Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 28 de abril de 2010

O jeito franco de Marina

Quarta, 28 de abril de 2010 
Por Ivan de Carvalho
Se o voto não fosse secreto, eu que sou jornalista político, com a obrigação de buscar ser isento no relato dos fatos e nas análises, mas sem perder o meu direito de cidadão e de jornalista de expressar minhas opiniões, estaria a um passo de dizer que estou a um passo (a estratégia do passo-a-passo) de votar em Marina Silva para presidente da República.
A senadora do PV, que rompeu com o PT e saiu do Ministério do Meio Ambiente porque para suas idéias e convicções lugar não mais achava no governo e no partido de Lula, saiu em defesa de outro que foi usado pelo presidente e o PT enquanto isso foi interessante para eles e depois alvejado pelo que Marina chama de uma “operação de guerra” para afastar Ciro da eleição presidencial.
    Marina ataca aqueles que só têm “democracia no discurso” e condena a utilização, pelo presidente Lula, pelo PT e pela cúpula do PSB, “às velhas formas de operar para eliminar possíveis concorrentes”.
    Esse ataque de Marina agrada porque ela deixou de lado aquela velha desculpa de tantos, que para evitar embates alegam não querer comentar “assuntos de outros partidos”, quando deles se esperaria exatamente que comentassem os assuntos tanto dos outros partidos quanto dos deles. E usou uma linguagem direta, coisa que poucos políticos de destaque fazem quando falam sobre questões polêmicas.
    Mas não é a defesa que fez de Ciro que me leva a simpatizar, como cidadão, com a candidatura de Marina Silva. É também a hombridade com que abandonou o ministério para não abandonar suas convicções e deixou o PT para não deixar-se submeter a um jugo partidário que tem inequívocas componentes autoritárias, ainda que tenha também outras que não estão nesta linha. Aliás, neste aspecto, o PT está mesmo em cima do muro, mas infelizmente doidinho pra pular pro lado de lá.
    E foi isto que mais me sensibilizou em Marina. Ela condenou a política brasileira em relação a Cuba e ao Irã. Ora, eu já o havia feito tantas vezes que cansara. Então vem Marina e reanima. E de uma maneira arrasadora, deixando-me indignado comigo mesmo por não ter encontrado antes dela as duas frases lapidares que ela usou para lapidar – no velho e punitivo sentido de apedrejar – a política externa brasileira e, por tabela, os regimes iraniano e cubano.
    Faço questão de transcrever. Sobre a “nossa” política para o Irã: “O Brasil é a única democracia ocidental que tem dado audiência a Ahmadinejad”. E mais inspirada ainda na abordagem da questão cubana: “Se os direitos humanos são importantes para os brasileiros, também são importantes para os cubanos”.
    Some-se a isso a conhecida posição de Marina Silva contra o aborto, admitindo, no máximo, um plebiscito para que a sociedade decida – sou mais radical contra este mal, minha consciência não admite que uma maioria, mesmo em âmbito nacional, dê a mães e médicos o poder de sentenciar à morte seres humanos totalmente inocentes e indefesos – e, então entendam como é pequena a distância que, neste momento, separa meu voto de Marina Silva.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.