Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 18 de setembro de 2022

A VIDA DAS PESSOAS E OS CONCEITOS E DIREITOS DIFUSOS

Domingo, 18 de setembro de 2022
...o domínio dos capitais marginais na economia do 
século XXI que gerencia o mundo ocidental.


Pedro Augusto Pinho

“O Estado de S.Paulo”, domingo, 18 de setembro de 2022, página A3: “Há quatro décadas grupos armados expandem seu domínio territorial na região metropolitana do Rio de Janeiro. Nos últimos 16 anos o crime organizado ampliou seus territórios em 131%, saltando de 8,7% da área urbana habitada para 20%. As milícias estão se tornando a principal ameaça à segurança no Rio”.

Wikipédia: “Iniciada na noite de 12 de maio de 2006, uma sexta-feira, a onda de atentados contra forças de segurança e alguns alvos civis com origem no estado de São Paulo por ordem do grupo criminoso conhecido como Primeiro Comando da Capital (PCC). No dia 14, o ataque já havia se espalhado por outros estados do Brasil, como Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Bahia. Em todo o estado, 564 pessoas foram mortas e 110 ficaram feridas entre 12 e 21 de maio de 2006, dos quais 505 eram civis e 59 agentes públicos (Atos_de_violência_organizada_no_Brasil_em_2006, acesso 18/09/2022, 11h20min).

´”Monitor Mercantil”, terça-feira, 13 de setembro de 2022, 1ª página: “Escravidão: mais da metade em países de renda alta ou médio-alta. Número de vítimas cresce 10 milhões em cinco anos. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançou estudo revelando que 59 milhões de pessoas viviam em escravidão moderna em 2021. Segundo as estimativas, 28 milhões realizavam trabalho forçado, sendo que 3,3 milhões eram crianças”.

Em duas semanas o Brasil estará elegendo o Presidente e Vice-Presidente da República, governadores de 26 Estados e do Distrito Federal, 513 deputados federais, e renovando 27 senadores (um terço do Senado).

A “Gazeta do Povo”, do Paraná, elenca os quatro temas que pautam a eleição de 2022, no exemplar de 18/09:

(1) a saúde e a pandemia, embora “Covid-19 tenha diminuído ao longo de 2021”;

(2) a inflação, crescimento econômico e desemprego – “a maioria acredita que a situação econômica do país vai continuar parecida ao longo de 2022 ou que vai piorar, e considera que houve um aprofundamento da desigualdade social”;

(3) corrupção e Lava-Jato, “o tema promete voltar, mas em um contexto diferente e não com a mesma força de 2018. A Lava Jato acabou. Lula foi solto. Moro foi considerado parcial ao julgar o petista. E o anseio do eleitor por renovação arrefeceu”; e

(4) democracia e liberdades individuais, “a preocupação com a democracia no caso de reeleição do presidente Bolsonaro é algo que já vem sendo trabalhado por seus opositores; na outra ponta do espectro político, o tema das liberdades individuais, que vieram à tona devido às restrições impostas por prefeitos e governadores por causa da pandemia, deve continuar relevante. Restrições de publicações nas redes sociais e prisões de apoiadores de Bolsonaro devem continuar sendo temas relevantes para o eleitorado do presidente, embora os analistas salientam que, de uma maneira geral, eles não devem influenciar na corrida eleitoral — a não ser que novos atos do STF e do TSE e novas restrições devido à pandemia deem fôlego ao debate”.

Há temas, questões, problemas que afligem pela emergência. São constituídos de situações cuja solução não pode esperar, tais como, a fome, a doença, a falta do mínimo recurso para sobrevivência.

Sociedades mais avançadas, onde a pessoa humana não é simples objeto do discurso mas o objetivo da política, desenvolvem soluções estruturais, ou seja, que nas condições tecnológicas, econômicas e políticas daquela época, independam do governo, sejam funções públicas que garantam permanentemente a efetividade da solução.

Outras, menos desenvolvidas politica e socialmente, apresentam soluções conjunturais, quais sejam, as que minimizam ou reduzam, na proximidade da eleição, os problemas que atinjam um grande quantitativo de pessoas. No entanto, estas soluções têm duração limitada.

O termo democracia é indistintamente utilizado para governos aristocráticos, como do reino Unido, de grupos plutocráticos, como dos Estados Unidos da América (EUA), de burocracias partidárias, como os comunistas, e até de seguidas consultas populares, para escolha de dirigentes, para aprovação de leis e de alterações nos poderes e estamentos estatais, como na Venezuela, e onde a lei maior seja de crença religiosa, como no Vaticano e no Irã.

Pela pesquisa reportada na “Gazeta do Povo”, o grau de compreensão política da população brasileira é muito baixo, não vincula sua experiência ao conjunto da sociedade, nem a algo mais abrangente do que “a vontade de Deus”. E, nesta falta de civismo, diversos aproveitadores constituem até partidos políticos, alguns verdadeiros braços de igrejas de diferentes denominações.

Esta situação de analfabetismo político ocasiona mesmo verdadeiros suicídios, como do pobre que vota no pastor, que nem lhe oferece emprego digno ou mesmo refeição e abrigo.

Nos noticiários transcritos, vemos o avanço de certa marginalidade no domínio da sociedade. Se buscarmos a origem não precisamos ir longe, e demonstramos.

Depois da II Grande Guerra, dois países assumiram a liderança mundial, com filosofias político-econômicas opostas, mas ambos dizendo-se democráticos: os EUA e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Mas havia um ponto de identidade entre estas potências: a industrialização como elemento de produção de riqueza. Esta industrialização dependia em ambos países do Estado, mas nos EUA eram as empresas privadas que as gerenciavam e recolhiam para os proprietários das empresas a maior parcela dos ganhos. Na URSS o Estado agia diretamente na gestão e recolhia os ganhos, que distribuía por critérios de prioridade política entre a população e os empreendimentos do próprio Estado.

Estes modelos produziram ganhos em ambos os países. O surgimento de uma classe média consumista nos EUA, e o Estado tecnologicamente poderoso, primeiro a enviar um homem no espaço, na URSS.

Os gastos destes Estados e de seus aliados levaram à crise do modelo político-econômico para o mundo do pós-guerra, o mundo da Conferência Monetária e Financeira Internacional das Nações Unidas e Associadas, em Bretton Woods, New Hampshire (EUA), entre 1º e 22 de julho de 1944, que elaborou regras para o sistema monetário internacional. Esta conferência criou o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (WB).

A derrota militar dos EUA na Guerra do Vietnã (1965-1975) ameaçou a estabilidade do dólar e ajudou a colocar o sistema de Bretton Woods em vulnerabilidade ainda maior, à medida que as reservas estadunidenses de ouro caiam drasticamente.

Paralelamente, as finanças, que levaram o Reino Unido à condição de maior potência no século XIX, derrotadas nas duas Grandes Guerras da primeira metade do século XX, reagiam com ajuda dos movimentos ecológicos e produziram as “crises do petróleo”, na década de 1970.

Em 15 de agosto de 1971, Richard Nixon, presidente dos EUA, emitiu a Ordem Executiva nº 11.615, com suporte na Lei de Estabilização Econômica de 1970, impondo unilateralmente controles de preços e salários por 90 dias, a sobretaxa de 10% de importação e, mais importante, tornando o dólar inconversível em ouro diretamente, exceto no mercado aberto, anunciada como suspensão “temporária”.

O sistema do industrialismo começa a ceder poder para o sistema financeiro.

Por toda década de 1980, ocorrem as desregulações financeiras, o início do crescimento explosivo dos paraísos fiscais, e a entrada no sistema financeiro, protegido pelas legislações e regulamentações dos capitais marginais, frutos de ilícitos penais, assim considerados em leis nacionais e acordos internacionais.

Após as “crises do petróleo”, os petrodólares regaram as finanças ocidentais que aplicaram em dívidas, principalmente na América Latina e na Ásia. Após as desregulações dos anos 1980, surgiram “crises” financeiras, com diversas denominações, pela Europa, Ásia, EUA e América Latina; no século XXI, há a grande crise de insolvência financeira nos anos 2008-2010, para qual os capitais marginais surgem como relevantes no sistema financeiro internacional e reivindicam parcela do poder.

Fica evidente que não houve apenas outra mudança de poder econômico, ocorreu profunda reforma de valores morais e nas relações sociais. Aquele que antes era visto como um “chefe de crime organizado” passa a ser membro de Foros Econômicos Internacionais, por ter a seu dispor trilhões de dólares em paraísos fiscais, capazes de mudar a política e o governo da maioria das nações com assento na Organização das Nações Unidas (ONU).

A imensa quantidade de papéis sem lastros, que é revelada na “crise do subprime” desencadeada em 24 de julho de 2007, trará a consequência do golpe de 2016, no Brasil, para que a nova riqueza surgida com a descoberta do pré-sal não se destine ao desenvolvimento do Brasil, mas para dar suporte aos saques dos investimentos nos paraísos fiscais.

Não precisa excepcional inteligência para concluir que o poder das milícias, no Rio de Janeiro, do PCC, em São Paulo, de um presidente que corrompe as forças armadas com cargos e aumentos de salários, tem a mesma origem: o domínio dos capitais marginais na economia do século XXI que gerencia o mundo ocidental.

E quem domina a economia domina a comunicação. Controla as mídias impressas e virtuais, as televisões e as rádios. Administra os mais importantes instrumentos da pedagogia colonial.

Qual Brasil está acima de tudo, que Deus está acima de todos?

Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.