Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 28 de novembro de 2009

Observadores de nuvens

Sábado, 28 de novembro de 2009
Por Ivan de Carvalho
Quem estiver, neste momento, interessado em meteorologia ir buscar em outras fontes, não neste artigo. O título é uma referência aos políticos mineiros. Ponho políticos assim, no plural, pois a história já foi tantas vezes repetida que poucos sabem ainda se a observação se deve a Benedito Valadares, Gustavo Capanema, Magalhães Pinto ou até mesmo Tancredo Neves. Quem cita atribui a quem quer e ninguém contesta, donde dá para imaginar que seja uma construção de várias línguas, que não se confundiram como em Babel.

“Política é como nuvem. Você olha, ela tem uma forma. Você olha outra vez, a forma é outra”. Esta máxima dos observadores de nuvens de Minas Gerais, exportada para todo o país, adapta-se como uma luva à fase recente e à fase atual da política baiana. Não passou ainda muito tempo em que só havia amor entre o governador Jaques Wagner e o ministro Geddel Vieira Lima. O primeiro recebeu o valioso apoio do segundo (junto com o PMDB, vital para a vitória) para sua eleição ao governo da Bahia e apoiou junto ao amigo Lula a indicação de Geddel, feita pelo “PMDB da Câmara”, para ministro da Integração Nacional.

Era só amor. Geddel chegou a dizer a Wagner, numa sugestão que se tornou pública: “Quando tiver pepino, deixa comigo”, sugestão que equivalia a aconselhar o governador a navegar apenas em águas tranqüilas, onde não houvesse marolas, deixando ao ministro as brigas e a resolução das dificuldades.
    Mas Geddel e seu PMDB cresceram rapidamente no cenário político e logo o ministro passou a ser visto pelo PT e mesmo pelo governador como o próprio pepino a ser descascado. O problema era e é que a casca é grossa. Essa constatação e as preocupações, talvez excessivas, talvez exclusivistas, do partido do governador acabaram impedindo o prefeio João Henrique de disputar a reeleição em Salvador pelo PT e o colocaram no PMDB. A inconformidade do PT com mais esta expansão do PMDB e de Geddel levou os petistas a partirem, com prazo vencido, para a candidatura de Walter Pinheiro, com consequências desastrosas para o relacionamento PT-PMDB. “Traíra”, gritou o PMDB e lá em cima a nuvem passou por uma completa mutação.
    Planos e ventos mudaram e um redemoinho permanente se instalou. Ainda havia chance de restaurar a formatação, mas dependia de uma conversa profunda que gerasse compromissos, até insinuada pelo PMDB, mas não promovida (por falta de interesse ou de percepção de sinais) pelo governador. E então a nuvem inicialmente branca e que vinha sendo gradualmente carregada transformou-se em cumulus nimbus. A Operação Expresso desencadeou a tormenta tropical. Sujeita a evoluir, a seu tempo, para tornado, ciclone, furacão.

O presidente do PT, Jonas Paulo, afirmou há algum tempo que o PMDB poderia voltar à base do governo, mas só se pedir “desculpas públicas”. Esta semana, não sei se ironicamente ou para valer, o governador atenuou: o PMDB saiu porque quis, se quiser voltar precisa pedir, tomar a iniciativa.

Consultem os observadores de nuvens. Eles olharão para cima e dirão: “Que nuvens? Só vemos a tempestade”.


Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano
Nota do Gama Livre: A Operação Expresso foi deflagrada pela Polícia Civil da Bahia e prendeu dentre outras pessoas o ex-diretor executivo da Agerba (Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia),  Antônio Lomanto Netto, sob a acusação de irregularidades na concessão de linhas à empresas de transporte intermunicipal. O PMDB baiano viu a operação como retaliação do PT.