Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Do dinheiro nas campanhas

Terça, 17 de agosto de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Começa hoje o inadequadamente chamado horário de propaganda eleitoral gratuita. Ontem, escrevi neste espaço que ele só é gratuito para os candidatos e partidos, mas não para as emissoras, pois recebem créditos fiscais da União numa compensação pelo tempo obrigatoriamente cedido aos partidos e seus candidatos, em conseqüência de lei.
    Se não é gratuito para as emissoras, que recebem pagamento na forma descrita, também não o é para os contribuintes brasileiros, representados pela União. A Receita Federal calcula que a cada minuto de propaganda eleitoral gratuita ela deixa de arrecadar R$ 128 mil. Segundo o blog de José Roberto Toledo, citado por Ricardo Noblat em seu próprio blog, “isso significa que apenas a campanha presidencial, no 1º turno custará R$ 163 milhões aos cofres públicos”.
Acrescentem-se a ela as campanhas de governador no primeiro turno e as de senador e deputados e se terá uma quantia muito mais elevada, muito mais do que dobrando a que corresponde às eleições presidenciais na fase do primeiro turno. E as coisas não param aí, pois em seguida vem o segundo turno, onde ele acontecer. Talvez para presidente e para um número indeterminado de governadores. Bem, numa estimativa superficial, parece-me que o volume total dos créditos fiscais pode facilmente ultrapassar os R$ 400 milhões.
Quanto aos candidatos e os partidos, realmente o legislador – os congressistas, que normalmente são candidatos e assim, em certo sentido, pode-se dizer que legislaram em causa própria, o que ganha um reforço pela esperteza com que dividiram o tempo de propaganda dita gratuita – lhes deu a gratuidade do tempo reservado à propaganda eleitoral no rádio e televisão.
Mas se o tempo é gratuito, não o é a produção dos programas eleitorais e das inserções de propaganda eleitoral na programação geral das emissoras. Tem um custo altíssimo, que leva uma grande parte (mas não diria que a maioria) do que as campanhas arrecadam junto à sociedade. Basta aí lembrar que durante a investigação congressual do grande Escândalo do Mensalão, o publicitário Duda Mendonça, marqueteiro da candidatura de Lula em 2002, admitiu ter recebido US$ 10,5 milhões em conta clandestina no exterior, pois, segundo ele, foi informado de que esta maneira ilegal seria a única forma de receber por seus serviços, já que receberia dinheiro de “caixa 2”.
Fico admirado e até um tanto indignado quando vejo políticos, entre eles até pessoas sérias e com boa intenção, insistindo – em nome da igualdade entre os candidatos e da independência deles ante financiadores privados que supostamente deixariam de existir – no financiamento público das campanhas eleitorais. Assim, nós, os contribuintes, que já pagamos o horário gratuito no rádio e TV e também suprimos de recursos o Fundo Partidário, pagaríamos também os gastos com a produção dos programas e inserções de propaganda eleitoral na TV e rádio, a parafernália da preparação e realização de comícios, com montagem de palanques, aluguel de ônibus para levar o distinto público para as praças, lanchinhos e refrigerantes, panfletos, cartazes, banners, foguetórios.
Pegariam o nosso dinheiro, fariam com ele a contabilidade oficial das campanhas e, por baixo dos panos, fornicariam com o Caixa 2.
- - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.