Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 31 de janeiro de 2021

DOIS LADOS DA MESMA MOEDA

Domingo, 31 de janeiro de 2021

Por

Juan Ricthelly*

Uma histeria coletiva parece ter tomado conta de parte da esquerda no que diz respeito à eleição da Câmara dos Deputados, que ocorrerá na próxima segunda (01/02), onde dois candidatos não tão diferentes polarizam a disputa, dividindo partidos, bancadas e até mesmo casais.

Arthur Lira (Progressistas-AL) é o candidato do governo, que tem movido mundos e fundos para conseguir o máximo de apoio, numa tentativa de ter o controle da Câmara dos Deputados.

Baleia Rossi (MDB-SP) é a alternativa abraçada por parte da esquerda como contraponto ao governo Bolsonaro, mesmo tendo uma porcentagem de apoio ao governo em votações maior que a de seu adversário, e apesar do seu total alinhamento com a agenda neoliberal de Paulo Guedes.

Ambos são golpistas de 2016, que depois votaram a favor da PEC do Teto de Gastos, da Reforma Trabalhista e da Previdência e ajudaram a impedir que investigações fossem abertas contra Temer em 2017.

Por mais desesperada que seja a narrativa paranoica que se tenta construir nesse momento, numa tentativa de diferenciá-los, a verdade é que, Baleia e Lira são dois lados da mesma moeda, inimigos da classe trabalhadora, comprometidos até o osso e a alma, com o Estado de Mal Estar Social que vem sendo construído em nosso país.

A única diferença pontual que vale a pena destacar, é que Lira é o candidato de Bolsonaro nessa disputa, e que embora Baleia não seja, tampouco é um candidato antibolsonaro, para constatar essa afirmação, basta assistir a sua participação recente no Roda Viva.

Ainda assim, um maniqueísmo narrativo tenta distingui-los como forças políticas antagônicas, projetando um cenário apocalíptico diante de tais opções.

Até mesmo o PSOL se encontra dividido nessa questão, que aflorou os ânimos da militância e parlamentares nas redes sociais, que protagonizaram uma lavagem de roupa infeliz, escancarando uma divergência que segue aberta, mesmo depois da posição oficial do partido decidir por uma candidatura própria, muito bem representada pela companheira Luiza Erundina.

Desde o começo do debate, o MES (Movimento Esquerda Socialista) se posicionou favoravelmente ao apoio já no primeiro turno ao candidato Baleia Rossi, e recentemente a Insurgência mudou o seu entendimento, indo no mesmo sentido.

Os argumentos variam, passando por discussões conceituais sobre tática, estratégia, pragmatismo e coerência. Sendo a necessidade de derrotar o bolsonarismo nessa disputa, o argumento central, havendo uma mescla conturbada de racionalidade pragmática e terrorismo psicológico, ao longo das argumentações apresentadas.

Se ignora completamente a falta de compromisso ou qualquer concessão mínima de Baleia com demandas da esquerda, da mesma maneira que seguem ignorando as bandeiras levantadas pela candidatura de Erundina: Impeachment; Vacinação; Volta do Auxílio Emergencial...

É um fato que, nem mesmo se todos os partidos do campo progressista se unissem em torno de uma candidatura, teriam qualquer chance de ganhar. 

Da mesma forma, é um fato que Baleia Rossi não tem a menor chance de ganhar sem os votos do campo progressista, que é a metade do que precisa para vencer, isso não é pouca coisa, e poderia muito bem ter dado um poder de barganha que não foi nem sequer cogitado, desde o início se abriu mão de apresentar uma alternativa de esquerda em bloco, para simplesmente abraçarem um inimigo da classe trabalhadora como a salvação da democracia e da república.

Tudo isso acontecendo enquanto se tenta sabotar e desmobilizar a única candidatura que defende e propõe abertamente o que defendemos todos os dias.

Formalmente o PSOL possui direito e legitimidade de apresentar candidatura própria no primeiro turno, que represente o que defendemos e acreditamos como partido. Politicamente é imperioso que se diferencie do todo, não abrindo mão do debate, pautando questões importantes para a classe trabalhadora, antes de se diluir numa aliança pragmática, sem qualquer ganho, concessão ou apego mínimo à coerência política.    

Não podemos e não devemos nos tornar reféns do medo, do desespero e das circunstâncias, não é fácil defender o que defendemos, mas alguém precisa fazer essa tarefa tão inglória, ainda mais no momento em que vivemos, e caso faltemos, a história nos cobrará.

*Juan Ricthelly, morador do Gama (DF), é militante do Psol/DF, advogado, ativista em defesa do meio ambiente e das lutas populares da cidade e do DF.

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Observação: Por ser o texto acima de opinião, não necessariamente as colocações do autor coincide com a opinião do Blog Gama Livre.