Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Estado falido


Terça, 28 de setembro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Não, não sejam precipitados em suas conclusões os meus raros leitores. Estariam abandonando a qualidade que mais prezo neles – a paciência. Sem esta, eu perderia todas as esperanças de conseguir mantê-los como meus leitores. E assim perderia a razão de escrever. Ao escolher o título de “Estado falido” não estava pensando na Bahia, mas pensava no Brasil de uma maneira que nunca antes pensei neste país.
    Há duas razões primárias para, ainda que sem certezas definitivas, dizer que o Brasil é um Estado falido.
    Há também, reconheço, uma razão secundária para essa afirmação. A esperança de que, fazendo a previsão, possa eu contribuir por um mínimo que seja para acordar a sociedade de seu pesado e longo sono e levá-la a mover-se na busca de uma saída para a falência prevista. Em verdade, é duvidoso que esse despertar aconteça – Cassandra fez o que pode para alertar as pessoas em Pompéia, para que fossem embora da cidade, mas elas não lhe deram ouvidos. Ouviram apenas, de repente, o ronco do Vesúvio enquanto as lavas do vulcão soterravam a cidade com tudo que havia nelas.
    Escolhi o título “Estado falido”, além deste objetivo de alerta, pelas duas razões primárias:
1. No blog gamalivre.com.br, encontram-se informações estonteantes para qualquer espírito desprevenido. Conta o blog que a entidade Auditoria Cidadã da Dívida declara equivocada a informação do governo de que a dívida pública federal (interna e externa) atingiu R$ 1,6 trilhão em agosto. Valor obtido na Tabela do Tesouro Nacional  (Anexo 2.1), que “indica uma dívida externa pública federal de R$ 93 bilhões e uma dívida interna de R$ 1,524 trilhão, chegando-se ao total de R$ 1,618 trilhão”. Mas, “conforme tabela divulgada pelo Banco Central (Tabela 11), devem ser adicionadas a estes R$ 1,524 trilhão da dívida interna as chamadas “Operações de Mercado Aberto”, que também representam dívida, e somaram R$ 362 bilhões. Portanto a dívida interna é de R$ 1,9 trilhão, e não R$ 1,5 trilhão conforme divulgado”. Suficiente? Não. A análise da Auditoria Cidadão da Dívida prossegue: “Se considerarmos também os títulos do Tesouro em poder do Banco Central (conforme consta da Tabela do BC, quadro 35), veremos que em julho a dívida interna total já tinha chegado a R$ 2,186 trilhões”.
    Suficiente? Sim, creio que agora sim, R$ 2,186 trilhões. Nove entre dez especialistas acreditam que o Brasil enfrentará em 2011 ou 2012 uma grave crise fiscal e cambial. Fiscal, devido a uma notória “gastança” do governo Lula nos dois últimos anos. Cambial, principalmente pela forte tendência de déficit na balança comercial. E quanto à crise cambial, um dado importante: “O governo também divulgou que a participação de estrangeiros na dívida interna atingiu novo recorde, de R$ 150,6 bilhões”. Sem contar as operações de mercado aberto, que nunca aparecem nas contas.
    2. O outro fator da falência à vista é a bisbilhotice nacional. A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o governo brasileiro a indenizar cinco pessoas ligadas a organizações de trabalhadores rurais do Paraná que foram vítimas de grampo telefônico considerado ilegal. A sentença, publicada na edição desta segunda-feira do “Diário Oficial da União”, determina que o Estado pague US$ 20 mil (cerca de R$ 34 mil) a cada um dos agricultores.
    Agora imaginem se todas as vítimas, no Brasil, de escuta telefônica ilegal, quebra de sigilo fiscal ilegal, violação de correspondência (convencional e eletrônica), quebra ilegal de sigilo bancário (pelo menos em bancos controlados pelo governo, mas talvez em todos) recorrerem à Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado brasileiro. Falência inapelável.
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Este artigo foi publicado na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista político baiano.