Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Como sobrevive uma sociedade que mata suas crianças?

Segunda, 23 de setembro de 2019
Da
ABJD — Associação Brasileira de Juristas pela Democracia


O Núcleo Rio de Janeiro da ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia) manifesta, em primeiro lugar, sua profunda solidariedade a familiares e amigos de Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, assassinada, pelo Estado, com um tiro nas costas quando voltava para casa com a mãe, no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, na última sexta-feira, 20/9.

Por outro lado, o Núcleo-RJ manifesta também a convicção de que a política de segurança do governo do Estado do Rio de Janeiro caminha para o genocídio.

E mais. Mesmo que não fosse filha de um trabalhador, mesmo que não falasse inglês, não dançasse balé, nem fosse estudiosa, Ágatha não deveria morrer.

Era uma menina linda, bem-cuidada, saudável. Mas se fosse excessivamente magra por conta da fome, feiosa porque ninguém lhe penteava o cabelo, ou analfabeta porque jamais havia pisado numa escola, Ágatha não deveria ser assassinada com um tiro de fuzil.

As crianças não podem ser mortas.

Como sobrevive uma sociedade que mata suas crianças, sejam elas bonitas, estudiosas ou não? Como dizia Marielle Franco, “quantos mais”?

A despeito de todos os seus predicados, Ágatha foi assassinada porque era preta e vivia numa região pobre. Fosse branca e estivesse passeando de patinetes na Zona Sul do Rio de Janeiro, ainda que descabelada e desacompanhada, dificilmente uma bala de fuzil lhe atravessaria as costas.

A violência ilegítima do estado vitimou Ágatha; mas isso só acontece por duas razões: de um lado, pela incapacidade de reação daqueles que podem ser mortos; de outro, porque essa paralisia é o resultado da ação esmagadora de uma elite profunda e historicamente racista, escravocrata e violenta.