Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 16 de janeiro de 2021

“DESCOMPROMISSO”. Conselho de Saúde aponta responsabilidade do governo Bolsonaro em crise de Manaus

Sábado, 16 de janeiro de 2021

Órgãos federais e estudais também engrossam coro e dizem que gestão precisa viabilizar soluções para caos sanitário

Na capital amazonense, onde a covid-19 já matou mais de 5.300 pessoas - Michael Dantas/AFP
Brasil de Fato | Brasília (DF) 
15 de Janeiro de 2021
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) rebateu, nesta sexta-feira (15), as declarações do governo Bolsonaro a respeito do caos sanitário na cidade de Manaus (AM), onde a falta de oxigênio provocou a morte de diferentes pacientes na quinta-feira (14) por asfixia.

A conselheira Vanja Santos, da mesa diretora da entidade, disse que o presidente da República não pode se isentar da responsabilidade sobre a situação da capital amazonense, onde a covid-19 já matou mais de 5.300 pessoas. O CNS também publicou nota na noite desta sexta (15) pedindo "providências imediatas" para a crise. 

“Já faz muito tempo, desde o início da pandemia, que o governo federal não tem feito a parte dele, que seria agir desde o principio pra que nós não chegássemos a este ponto, tomar a dianteira do cuidado com a população brasileira. Nós tivemos, no primeiro momento, o governo fazendo pouco da pandemia, das infecções”, disse Santos ao Brasil de Fato, após  Jair Bolsonaro dar mais uma declaração controversa sobre o avanço do novo coronavírus no país.

"A gente está sempre fazendo o que tem que fazer, né? Problema em Manaus: terrível o problema lá, agora nós fizemos a nossa parte, com recursos, meios", declarou o chefe do Executivo.

O ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, também se manifestou de forma polêmica após o agravamento da situação da cidade. Ele chegou a colocar a culpa nas chuvas, por exemplo.

A manifestação foi feita três dias após Pazuello visitar o Amazonas, que hoje acumula quase 6 mil óbitos registrados e mais de 223 mil infecções pelo novo coronavírus, segundo contagem oficial.

O ministro também culpou a distância e as dificuldades de logística para tentar embasar a carência de oxigênio, suprimento que é de responsabilidade do governo federal.

E acrescentou: “Manaus não teve a efetiva ação no tratamento precoce com diagnóstico clínico no atendimento básico, e isso impactou muito a gravidade da doença”.

A declaração do mandatário é uma referência indireta à defesa do governo Bolsonaro em torno do uso de medicamentos sem comprovação científica para esse tipo de tratamento, como é o caso da cloroquina.  

“O governo federal tira algumas coisas da cabeça e quer impor à população sem que pra isso tenha dados científicos. É um pacote que eles tentam impor e querem culpabilizar os médicos e as instituições que não aderirem a isso. É uma política genocida da população brasileira, e eu não posso ver essa declaração do Pazuello como algo sério”, critica Vanja Santos. 

O que faltou?

Na avaliação do CNS, o governo federal tem “forte responsabilidade” no processo que levou a capital amazonense ao status atual da crise de saúde pública. Segundo aponta a conselheira, em primeiro lugar, o “descompromisso” de Bolsonaro com o enfrentamento à covid-19 deixou gestores locais à deriva, tendo que administrar por conta própria fluxos e demandas que, via de regra, dependem de uma lógica conjunta – a mesma que orienta o Sistema Único de Saúde (SUS), que opera de forma tripartite, envolvendo União, estados e municípios.

“Faltou um plano nacional de enfrentamento à covid-19, o que acabou sendo feito pela Frente pela Vida. Faltou o governo estabelecer um plano como esse e chamar os pares pra dialogar, participar e interagir com ele. E faltou acompanhar o desenrolar nos estados, estabelecimento de lockdown onde fosse necessário, etc.”, resgata Vanja Santos, lembrando que Bolsonaro chegou inclusive a criticar o lockdown do estado do Maranhão, por exemplo, em maio de 2020.

Para o Conselho Nacional de Saúde, faltou ainda abastecer os entes federados com insumos e  equipamentos, como é o caso do remédios, equipamentos para exame pulmonar, entre outros. “Também faltam profissionais especializados para o cuidado intensivo dos pacientes que necessitam de auxílio para respirar”, acrescenta Vanja, ao falar em “negligência”.

Uma situação foi puxando a outra. E, quando você vê a situação do Amazonas, se está buscando oxigênio pra região que é exatamente o pulmão do mundo. Mas, quando você chega nessa situação e vai no hospital, está faltando muito mais do que oxigênio”, relata a conselheira, ao mencionar que familiares de pacientes estão buscando remédios e equipamentos por conta própria para tentar aumentar a expectativa de vida dos doentes.

Outros órgãos

Diferentes órgãos públicos federais e estaduais ajudaram a engrossar o coro feito pelo CNS. Na quinta-feira (14), por exemplo, uma ação civil pública protocolada na Justiça Federal de Manaus apontou que o governo Bolsonaro seria o responsável por ter que buscar uma saída para o colapso na disponibilidade de oxigênio medicinal no estado.

A argumentação é do Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU), do Ministério Público do Estado do Amazonas, da Defensoria Pública do Estado do Amazonas e do Ministério Público de Contas estadual. Juntos, eles assinam a ação.

A Justiça acatou parcialmente os pedidos feitos pelos órgãos e estipulou prazo de 24 horas para que o governo Bolsonaro se manifestasse e providenciasse a transferência de pacientes para outros estados.

Também foi estabelecido que a União deve apresentar planejamento de suprimento das necessidades da rede estadual de saúde.

Seguindo a mesma linha, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na noite desta sexta (15), que a gestão Bolsonaro tem responsabilidade sobre a situação e precisa enviar oxigênio para a capital amazonense com urgência.

Também determinou o prazo de 48 horas para que a gestão apresente um plano detalhado com estratégias de atuação no local. A decisão atende um pedido feito pelo PT e pelo PCdoB e estipula ainda que o governo atualize o plano a cada 48 horas “enquanto perdurar a conjuntura excepcional”.  

Edição: Leandro Melito

Fonte: Brasil de Fato