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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Acuado por denúncias, presidente do Conselho de Saúde destitui conselheiros com aval da plenária

Sexta, 27 de setembro de 2019
Foram retirados do Conselho justamente os representantes dos usuários que apontavam irregularidades no órgão
A plenária ordinária do Conselho Municipal de Saúde de Santos (CMSS), realizada no último dia 24, foi marcada por uma sequência de irregularidades. A começar pela destituição de conselheiros municipais com mandatos em plena vigência, e eleição de novos para ocupar as respectivas vagas.

A medida ocorreu sem a notificação dos mesmos e desrespeitando os princípios legais do contraditório e do direito à ampla defesa.
Chama a atenção que a medida afete justamente o primeiro secretário do CMSS , Milton Marcelo Hahn, e o conselheiro Carlos José Alberto Solano, representando o segmento dos usuários.
Solano expôs ao Ministério Público, entre outras irregularidades, o vínculo econômico do presidente do CMSS, Luis Antonio da Silva, com a gestão municipal. Silva é alvo de ação civil pública porque um imóvel em seu nome, no Morro José Menino, está alugado para a Secretaria de Saúde. No local funciona uma Unidade de Saúde da Família. O valor do contrato, celebrado mediante dispensa de licitação, é de R$ 5 mil mensais.
Para o MP, Silva não pode figurar como conselheiro, representando o segmento usuário, uma vez que ficou comprovado o vínculo econômico com o Município, além de manobra para a aprovação de mudanças no regimento, suprimindo do texto justamente a menção à Lei Complementar Estadual 791/1995, que frisa a proibição de vínculo econômico (artigo 68) com a administração municipal.
Hahn, o outro conselheiro destituído, foi quem atentou para as irregularidades na mudança do regimento. Ele também fez duras críticas à forma como foi aprovada uma proposta de minuta de nova lei municipal que disciplina o CMSS. Entre as mudanças, está o aumento do mandato da Diretoria Executiva de dois para quatro anos e, portanto, aumento do prazo para realização de conferências.
Sem defesa
Sem garantir o direito à ampla defesa e sem mostrar o fundamento jurídico utilizado para respaldar ambas as destituições, a Diretoria Executiva encaminhou no próprio dia 24 a eleição de novos membros para os cargos declarados vagos.
Apesar dos protestos dos destituídos, tudo foi feito com aval da plenária, que tem aprovado de forma automática as contas da Gestão e os convênios com entidades assistenciais. Em 2013, a mesma plenária se omitiu no processo de terceirização dos serviços, via contratos com organizações sociais (OSs). Hoje o modelo de gestão é duramente criticado pela má qualidade dos serviços.
Como argumento para a destituição do primeiro secretário, foi dito que ele havia sido eleito como membro da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e que depois deixou de ter essa representatividade após a nova configuração do órgão de classe. Hans então passou a figurar como representante da ONG Todos Temos Direitos, que no caso é uma entidade suplente no Conselho. E, por ser entidade suplente não poderia ter assento na Executiva.
O problema é que nem o presidente e nem os demais conselheiros de seu grupo de apoio conseguiram apontar qual é a legislação concernente aos conselhos em que esta situação é vedada.
Além de Solano e de Hahn, discordou da condução da mesa a presidente da ONG Todos Temos Direitos, Rosilma Roldan. Em sua fala ela deixou claro que a depender das circunstâncias, a Executiva adota pesos e medidas diferentes para operar as questões.
“Quando o vice-presidente Roberto Moura faleceu, foi colocado em plenária que em respeito a ele o cargo ficaria vago. Ou seja, o cargo é da pessoa e não da entidade. Tanto é que a entidade representada por ele jamais veio reivindicar esse cargo. Então por que, casuisticamente isso agora? Essa diretoria está em pleno mandato vigente. Isso é lei. Tenho assistido aqui votações conduzidas”.
Rosilma prosseguiu, a despeito das tentativas de silenciá-la: “Esse cargo é equivalente a funcionário público. Ninguém perde o cargo pela vontade de alguém. Tem que ter plena defesa, a pessoa precisa ser intimada. Tem contraditório. Por que vamos tomar aqui uma atitude ilegal e amanhã vem um mandado de segurança e derruba por desrespeito o devido processo legal?”.
A plenária ainda aprovou uma moção de apoio ao presidente Luis Antonio sda Silva e de repúdio contra reportagem do Jornal Diário do Litoral, que noticiou o fato do CMSS estar na mira do MP e da Justiça. Sobrou até para o promotor Carmello, duramente criticado pelo conselheiro Silas da Silva, representante do segmento usuário. Silas sugere que Carmello deu entrevista ao jornal Diário do Litoral para fazer politicagem.
Milton Hahn chegou a entrar com um mandado de segurança na Justiça para que fosse retirado o item da pauta que previa eleição para o seu cargo, mas a decisão não saiu a tempo.
Ele também enviou um comunicado a todos os conselheiros, ressaltando 14 pontos que caracterizam a arbitrariedade da situação.
“É de conhecimento público que o Presidente atual, no cargo há 12 anos, Luiz Antonio da Silva, está com o cargo sub-judice, pois está sofrendo um processo, promovido pelo Ministério Público, em 21.08.2019, Ação Civil Pública n.º 1018441-14.2019.8.26.0562, já em mãos do Poder Judiciário, na pessoa do Juiz Márcio Kramer de Lima, com pedido de liminar, por conta de ter alugado, há anos, um imóvel de sua propriedade para a Prefeitura de Santos, o que configura, no mínimo, conflito de interesses. Como pode uma pessoa ser Presidente de um Conselho, que fiscaliza as entidades que prestam serviço para o Poder Público, se ele tem negócios particulares e interesses pessoais com esse Poder?”, pergunta no documento.
E prossegue dizendo: “parece que essa decisão intempestiva pode ter sido precipitada pelo fato de o Presidente em questão estar na iminência de perder o cargo e de sua inviabilização como candidato à reeleição à Presidência do CMSS, na eleição em outubro próximo!”.

Ação pede o afastamento imediato do presidente
Para o promotor que atua no caso, Carlos Alberto Carmello Júnior, da 12ª Promotoria de Justiça de Santos, Silva atua em causa própria.
“Em 30 de abril, aprovou novo regimento interno para que deixasse de ser ilegal a permanência de conselheiro que mantivesse vínculo ou comunhão de interesses com quaisquer dos representantes dos demais segmentos integrantes do Conselho”, fundamenta o promotor na ação.
Carmello informa à Justiça que ainda houve, por parte do presidente, tentativa de colocar obstáculo aos trabalhos da Comissão de Ética do Conselho que teria pedido o afastamento do presidente
“Ele (Silva) deu mostras que não pretende deixar o cargo, que tentou afastar a exigência de desvinculação atuando em causa própria, que colocou interesse pessoal acima dos do órgão, que adotou expediente ilegal, que desconsiderou norma municipal sobre prazo de mandato e ainda que postergou nova eleição do Conselho. Todas as condutas estão corroboradas por provas documentais”, finaliza o promotor.
A ação civil pública tem como alvo também a Prefeitura de Santos. Além do afastamento do presidente, o MP quer a anulação dos recentes procedimentos que o reconduziram à função.