Terça, 11 de
dezembro de 2012
“Como vota aí de sua cela Vossa Excelência, deputado fulano?”
= = = = = = = = = = = = = = = =
Por Ivan de
Carvalho

Agora está a ponto de ganhar novas
qualificações – as de bisonho e estabanado, desatento e enrolado. É o que se
depreende das discussões e votos da sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal
sobre se as sentenças condenatórias do STF são ou não determinantes para a
perda dos mandatos dos réus condenados que são parlamentares ou se é ao
Congresso (no caso, à Câmara) que cabe dar a palavra final.
O artigo 15 da Constituição
estabelece que uma condenação criminal transitada em julgado leva à cassação
dos direitos políticos e, consequentemente, à perda de mandato. Entenderam que
a perda do mandato é automática, cabendo à Câmara, tão somente, declará-la
formalmente, sem alternativa, os ministros Joaquim Barbosa (presidente do STF e
relator da Ação Penal 470, isto é, do processo do Mensalão) e os ministros Luiz
Fux, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello.
Ocorre que o artigo 55 determina que
um deputado ou senador condenado perderá o mandato, mas determina também que a
decisão cabe à Câmara ou ao Senado, “por voto secreto e maioria absoluta”. Como
é mesmo? Determina que perde, mas determina que isso ocorre “por votação
secreta e maioria absoluta”. Se tem votação, o resultado pode ser a favor ou
contra, ou não faria sentido votar. Então esse artigo, ao contrário do outro,
não determina que o condenado perde o mandato, melhor seria dizer que pode
perder – ou não.
Bem, com o malemolente artigo 55, um
primor de dispositivo constitucional em cima do muro, votaram os ministros
Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli e Carmen Lúcia.
Resultado da sessão de ontem: quatro
votos a quatro, empate. E o presidente Barbosa encerrou a sessão e marcou outra
para quarta-feira – a decisão sobre o destino dos mandatos dos três deputados
condenados. Com o escore em quatro a quatro, o ministro Celso de Mello, que
ainda não votou, é o fiel da balança, a não ser que algum dos ministros que já
votaram mude seu voto. Celso de Mello, decano do STF, em intervenções ao longo
da sessão de ontem, já defendeu que a palavra final é do tribunal, cabendo à
Câmara apenas formalizar a decisão, sem decidir (votar) coisa nenhuma. Caso
Celso de Mello – para quem a perda dos direitos políticos acarreta a perda do
mandato – vote como indicou e nenhum ministro mude o voto, a decisão será por
cinco a quatro pela perda automática do mandato, a ser apenas necessariamente
declarada pela Câmara.
Mas o presidente da Câmara, o
deputado Marco Maia, do PT, fez declarações segundo as quais a Câmara não deve
submeter-se ao Supremo Tribunal Federal e, mesmo que o STF decida pela perda
automática do mandato, a Câmara deve fazer a tal votação secreta para decidir
se declara a extinção dos mandatos dos deputados criminosos. No voto secreto.
Imaginemos que decida pela
persistência do mandato do criminoso condenado. Aí, no uso de suas atribuições,
a Câmara vai votar um projeto de lei, o orçamento da União, uma emenda
constitucional. E o presidente Marco Maia então pergunta pelo telefone
vermelho: “Como vota aí de sua cela Vossa Excelência, deputado fulano?”.
Mas imaginemos ainda que o deputado
fulano seja líder de bancada ou bloco. E o presidente, numa votação simbólica,
pega o telefone vermelho e respeitosamente indaga: “Como votam o nobre líder
Ali Babá e sua nobre quadrilha?”.
Que não desçamos tão baixo.
- - - - - - - - -
- - - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi
publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho
é jornalista baiano.