Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Sobrou para o Mordomo

Quinta, 29 de outubro de 2015
siro (1) 
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação Juízes para a Democracia.
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A noticia é tão desumana quanto inacreditável. Uma mulher grávida, portadora de esquizofrenia, sem condenação é mantida presa numa solitária onde nasce seu bebê, sem qualquer auxílio, após gritar desesperadamente por socorro.

A menor S.M.M., 16, grávida de 6 meses, que está presa na Febem da Moóca por roubo e tráfico. O número de garotas cumprindo medidas socioeducativas _internação provisória, internação e semiliberdade_ dobrou desde 2001, na Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) . (São Paulo, SP, 16.03.2004. Foto: Lalo de Almeida/Folhapress)
Nessa mesma prisão são mantidas outras 30 mulheres grávidas, 27 delas ainda sem condenação prévia. A única consequência foi o afastamento da diretora e da subdiretora da Unidade. Tudo resolvido trocou-se a carcereira. E os juízes que mandaram 27 grávidas para a prisão sem julgamento prévio continuarão a fazê-lo autoritariamente embora sejam portadoras de nascituros inocentes que já nascerão privados da liberdade ilegalmente.
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A Constituição Federal coloca a individualização da pena como uma garantia fundamental do Estado Democrático de Direito, de modo que não pode o nascituro ao qual a lei garante “direito à proteção, à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”, ser colocado nas condições precárias e desumanas do cárcere. De modo a “pagar” criminalmente pelos supostos atos, ainda em apuração, praticados por sua genitora. Essa responsabilidade prévia é do juiz encarcerador e não da diretora do presidio.
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Ainda que venha a ser comprovada a responsabilidade pelo ato reprovável, a medida a ser aplicada deve se adequar às condições pessoais da acusada e do próprio nascituro, a quem não se podem estender os efeitos de eventual e futura pena. O Brasil como Estado Membro da ONU é obrigado a “desenvolver opções de medidas alternativas à prisão preventiva e à pena especificamente voltada às mulheres infratoras, dentro do sistema jurídico do Estado-membro, considerando o histórico de vitimização de diversas mulheres e suas responsabilidades maternas”.                     1 

Ademais, no caso, trata-se de portadora de esquizofrenia, que rigorosamente não podia estar recolhida em uma penitenciária por ser inimputável, e sim em hospital penitenciário adequado para sua enfermidade, com a aplicação de medida de segurança. Acresce ainda a responsabilidade dos responsáveis por formular políticas públicas, os legisladores, o ministério público, o judiciários, esses últimos órgãos responsáveis pela fiscalização do sistema penitenciário e pela boa aplicação das leis que permitem que tais abusos sejam praticados quando não são eles próprios os responsáveis pelo encarceramento demasiado e desnecessário.