, desenvolveu autoestima, aprendeu a se defender do bullying, intelectualmente teve grande avanço e se relaciona muito melhor com as pessoas. Me sinto fortalecida por este festejo. Foram mudanças significativas no meu lar", conta Carmem.

Para Samantha Santos, que participa há 12 anos da festa, o festejo apareceu como um resgate de um momento delicado que vivia em sua vida. Atualmente é maquiadora das dançarinas e foi nomeada a Índia Guerreira do Boi.

"Fazer parte disso foi um resgate. Entrei e não consegui mais sair. Crescer nesse meio influenciou muito na mulher que sou. Fazia tudo isso com a participação da minha mãe. Ela também foi uma das fundadoras e dançarinas de tambor. Infelizmente não está mais entre nós, mas tô aqui firme continuando porque a dança é algo muito forte e lindo que tínhamos em comum", relembra Samantha.

Assim como para Samantha, o festejo do boi representou para Débora Cristina, integrante do grupo, memórias afetivas sobre a infância. "Crescer dentro do grupo foi maravilhoso. Fiz parte do primeiro grupo de dançarinas. Somos amigas desde pequenas. Temos muitas histórias para contar juntas. Participo desde os meus oitos anos de idade e faço de tudo um pouco", diz.


Reconhecimento

No ano de 2013, Eliana Costa recebeu o certificado como Mestra de Cultura do Itapoã pela Secretaria de Cultura do Distrito Federal. Nessa mesma oportunidade, recebeu o Prêmio Cultura Viva na categoria Culturas Populares.

A partir desse reconhecimento, a mestra investiu todo o dinheiro da premiação e formalizou a Associação Cultural Encanto de Itapoã e Paranoá (ACEIP), está movimentando as formalidades para a criação da Companhia do Bumba Meu Boi e também do Tambor de Crioula.

"Eu estava presente em toda a solidificação do Itapoã. O Encanto esteve sempre presente. E hoje, falta espaço para nós termos uma sede em Itapoã. Precisamos ter um local para nos desenvolver e não temos. Esse é o nosso grande desafio. Por não termos um espaço próprio, fomos notificadas que não poderemos receber mais incentivos para ampliar o que já desenvolvemos. Ocupamos a rua para atuar. Temos toda a base, mas precisamos do espaço físico", conta a mestra Eliana.

Patrimônio Cultural

O Bumba Meu Boi é uma festa tradicional maranhense, em 2011 recebeu o título de Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e em 2019 recebeu o título de Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).


Programação

Festejo de Nascimento do Bumba Meu Boi

Local: Sede da Aceip, Quadra 3, Conjunto C, Casa 45, Fazendinha Itapoã

Sábado, 18 de junho

15h - Exibição do Filme Bumba Meu Boi - Patrimônio da Humanidade e Roda de Conversa sobre Desenvolvimento e Cultura no Itapoã, com mediação de Luana Gomes

17h Lançamento dos projetos AfroBrasília e Baú das Artes

17h30 Cia Mamulengo Gratidão, com Miguel Mariano, contando histórias

18h Maracatu do Boiadeiro Boi Brilhante

18h40 Grupo Não Sou Obrigada

19h Grupo Dança Brasileira

19h40 Nani de Menezes

20h30 Tambor de Crioula Brilho de Santa Luzia

21h10 Quadrilha Tradição

22h Batizado do Encanto de Itapoã

23h Radiola Reggae


Edição: Flávia Quirino