Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Todo mundo erra

Quinta, 12 de novembro de 2009
Por Ivan de Carvalho
Todo mundo comete erros. Só retiro dessa constatação Jesus Cristo. Além do Pai, de quem Ele disse que é maior do que Ele (não é maior o Enviado do que Aquele que o enviou) e do Espírito Santo, ente para mim absolutamente misterioso da Santíssima Trindade, segundo a teologia católica gerado desde sempre pelo amor do Pai pelo Filho e do Filho pelo Pai.
Dizem que só adquire uma noção (não se trata de compreensão, mas apenas de uma noção) do Espírito Santo, O Consolador, aquele ser humano que por ele é tocado no coração. Desconfio que, infelizmente, ainda não chegou a minha vez e o que posso fazer é consolar-me com a confiança em que ela em algum momento chegará.
    Mas, porque estou eu falando de erros e afirmando que deles ninguém escapa? Bem, ontem, nas minhas funções de jornalista, deparei-me com uma reportagem que atraiu meus olhos a uma frase que continha a expressão “diante mão”.
    Nas humildes linhas que escrevo, já cometi milhares de erros de linguagem na minha já longa atividade de jornalista. E já vi também muitos erros cometidos por colegas. A uns e outros considero normais, ante a imensa ignorância humana. Até o sábio,dizem, é aquele que sabe que não sabe. Tenho mesmo uma leve suspeita de que esta seria talvez a principal ou única razão que levava o grande Sócrates a não dar respostas, mas somente a fazer perguntas.
Isso seria bem cômodo: não respondendo, ele punha-se praticamente a salvo de erros, enquanto os deixava para serem cometidos por seus discípulos, forçados a responder. Até Platão deve ter passado por essa desagradável experiência, o que não o impediu de constituir a luminosa mente que o servia e tanto serviu depois à humanidade. E ainda serve aos que dele têm o prazer ou a esperteza de servir-se.
Mas a troca da expressão “de antemão” por “diante mão”, confesso que me deixou um tanto atônito, a ponto de só numa segunda ou terceira leitura da frase perceber que ela começava pela palavra “agente”. Mas não se tratava de algum agente da CIA, ou de agente fiscal, enfim, de qualquer agente. Pretendia dizer “a gente”. Mas como poderia eu perceber isso de antemão se estava siderado por “diante mão”?
Talvez continue o leitor, depois de ler o que já leu deste artigo, no escuro. Mas isso parecerá normal, se considerado que na noite e madrugada de terça-feira grande parte do país também ficou no escuro, sabe Deus a razão e tenta o ministro Lobão nos convencer de que foi por causa dos raios que o partam, sempre os raios. De nada valeram, nessa questão, os quase sete anos de governo Lula para tornar o sistema elétrico seguro. Se Lobão pretende explicar tudo com os raios, o presidente Lula, chamado de analfabeto “sem intenção ofensiva” por Caetano Veloso, resolveu ser cauteloso e veraz. Disse que duas coisas sabia: não houve interrupção de geração de energia em Itaipu nem problemas de interligação do sistema. No mais, “não vou chutar, porque eu não chuto nesse assunto”.
Só nos outros, parece. Está vendo? Todo mundo erra.

Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta-feira.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano