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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

O comprometimento da Gestão Pública com os subsídios

Segunda, 26 de dezembro de 2020


Por
Salin Siddartha*

As raízes históricas do subsídio no Brasil revelam que a gestão pública nacional está culturalmente comprometida com a prática de criar e utilizar subsídios econômicos. Observa-se na formação econômica brasileira a presença de interesses oligarcas na operacionalidade dos subsídios, sem que a própria República tenha conseguido dar cabo da manipulação que o patriarcalismo exerce sobre eles, notadamente na fase da política do “café-com-leite”, que se sucedeu até 1929. Com o advento da Segunda República, os governos, desde a ditadura de Vargas, têm executado os subsídios tanto como subvenção quanto como investimento, instaurando, em muitas ocasiões, confusão fiscal na operação das políticas econômicas, particularmente sobre o pagamento pelo Tesouro de compensação por subsídios aos bancos privados.

Em vez de significar apenas uma intervenção necessária do Estado na economia nacional, ou uma medida de inevitável proteção ao próprio País, o subsídio, muitas vezes, pressiona os preços em uma interferência que rompe com o planejamento estabelecido pelos próprios governos. Outrossim, uma casta burocrata no serviço público atrapalha por demais a consecução democrática de princípios a que se deve respeitar quando se aplicam os subsídios. Assim, o subsídio vem acarretando efeitos perversos sobre a economia ao viabilizar à iniciativa privada a realização de um projeto antieconômico que prejudica o cidadão, tanto como contribuinte, quanto como consumidor.

Não existe neutralidade subsidiária, pois todo o dinheiro requerido para prover um serviço gratuito governamental é retirado da produção, com o correspondente custo sendo pago por intermédio de uma imposição aos contribuintes. Assim, tem-se de considerar não só o benefício proporcionado pela ação subsidiária do governo, mas também o seu custo, levando-se em conta que o governo consegue dinheiro por intermédio do poder coativo da tributação; logo, ao subsidiar serviço gratuito, o governo sobrepõe-se à lei do mercado e consegue fundos quando o desejar – mas à custa do contribuinte.

Por outro lado, os recursos para “bancar” um serviço gratuito não são alocados por meio de decisão racional. Então, quando faltam professores, profissionais de saúde ou hospitais, por exemplo, o governo só apresenta como solução a necessidade de arrecadar mais e, com relação a esse fato, aumentar a taxação e os impostos a título de subsidiar para suprir determinadas áreas carentes de servidores públicos ou de equipamentos públicos. Isso representa tentar encobrir a falta de planejamento governamental, o que termina em um ciclo vicioso que se apresenta na falsa premissa de que, quanto mais o governo gastar, mais serviços poderá oferecer – até que se chegue ao ponto do colapso orçamentário e se instaure o caos, pois não há poço sem fundo.

A prática do subsídio no Brasil tem de ser efetuada de modo sóbrio e consequente, que resulte em política estrutural de Estado, e não conjuntural de governo, pois os governos se sucedem, alterando a política de concessão de subsídios “ao Deus dará”, mudando-a por qualquer “dá-cá-aquela-palha”, ocasionando o efeito inverso ao da proteção aos setores que devem ser socorridos, pela quebradeira geral, devido ao fato de trocar as regras do jogo (no decorrer do próprio jogo), deixando os subsidiados abruptamente desamparados. Afinal, os governos e suas políticas mudam; o Estado é que permanece. A prática do subsídio no Brasil precisa ser efetuada dentro do princípio da razoabilidade, empregada como política de Governo apenas nas intervenções temporárias exercidas em prol de correções emergenciais de falhas conjunturais de mercado ou em presença de estado de calamidade pública, que devem perdurar apenas até que se recomponha o equilíbrio social e econômico que motivou a necessária concessão do subsídio.

Deve-se ter uma visão crítica em relação ao tema, ao invés de uma adesão ao discurso do paternalismo intervencionista tão em voga nos dias atuais. É preciso que se saia do protecionismo que, à custa do contribuinte, vai criando certa irresponsabilidade social no trato do dinheiro público e estrangula o orçamento e as finanças públicas. É preciso que os subsídios passem a ser vinculados a metas de desempenho e prazos predefinidos, acarretando a perda do benefício para quem não cumprir o acordo estabelecido.

Cruzeiro-DF, 27 de dezembro de 2020

SALIN SIDDARTHA

Este artigo foi publicado originariamente nesta segunda (28/12) no Por Brasília

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Leia, do mesmo autor, artigo publicado no dia 22 de dezembro sob o título 'Questionamento sobre a distorção dos subsídios no Brasil'