Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 23 de junho de 2010

OAB reage ao Big Brother

Quarta, 23 de junho de 2010
 Por Ivan de Carvalho

    1. Motivos particulares incontornáveis impediram que escrevesse aqui, nos dois últimos dias. Exatamente quando se davam os retoques finais e se realizava, presente Dilma Rousseff, a convenção estadual do PMDB que lançou a chapa deste partido às eleições majoritárias. Composta pelo deputado e ex-ministro Geddel Vieira Lima para governador, senador César Borges e ex-prefeito e vice-prefeito de Salvador, Edvaldo Brito, para as duas cadeiras de senador em disputa e o atual vice-governador Edmundo Pereira como candidato à reeleição.
Essa chapa entra de maneira extremamente expressiva (a convenção foi uma demonstração de pujança política) em um cenário que praticamente nenhuma dúvida deixa quanto à realização de segundo turno para as eleições de governador. Como o assunto já foi amplamente abordado pela mídia e políticos, em noticiário e análises, passo a outro.
    2. Até que enfim está se realizando o que já há muito tardava e algumas vezes cobrei aqui neste jornal, como em muitos outros lugares – menos na mídia impressa, mais na Internet – outras pessoas também cobraram.
    Por decisão do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcanti, vai ajuizar no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), argüindo a inconstitucionalidade da Resolução nº 212, de 13 de novembro de 2006, do Conselho Nacional de Trânsito. Foi essa Resolução que instituiu o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos (Siniav), baseado em tecnologia de identificação de rádio-frequência.
    Para que o leitor identifique logo do que se trata, a questão é a colocação do que a Resolução 212 do Contran chama de “placas eletrônicas” e que, numa linguagem mais usada nesta nossa Era da Informática, formatada em inglês, deveria chamar de chips.
    A OAB considera a resolução do Contran flagrantemente inconstitucional, uma vez que torna obrigatória a instalação desses chips de identificação e rastreamento em todos os veículos em circulação em todo o país, inclusive os veículos de passeio. Antenas leitoras serão instaladas em semáforos e postes de iluminação e poderão identificar onde estão todos os veículos chipados.
    O pleno do Conselho Federal da OAB entendeu (e qualquer cidadão que preze sua cidadania entenderá da mesma maneira) que o Estado conhecer a exata localização do veículo de um indivíduo fere o direito constitucional à garantia de privacidade, cláusula pétrea (imutável, inderrogável) inscrita no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, que estabelece a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas.
    O Contran apresentou sua Resolução, esse monstrengo, como medida de prevenção do roubo ou furto de veículos e cargas. Mas não é só isso não. Não demora, direi mais.
    Impressionante é que o insulto escancarado – com explicação malandra, tipo meia-verdade (em outra ocasião direi onde está a malandragem, aliás óbvia) – à garantia individual, cláusula pétrea da Constituição, ocorreu em novembro de 2006 e só agora a OAB decidiu ajuizar ação no STF, enquanto, pior, a Procuradoria Geral da República, na sua função de fiscal da lei (e da Constituição, claro), nada fez. Quase quatro anos de omissão inaceitável. E somos nós, os cidadãos lesados em direitos inalienáveis, que sustentamos o Ministério Público, pagando impostos.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano