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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A presidente alarmada

Quarta, 6 de novembro de 2013
Por Ivan de Carvalho
A presidente Dilma Rousseff disse, ontem, que são “alarmantes” os dados que indicam, de 2011 para 2012, um crescimento de 18 por cento nos registros de estupro no país.
         De acordo com o 7º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado esta semana, foram registrados 50,6 mil casos de estupro em 2012, representando 26,1 estupros por grupo de 100 mil habitantes. No ano anterior, foram 22,1 casos registrados de estupro para o mesmo contingente de 100 mil habitantes.
         “Sabemos que estes registros são, infelizmente, subestimados”, disse a presidente no Twitter, revelando o óbvio e garantindo que o governo dela é “defensor intransigente da igualdade de direitos entre mulheres e homens”, não esclarecendo o que, exatamente, isso tem a ver com estupros, mas acrescentando, à guisa de explicação, que “lutamos incansavelmente contra a violência que atinge as mulheres”, o que já tem a ver.
Anunciou, pela terceira vez desde março – quando se comemorou o Dia Internacional da Mulher – a construção de unidades do projeto Casa da Mulher. “Ao longo desta semana” serão publicados editais para a construção de Casas da Mulher em 26 capitais. De providências objetivas, ainda que apenas no papel, só mesmo esses editais.
         A presidente chegou a ser didática: “A violência contra a mulher é uma vergonha que a sociedade brasileira precisa superar. Para isso é necessário: o fim da impunidade dos agressores, o combate implacável ao preconceito sexista, o respeito às diferenças e o apoio e acolhimento às vítimas”.
         Observem-se os itens relacionados por Dilma Rousseff como necessários para superar a violência contra a mulher no Brasil: 1) fim da impunidade dos agressores; 2) combate implacável ao preconceito sexista; 3) respeito às diferenças; 4) apoio e acolhimento às vítimas.
         Note-se que, dos quatro itens relacionados (há outros, muitos, necessários para a sociedade superar o problema da violência contra a mulher, mas não foram arrolados na lista presidencial), somente o “respeito às diferenças” diz respeito, prioritariamente, à sociedade e, secundariamente, ao Estado. Quanto aos outros três itens, são prioritariamente da responsabilidade do Estado. No qual pontifica a presidente da República.
         As más línguas poderão dizer que os editais e eventualmente as Casas da Mulher que deles surgirem em 26 capitais (uma em cada capital?) são mais uma jogada de marketing da campanha eleitoral antecipada.
         Mas eu jamais diria isso. Ao meu ver, a mensagem dela pelo Twitter lembra a história daquele piloto de avião que entra numa turbulência e, alarmado, esgoela-se em gritar para os passageiros: “Pânico, pânico”.
         A presidente, depois de dez anos, dez meses e cinco dias de governo do PT, sai como uma cavaleira andante, de lança em riste, atacando seu próprio governo, talvez confundido com um moinho de vento. Explicando melhor: atacando uma situação de crescimento de índices de estupros registrados que tem raízes profundas na sociedade, mas crescem sob o estímulo do aumento da violência geral, da insegurança e da impunidade que o governo comandado por esse partido não teve vontade ou capacidade (talvez as duas coisas) de conter.
         Pelo menos, por enquanto. Pois ainda dispõe de um ano, um mês e 24 dias.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.