Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 27 de julho de 2010

Posições sobre aborto fixadas

Terça, 27 de julho de 2010
Por Ivan de Carvalho
    Os três principais candidatos a presidente da República – José Serra, Dilma Rousseff e Marina Silva – têm afinal fixada posição clara sobre o aborto, um dos temas que mais estão sobressaindo no debate desse início de campanha eleitoral e, mais do que isto, um dos temas sobre os quais o governo, o Congresso e a sociedade poderão ter que se posicionar no próximo quatriênio.
    Importa – para que o eleitorado possa considerar esse tema essencial com o necessário conhecimento de causa quando for dar seu voto, em outubro – registrar aqui, bem como em todos os lugares possíveis, as posições de cada um dos três principais candidatos a respeito.
    Começando por Marina Silva, do PV, evangélica sem contestação. Ela declarou que é contrária ao aborto. Sofreu então ataque intenso no sentido de que é conservadora (?!). Não sei se os atacantes queriam acusá-la de conservadora por ser a favor da conservação da vida humana. Mas Marina sentiu o ataque, manteve a posição pessoal, mas acrescentou uma concessão: admite, se o Congresso assim decidir, a realização de um plebiscito, no qual o eleitorado do país decidiria se o aborto deve ser descriminalizado (liberado) ou não.
Nesse plebiscito, evidentemente, ela poderá, querendo, fazer campanha para que os eleitores digam não à liberação do aborto. Se estiver na presidência da República, sua posição terá grande influência. Mas aborto é, na prática, homicídio cruel de ser humano inocente e indefeso. Será que Marina admitiria um plebiscito para o eleitorado decidir se os homicídios em geral serão liberados ou não?
    Dilma Rousseff. Eu a vejo como totalmente favorável à liberação do aborto. Prova: em sabatina no jornal Folha de S. Paulo, em 2007, Dilma defendeu a descriminalização do aborto. “Acho que tem de haver descriminalização do aborto. No Brasil, é um absurdo que não haja, até porque nós sabemos em que condições as mulheres recorrem ao aborto. Não as de classe média, mas as de classe mais pobres deste país”, disse. Mais claro do que isso, só a luz de uma bomba nuclear ou a palavra de Deus – “Não matarás”. E ela agora (antes não) diz que é cristã e católica.
    Mas depois de declarar isso, Dilma Rousseff foi lançada por Lula candidata do PT a presidente da República. O governo Lula tem um ministro da Saúde, José Carlos Temporão, que defende a liberação do aborto, considerando-o uma “questão de saúde pública”, mesma tese do presidente Lula, segundo revelou Dilma. E o programa do PT, por decisão do 3º Congresso do partido, defende a descriminalização do aborto.
    Em 2007, Dilma alinhou sua posição pessoal com a do governo do qual participava e a posição oficial do PT. Depois disso, foi lançada candidata a presidente. Seu programa de governo, registrado no TSE, era claramente favorável à descriminalização do aborto, provocando forte reação da Igreja Católica e de muitos evangélicos. Ela então tratou de esconder o que é ruim, isto é, camuflar o que lhe ameaçava criar problemas eleitorais. Mudou o programa. E disse: “Eu sou a favor da vida em todas as suas dimensões e todos os seus sentidos. Sou a favor da preservação da vida”, declarou na semana passada. Parece claro, mas não é. A vida do ser humano no ventre materno, a vida da mãe, arriscada nos abortos clandestinos? Claro seria se ela dissesse: “Sou contra a descriminalização do aborto”. Mas isto ela não disse.
    A clareza total ficou com o tucano José Serra. No dia 21, eliminou qualquer dúvida. Serra disse que a legalização do aborto prejudicaria programas de prevenção à gravidez indesejada. "Dificultaria o trabalho de prevenção, como no caso da gravidez na adolescência, que é um assunto muito grave. Vai (ter) gravidez para todo o lado porque (a mulher) vai para o SUS e faz o aborto", disse.
O candidato José Serra acrescentou que a liberação do aborto promoveria uma "carnificina" no país. "Considero o aborto uma coisa terrível", afirmou, em sabatina promovida pelo jornal Folha de S. Paulo e pelo portal UOL.
- - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.