Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)
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terça-feira, 15 de outubro de 2024

Lucro acima de tudo, qualidade abaixo de zero

Terça, 15 de outubro de 2024


            Da

É inaceitável que, diante das catástrofes cuja origem remonta a entrega do Estado para empresas privadas, as privatizações continuem sendo vistas como solução. A realidade nos prova o contrário: privatizar serviços essenciais resulta em piora no atendimento e aumento de tarifas, como no caso da Enel em São Paulo. Após a chuva de sexta-feira, milhares de famílias permanecem sem luz, com a empresa incapaz de resolver a situação, além de tentar responsabilizar o Governo Federal.
Em novembro de 2023, outro ciclone extratropical já havia escancarado como a privatização da energia elétrica deteriorou a qualidade do serviço e aumentou os preços, e neste ano não está sendo diferente, aliás, há uma continuidade das privatizações, como vimos com a Sabesp em julho.

A privatização coloca o lucro acima do bem-estar da população, enquanto a qualidade dos serviços cai e o Estado se exime de responsabilidades.

Lutar contra a privatização de serviços essenciais é urgente! Chega de desigualdade, oferta de serviços precária e desamparo em momentos como este, em São Paulo. A solução não está em vender o patrimônio estatal, mas em fortalecer o papel do Estado na garantia de direitos fundamentais!

Tudo vira motivo para juro alto – O Banco Central (BC), por sua vez, eleva os juros como resposta à inflação, o que só agrava a situação da população brasileira que já sofre com o aumento nas contas de luz e nos preços nas alturas, sobretudo dos alimentos. É o que publica o Jornal Correio Braziliense (confira). Essa política de juros altos, somadas ao desmonte dos serviços públicos, penaliza a maioria enquanto beneficiam poucos.

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

MEGAFUNDOS FINANCEIROS: O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS

Sexta, 10 de novembro de 2023


Aldemario Araujo Castro
Advogado
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Brasília, 10 de novembro de 2023

“O essencial é invisível aos olhos”. Essa é uma das frases mais marcantes presente no famoso livro “O Pequeno Príncipe”, escrito pelo francês Antoine de Saint-Exupéry. A afirmação, para além das vertentes poética, psicológica e filosófica, é uma das chaves mais importantes para compreender os vários níveis da realidade, inclusive a organização socioeconômica do convívio humano.

O mundo quântico do muito pequeno, a matéria escura, a energia escura, o subconsciente, o fundo dos oceanos, o mundo espiritual, a deep e dark web, entre tantos outros fenômenos ou níveis da realidade, são “misteriosos” e distantes dos olhares humanos mais comuns ou ordinários.

Tudo indica que nos âmbitos microscópicos, cósmicos, da consciência e da interação humana em sociedade, aquilo que “os olhos conseguem enxergar” (ou a primeira e mais imediata percepção, em condições regulares), representa uma parte significativamente minoritária da realidade. Os fenômenos mais relevantes e estruturadores da vida e do mundo escapam à observação mais superficial. 

Com efeito, os instrumentos e mecanismos mais relevantes existentes numa sociedade como a brasileira, viabilizadores do trânsito de bilhões e trilhões de reais (trilhões, mesmo) da imensa maioria da população para uma minoria de privilegiados, são praticamente desconhecidos de 99,99% das pessoas.

Tomando a realidade brasileira como referência, você muito provavelmente não ouviu falar, não leu sobre ou não tem a menor ideia da dimensão econômico-financeira: a) das operações compromissadas; b) dos depósitos voluntários; c) das operações de swap cambial; d) da formação de reservas monetárias (e sua enorme influência no estoque da dívida pública interna); e) das variadas formas de planejamento tributário; f) do fluxo de recursos para paraísos fiscais; g) dos subsídios; h) dos inúmeros benefícios fiscais; i) da sonegação tributária e j) da montanha de juros pagos pelo Poder Público, empresas e famílias aos bancos. E inúmeros outros itens podem ser acrescentados.

Ainda nessa linha, mas em escala global, você já ouviu falar em BlackRock? Se fizer uma simples pesquisa na internet encontrará afirmações como estas: a) “a empresa que controla os governos do mundo”; b) “a empresa que controla tudo que você conhece”; c) “essa empresa controla o seu futuro” e d) “a empresa que controla o mundo”.

Afinal, o que é essa toda-poderosa BlackRock? Em uma resposta curta, direta e “neutra”, trata-se do maior fundo financeiro (ou administradora de ativos) do mundo. Dito dessa forma, parece algo completamente inofensivo. Só parece … Não esqueça: o essencial é invisível aos olhos.

As empresas conhecidas como “administradoras de ativos” supervisionam dezenas de trilhões de dólares em investimentos em escala global. As mais famosas são as “Três Grandes”: a) BlackRock;  b) Vanguard e c) State Street Global Advisors. O modelo de negócios operado baseia-se principalmente nos chamados fundos de índice “passivos”. Esses investimentos em ações transformam as administradoras de ativos nos principais acionistas de milhares (sem exagero) de corporações ao redor do mundo.

As administradoras de ativos não operam apenas com instrumentos financeiros na forma de ações e títulos da dívida de empresas e Estados. Existe um movimento crescente dessas gigantes do mundo financeiro no sentido da aquisição de ativos “reais”, representados, entre outros, por casas, prédios, hospitais, redes de ensino, distribuidoras de água e energia elétrica e parques eólicos. Esse fenômeno revela uma das facetas mais perversas (e ocultas) dos processos de privatização, invariavelmente “vendidos” como os caminhos para a eficiência exigida pelo usuário.

Essas megaempresas estão, em um processo lento e vigoroso, dominando as estruturas básicas relacionadas aos principais bens e serviços utilizados nas sociedades modernas para o convívio minimamente civilizado. Esse importantíssimo movimento socioeconômico, em escala global, persegue um objetivo muito bem definido. Pretende-se extrair os maiores lucros possíveis e da forma mais rápida possível. Essa é a perversa lógica do capitalismo contemporâneo, selvagem ou não. Praticamente tudo se transforma em mercadoria, comprada e vendida para gerar uma monumental acumulação de riquezas. As normas jurídicas, as questões éticas, a dignidade da pessoa humana e outras limitações civilizatórias são inconvenientes obstáculos a serem competentemente contornados ou afastados. 

O universo das administradoras de ativos foi dissecado no livro “Our Lives in Their Portfolios: Why Asset Managers Own the World”, de Brett Christophers. Publicado pela Verso Press, o trabalho faz uma detalhada radiografia de um dos setores econômicos mais obscuros na atualidade. Christophers é professor do departamento de Geografia Social e Econômica da Universidade de Uppsala, na Suécia.

O professor Christophers mostra que as gestoras de ativos quase não tinham importância econômica há algumas décadas. Na década de 1970, administravam menos de um trilhão de dólares em escala global. Atualmente, estima-se em 100 trilhões de dólares os ativos geridos por essas empresas. Esse número, para se entender a magnitude da relevância econômica dos megafundos, supera o PIB de todo o planeta. Brett vai além dos números indicativos do tamanho econômico das administradoras de ativos. Ele destaca a propriedade das infraestruturas e serviços essenciais para a vida das pessoas. Ao determinar os preços de utilização desses itens, de olho na maximização dos lucros, os megafundos determinam as condições em que esses bens e serviços funcionam, com enorme impacto no cotidiano de centenas de milhões de indivíduos. 

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

BANCO CENTRAL DE PINDORAMA: INDEPENDENTE DO POVO E DEPENDENTE DO MERCADO FINANCEIRO

Sexta, 27 de outubro de 2023


BANCO CENTRAL DE PINDORAMA: INDEPENDENTE DO POVO E DEPENDENTE DO MERCADO FINANCEIRO

Aldemario Araujo Castro
Advogado
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Brasília, 27 de outubro de 2023

Pindorama é um dos maiores países do mundo em extensão geográfica e conta com uma população de cerca de 200 milhões de pessoas. Está localizado tropicalmente no hemisfério sul. Pindorama convive com um festival de paradoxos institucionais e socioeconômicos. Trataremos de seu poderoso Banco Central. Ao BCPin, como é conhecido, compete: a) a emissão da moeda oficial (a pataca); b) a regulação e fiscalização das instituições financeiras; c) a execução da política monetária e cambial; d) o controle do fluxo de capitais estrangeiros e e) a definição da taxa básica de juros.

Em 2005, o Parlamento de Pindorama, exercendo o papel de Poder Constituinte Derivado, aprovou a Emenda Constitucional nº 666. Esse diploma legal: a) revogou a limitação da cobrança de juros reais em Pindorama, então estabelecida em 12% ao ano e b) definiu a independência do Banco Central, ao estabelecer mandatos para os dirigentes da instituição e a completa autonomia em relação ao Poder Executivo.

Um importante levantamento jornalístico, divulgado no respeitado portal Foco no Congresso, buscou identificar a atuação profissional dos dez últimos presidentes do BCPin. Todos, sem uma mísera exceção sequer, saíram diretamente da cadeira presidencial para postos de direção em grandes bancos ou vistosas consultorias voltadas para o mercado financeiro. Essa constatação reforçou a indagação acerca da tal independência do Banco Central de Pindorama. Não foram poucas as vozes que questionaram a independência do BCPin, unanimemente festejada pela grande imprensa do país.

Essas ponderações não estão lastreadas somente nas “estranhas” relações entre os dirigentes do BCPin e o mercado financeiro. São mencionadas, ainda, práticas “suspeitas” nas seguintes áreas: a) taxa de juros; b) formação de reservas internacionais; c) remuneração da sobra de caixa dos bancos e d) swap cambial.

O BCPin define periodicamente a taxa básica de juros. A de Pindorama é a segunda mais elevada do mundo nas últimas décadas. Só perde para uma tal SELIC do obscuro Brasil. Ninguém consegue oferecer uma explicação razoável para o elevado patamar da taxa de juros em Pindorama. Tentar combater uma inflação que não decorre do aumento do consumo de bens e serviços não convence nem mesmo os detentores de somente um neurônio. Ademais, a magnitude da taxa de juros definida pelo Banco Central de Pindorama implica no pagamento de uma montanha de recursos para remunerar os detentores de títulos públicos. Em 2022, o Tesouro de Pindorama pagou cerca de 100 bilhões de dólares americanos na forma de juros da dívida pública. 

Em Pindorama, apesar da existência (e vigência) de uma série de normas constitucionais e legais definidoras da ampla publicidade dos atos e negócios públicos, ninguém consegue obter uma lista das pessoas físicas e jurídicas credoras do Poder Público.

A formação das reservas monetárias de Pindorama, operada pelo seu Banco Central, é um emblemático exemplo de como se coloca o conjunto da sociedade de um país a serviço dos interesses econômicos de uma minoria privilegiada. E tudo isso quase que completamente desconhecido pela imensa maioria dos cidadãos. São dois os problemas principais nesse campo: a) o patamar claramente excessivo (cerca de 400 bilhões de dólares americanos) e b) a enorme repercussão no trilionário estoque da dívida pública interna.

O BCPin remunera diariamente a chamada “sobra de caixa” dos bancos de Pindorama, utilizando a taxa de juros por ele mesmo fixada em patamares altíssimos. Devido a esse mecanismo, fica completamente comprometida a clássica e salutar função do sistema bancário de financiar de forma civilizada a atividade produtiva envolvendo a produção e comercialização de bens e serviços. 

Sintomaticamente, o parlamento de Pindorama, dominado por forças conservadoras, reacionárias, clientelistas e fisiológicas, aprovou inúmeras limitações para despesas com o funcionalismo público, previdência social e gastos sociais de uma forma geral. Toda e qualquer tentativa de limitar a farra com os instrumentos de política monetária e cambial, e até da administração da trilionária dívida pública, sequer conseguem tramitar regularmente.

Nos contratos de swap cambial, o BCPin estabelece um compromisso de pagar ao detentor do papel a variação do dólar, acrescida de uma taxa de juros, e a receber a variação da taxa de juros interna acumulada no mesmo período. Esse instrumento, operado pelo Banco Central de Pindorama, garante a mudança de posição do dólar para investidores que não são conhecidos (a lista dos beneficiários, invariavelmente grandes agentes econômicos, é considerada sigilosa).

Por essas (e outras) razões, o economista Dowdislau Labor, único ganhador de um Nobel em Pindorama, foi categórico ao afirmar, em um importante artigo científico, que o BCPin é independente do povo e completamente dependente do mercado financeiro.

A incisiva economista Mariana Tavares da Conceição, em entrevista para a imprensa, chegou a afirmar: “O BCPin faz o que dá na telha”. Além de criticar a independência do Banco Central, a combativa economista e professora universitária destacou o baixíssimo conhecimento e a ausência de debate social em torno dos mais importantes mecanismos integrantes das políticas monetária e cambial operados pelo Banco Central.

Pindorama segue dominada por elites econômicas conhecidas pela profunda insensibilidade social. Pindorama segue pautada por uma grande imprensa completamente comprometida com os mais perversos interesses econômicos. Pindorama segue marcada por uma profunda falta de consciência, organização e mobilização dos setores populares explorados. Pindorama segue como um dos países mais desiguais e injustos do mundo. 

É recorrente a tentativa de comparar Pindorama com um curioso país chamado de Brasil. Mas aí é outra história ...

segunda-feira, 6 de março de 2023

É hoje (6/3) às 19h a LIVE: O “estouro” do Banco Central. São quase 300 bilhões de prejuízo, tendo recebido R$ 212 bilhões do Tesouro. ASSISTA!!!!

SEGUNDA, 6 DE MARÇO DE 2023

Da Auditoria Cidadã da Dívida (ACD)

É muito fácil se dizer ‘independente’ quando se recebe títulos públicos de graça do Tesouro Nacional e, ainda por cima, juros sobre esses títulos. E mais, se apurar prejuízo, ele pode ser totalmente transferido para o Tesouro. Essa é a realidade: o Tesouro doa mais de R$ 2,1 trilhões de títulos públicos ao Banco Central (BC), e, somente no ano de 2022, pagou a bolada de R$ 212 bilhões de juros sobre esses títulos doados. Apesar dessa benesse impressionante, o BC ainda apurou um prejuízo de quase R$ 300 bilhões no ano. Como isso é possível? O que o Banco Central faz com os títulos que recebe? Como os bancos acabam beneficiados com o dinheiro da sociedade? E o que isso tudo tem a ver com os juros altos praticados no Brasil?

Essas e outras perguntas que a grande mídia não faz serão respondidas na live da Auditoria Cidadã da Dívida da próxima segunda-feira (6), às 19h, pela coordenadora nacional Maria Lucia Fattorelli. Participe e saiba porque a atuação do Banco Central sobre a nossa economia tem sido desastrosa para a população! É ao vivo no Facebook e no canal da ACD no Youtube.

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Adote um banqueirinho!

  Setembro

15

Adote um banqueirinho!

No ano de 2008, a Bolsa de Nova York foi a pique.
Dias histéricos, dias históricos: os banqueiros, que são os mais perigosos  assaltantes de bancos, haviam despojado suas empresas, embora jamais tenham sido filmados pelas câmaras de vigilância e nenhum alarme tenha disparado.  E não houve maneira de evitar a derrocada geral. O mundo inteiro desmoronou, e até a Lua teve medo de perder o emprego e se ver forçada a procurar outro céu.

Os magos de Wall Street, especialistas em vender castelos no ar, roubaram milhões de casas e de empregos, mas um único banqueiro foi preso. E quando imploraram aos berros uma ajudinha pelo amor de Deus, receberam, pelo mérito de seu labor, a maior recompensa jamais concedida na história humana.

    Essa dinheirama teria bastado para alimentar todos os famintos do mundo, com sobremesa e tudo, daqui até a eternidade. Ninguém pensou nisso

Eduardo Galeano, no livro Os filhos dos dias (Um calendário histórico sobre a humanidade), 2ª Edição, L&PM Editores, 2012, página 295)

quinta-feira, 15 de abril de 2021

APAVORANTE MUNDO NOVO: FIM DO VALOR DO TRABALHO

Quinta, 15 de abril de 2021



do


Pedro Augusto Pinho*

“O desemprego, que se agrava nas crises, hoje mais frequentes, não é cíclico”, assim começa o consultor Luiz Affonso Romano seu artigo, “Expirou o seu prazo de validade corporativo?”, no Monitor Mercantil (08/04/2021, página 2 Opinião). Neste mesmo jornal e data, Marcos de Oliveira, na coluna Fatos & Comentários, sob o título Paridade, nos informa que “o especialista Marcelo Gauto computou a média mensal gasta por grandes petroleiras com cada empregado em 2020: Equinor, US$ 10.061; BP, US$ 9.300; Shell, US$ 8.837; Total, US$ 7.032; Petrobrás, US$ 5.148 por trabalhador”. E ironiza ao final: paridade de preços só vale para os combustíveis.

Não é o covid-19, vírus que espalha universal pandemia, o culpado do desemprego nem das desigualdades salariais; e ambos só tendem a aumentar.

É uma nova ideologia, que tomou o poder na maioria das nações do mundo e se espalha como doença na mente das pessoas: o neoliberalismo.

Para o neoliberal só existe a moeda, o ganho financeiro. Tudo e todos agem para o maior lucro possível do capital financeiro. E este capital vem, desde os anos 1980, controlando as empresas, os países, as riquezas naturais e, obviamente, as pessoas. Logo o valor do trabalho, aquele que sob a égide da industrialização dignificava a pessoa, perdeu lugar para o valor da moeda.

Tal situação não se faz impune, sem outras consequências. Neste mesmo Monitor Mercantil, na primeira página, está a notícia que as “vendas no varejo paulistano caem 38,1%”, em março em relação a fevereiro de 2021. Nada surpreendente, não só pelas precauções da pandemia, como pelo crescente desemprego e reduções das rendas familiares.

Este é o mundo que se desenha no cenário neoliberal brasileiro e do mundo ocidental. Greves, manifestações de rua, agressões, tumultos, violências domésticas e das forças repressoras são e serão cada vez mais frequentes. Não há também entendimento do que está ocorrendo, e a comunicação de massa, já dominada pelos capitais financeiros há décadas, ajuda nesta incompreensão das causas do aumento da miséria e da fome, onde antes era apresentado o ápice da civilização.

Vemos na verdade a regressão à nova escravidão. Luiz Affonso Romano, no artigo citado, apresenta a automação, as pessoas trabalhando por mais tempo, a concentração dos negócios, o rearranjo da oferta de emprego, como causas. Tudo isso contribui, sem dúvida, mas em escalas diferentes.

Vejamos o que colocaria como o ponta pé inicial da tragédia. Não são mais os empreendedores industriais, os inventivos homens de negócio que descobrem novos produtos ou novas formas de produzir aqueles mais desejados. Tudo agora é conduzido pelas finanças que assumem o controle das empresas, onde antes estava a produção ou a venda.

E há um deslocamento dos objetivos; saem do mercado dos consumidores para o lucro maior e mais rápido. As empresas também perdem clientes e receitas.

Tomando o mesmo segmento de negócio da comparação apresentada na coluna Fatos & Comentários examinemos a ExxonMobil.

A junção destas duas grandes petroleiras se deu em 30 de novembro de 1999, ambas surgidas em 1911 da divisão da Standard Oil Company, para evitar o monopólio privado. O nome Exxon aparece em 1972, onde tivera designações tais como Esso, Enco e Humble, nos Estados Unidos da América (EUA) e em outros países.

Este novo nome da antiga Standard Oil, surge nas “crises do petróleo”, movimentos orientados pelas finanças, majoritariamente inglesas, na luta contra o industrialismo estadunidense e soviético. E a Exxon logo ganha posição privilegiada nos EUA. Antes da fusão com a Mobil, a Exxon havia desenvolvido negócios em todas as fases da indústria do petróleo, de campos de petróleo a estações de serviço (do poço ao posto). Também liderou no transporte de petróleo por oleodutos e operou uma das maiores frotas de petroleiros do mundo. Os interesses da Exxon incluíam gás natural, carvão, combustíveis nucleares, produtos químicos e minérios como cobre, chumbo e zinco.

Vieram as desregulações dos anos 1980, as finanças dominam o mundo na década de 1990, passam a controlar todos os negócios com suas gestoras de ativos, no século XXI.

Em 04 de setembro de 2020, The Washington Post publicou artigo de Dino Grandoni com título “Gigante petroleira não é tão grande quanto antes” e com subtítulo: “A expulsão da ExxonMobil do índice industrial Dow Jones é apenas o último sinal de que as grandes empresas de petróleo não são tão importantes para a economia como já foram” (Big Oil just isn’t as big as it once was – ExxonMobil’s expulsion from the Dow Jones industrial average is just the latest sign that major oil companies aren’t as important to the economy as they used to be).

O valor de mercado da gigante do petróleo é hoje, informa o artigo, cerca de um terço do que era em 2008, quando se aproximou de US $ 500 bilhões. A Exxon também saía, após 92 anos, do índice Dow Jones.

Seria um sinal do declínio do petróleo como principal motor das economias mundiais e estadunidense?

De certo modo é o fim do comando da economia pela produção de bens, pelo desenvolvimento tecnológico, pelo incentivo permanente ao consumo que ampliará negócios e lucros. Hoje é a especulação financeira que comanda a economia e corrompe a política, a justiça e a própria vida das famílias. Associada à informatização da vida, pois antes dos outros segmentos, há quase um século, viu na Teoria Matemática da Comunicação, surgida nos Laboratórios da Bell (A Mathematical Theory of Communication, por Claude E. Shannon, The Bell System Technical Journal, Vol. 27, julho/outubro, 1948), o recurso para voltar ao poder que perdera desde a I Grande Guerra.

Com o lucro máximo e mais rápido como única meta, as indústrias, dirigidas pelas finanças, eliminam seus centros de pesquisa e desenvolvimento, operações de risco tecnológico, aperfeiçoamento de pessoal e mesmo empregos. A indústria do petróleo que exige permanentemente tecnologias mais avançadas e assumir risco a cada novo objetivo exploratório, que manterá os volumes produzidos, foi a mais atingida.

O artigo de Dino Grandoni também lembra a pandemia do coronavírus, pois as pessoas pararam de viajar, sair de casa, consumir, enviando volumes e, consequentemente, os preços do petróleo para baixas históricas. O setor de energia foi o menor componente do índice de ações S&P 500, nos meses de junho a agosto de 2020, depois de cair abaixo de serviços públicos e imóveis entre outros.

São fatores que tornaram dispensáveis o trabalho, e provocaram sua volta à escravidão dos uber, da humilhação das incontáveis filas pela vaga que, eventualmente, surja, e onde não há mais direitos que lhe deem dignidade.

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.

Fonte: Site Pátria Latina

sexta-feira, 9 de abril de 2021

A boa saúde

 Abril

9
A boa saúde

No ano de 2011, pela segunda vez a população da Islândia disse não às ordens do Fundo Monetário Internacional.
O FMI e a União Europeia tinham decidido que os trezentos e vinte mil habitantes da Islândia deveriam assumir a bancarrota dos banqueiros e pagar suas dívidas internacionais na base de doze  mil euros por cabeça.
Essa socialização pelo avesso foi rejeitada em dois plebiscitos:
— Essa dívida não é nossa. Por que vamos pagar?
Num mundo enlouquecido pela crise financeira, a pequena ilha perdida nas águas do norte nos deu, a todos nós, uma saudável lição de bom-senso.

Eduardo Galeano, no livro Os filhos dos dias. 2ªEdição, 2012, página 123. L&PM Editores.

domingo, 30 de agosto de 2020

DEVANEIOS DE ARMÍNIO FRAGA?

Domingo, 30 de agosto de 2020
Por
Pedro Augusto Pinho

O rico e bem nascido brasil-estadunidense Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central tucano de FHC, escreveu na página poder da Folha de S.Paulo, domingo, 30/08/2020, “Fim do teto: não se, mas como”. Um receituário neoliberal, "gradual", porque com a “nossa credibilidade, baixa, me parece de todo essencial que se aprove o quanto antes uma versão da PEC Emergencial” “para desenhar e executar um orçamento plurianual crível”.

Não podemos nem devemos imaginar que cada palavra do membro do Council on Foreign Relations, think tank da banca, do Diálogo Interamericano e da Junta de Diretores do Pro-Natura Estados Unidos da América (EUA) esteja no artigo por acaso ou erro.

O que Armínio Fraga e seus agentes dos Soros da vida querem é a certeza de que nem Bolsonaro, nem Mourão, nem Braga Neto nem qualquer eventual condutor da economia brasileira, adote uma decisão que, mesmo levemente, arranhe os crescentes e volumosos lucros do sistema financeiro internacional.

E, seguindo a nova orientação do Fundo Monetário Internacional (FMI), um dos órgãos gestores das finanças dos paraísos fiscais, Fraga escreve: “a bem-vinda discussão em curso sobre uma renda básica universal, que ampliaria e consolidaria os programas de assistência social existentes, teria que obrigatoriamente acontecer no bojo desse orçamento plurianual”. Traduzindo: nada de populismo eleitoral nem desvio de rota, nada de criar despesa sem prévia aprovação da banca, tudo deve estar detalhado e consignado por vários anos (orçamento plurianual). Afinal a banca não pode estar mobilizando golpes a todo instante, isto custa um dinheiro que sai dos seus lucros.

E Armínio ameaça: “o tempo é curto e o espaço de manobra ainda menor”. Ou seja, as eleições criam um ambiente indesejável de despesas que não sejam com o pagamento de juros. Temos que correr antes das inevitáveis campanhas municipais.

E a manchete da Folha antecipa o artigo: “Bolsonaro monta roteiro para entregar obras de Lula e Dilma”. Pecado mortal, maldição eterna.

Pedro Pinho

terça-feira, 21 de abril de 2020

PEC 10 acoberta lavagem de trilhões em papéis podres acumulados há 15 anos nos bancos e você vai pagar a conta

Terça, 21 de abril de 2020
Por

Maria Lucia Fattorelli, Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida
  • em 
Se o Banco Central de fato estivesse preocupado em socorrer a economia, viabilizar a sobrevivência das empresas e manter empregos, deveria colocar em prática as suas atribuições de autoridade monetária do país: emitir e injetar moeda na economia, e exigir que os bancos criem linhas de crédito a juro zero e prazo de carência enquanto durar a pandemia.

Assim deveria agir uma autoridade monetária séria, dando total transparência das operações e controlando a atuação das instituições financeiras para garantir o cumprimento dos objetivos do programa.

Em vez de isso, foi criada a PEC 10/2020, que rebaixa o Banco Central a mero agente independente do mercado de balcão, desvirtuando completamente as atribuições daquela autoridade monetária.

O Banco Central será uma das pontas do desregulado mercado de balcão, adquirindo derivativos sem lastro e debêntures, sem limite de valor, sem identificar os beneficiários, sem obedecer aos “Procedimentos Mínimos” recomendados pela Anbima[i], sem a possibilidade de investigação efetiva, sem limitar o prazo dos papéis[ii]sem a exigência de contrapartida[iii] alguma ao país, e mais: pagando tudo isso com títulos da dívida pública, cujo peso recairá sobre o povo brasileiro!

O valor desse negócio bizarro será de R$972,9 bilhões[iv] , como informado pelo presidente do Banco Central aos senadores em 09/04/2020, demonstrando que já naquela data ele tinha conhecimento preciso do conteúdo do pacote de créditos privados.

O valor informado pelo presidente do BC ao Senado coincide com o valor divulgado em matéria de capa do Estadão dia 11/11/2019, que cita levantamento feito pela IVIX Value Creation[v] e revela que a “carteira podre” dos bancos chegava ao valor de quase R$ 1 Trilhão, sem considerar a correção monetária! Se computada essa correção, chegaremos a vários trilhões, pois esses ativos privados vêm sendo acumulados nos bancos há 15 anos, segundo o levantamento!

A autora desse revelador levantamento, IVIX Value Creation participou[vi] do grande evento do mercado financeiro Global NPL em Londres[vii], dedicado à busca de oportunidades de negócios em tempos de crise com os denominados Non-Performing Loan (NPL): termo utilizado para empréstimos bancários realizados que não tenham sido devidamente pagos (nem o valor principal, tampouco os juros) ao longo dos últimos 90 dias, classificados como default ou próximos a default, isto é, calote! NPL é sinônimo de crédito podre.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Os bancos também são mortais

Fevereiro
27 

Os bancos também são mortais

Todo verdor perecerá, havia anunciado a Bíblia.
Em 1995 o Banco Barings, o mais antigo da Inglaterra, entrou em bancarrota. Uma semana depois, foi vendido pelo preço de uma (1) libra.
Esse banco havia sido o braço financeiro do império britânico.
A independência e a dívida externa nasceram juntas na América Latina. Todos nós nascemos devendo. Em nossas terras, o Banco Barings comprou países, alugou próceres, financiou guerras.
E se achou imortal.

(Eduardo Galeano, no livro ‘Os filhos dos Dias’. L&PM Editores, 2012, pág. 75.)

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Malditos sejam os pecadores

Julho
24

Malditos sejam os pecadores

No idioma aramaico, que Jesus e seus apóstolos falavam, uma mesma palavra significa dívida e pecado.

Dois milênios depois, os pobres do mundo sabem que a dívida é um pecado que não tem expiação. Quanto mais você paga, mais você deve; e no Inferno está a sua espera o castigo dos credores.


Eduardo Galeano, no livro “Os filhos dos   dias”. Editora L&PM, 2ª edição, pág. 236.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Como os bilionários se tornam bilionários. Consequências das desigualdades.

Quinta, 28 de fevereiro de 2019
 

A América tem as maiores desigualdades, a maior taxa de mortalidade, a maioria dos impostos regressivos e os maiores subsídios públicos para banqueiros e bilionários de qualquer país capitalista desenvolvido.
Publicado pela primeira vez pela Global Research em 5 de outubro de 2017

Neste ensaio, discutiremos as raízes socioeconômicas das desigualdades e a relação entre a concentração da riqueza e a mobilidade descendente das classes trabalhadoras e assalariadas.

Como os bilionários se tornam bilionários

Ao contrário da propaganda promovida pela imprensa de negócios, entre 67% e 72% das corporações tinham zero obrigações tributárias após créditos e isenções — enquanto seus trabalhadores e empregados pagavam entre 25% a 30% em impostos. A taxa para a minoria de corporações, que pagou qualquer imposto, foi de 14%.

De acordo com a Receita Federal dos EUA, a evasão fiscal bilionária equivale a US$ 458 bilhões em receitas públicas perdidas a cada ano – quase um trilhão de dólares a cada dois anos por essa estimativa conservadora.

As maiores corporações americanas abrigaram mais de US$ 2,5 trilhões de dólares em paraísos fiscais no exterior, onde não pagaram impostos ou taxas de imposto de um único dígito.

Enquanto isso, corporações americanas em crise receberam mais de US$ 14,4 trilhões em dinheiro de ajuda pública, divididos entre o Tesouro dos EUA e oFederal Reserve, principalmente de contribuintes americanos, que são esmagadoramente trabalhadores, empregados e aposentados.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Papa Francisco se Insurge contra a Banca, Corruptora de Igrejas

Terça, 19 de fevereiro de 2019
Por
Pedro Augusto Pinho
Papa Francisco se Insurge contra a Banca, Corruptora de Igrejas - 1ª Parte: Introdução e Considerações elementares de fundo

Todos sabemos que a maior fonte de corrupção no mundo contemporâneo é a banca, o sistema financeiro, também conhecido por mercado.

É contra este sistema pernicioso, que extingue empregos e direitos, que escraviza milhões de pessoas, que aparelha Estados e compra consciências, que Papa Francisco, em 6 de janeiro de 2018, aprovou o documento “Considerações para um discernimento ético sobre alguns aspectos do atual sistema econômico-financeiro” (“Considerações”).

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

A PETROBRÁS e a Próxima Crise

Terça, 1º de janeiro de 2018
Por
Pedro Augusto Pinho
As crises do petróleo, na segunda metade do século XX, propiciaram a tomada do poder econômico mundial pelo sistema financeiro (a banca). Na última década do século passado, uma série de crises, distribuídas por todos os continentes, consolidou o poder da banca, não restrito apenas à economia, mas dominando o mundo da comunicação de massa, da política, do psicossocial e diversos governos nacionais.

A banca chega ao século XXI como o grande fantasma, assustando povos e Estados Nacionais. Não estará mais subordinada a cerca de 40 famílias detentoras de trilhões de dólares, mas a empresas financeiras que participam do capital de todas as grandes organizações, com ou sem ações em bolsas de valores e de diversas nacionalidades.

Estas empresas, como BlackRock, Vanguard, State Street, Fidelity, Wellington tem patrimônios superiores ao Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. As três maiores superam o PIB estadunidense.

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Leituras da História ou Pelo Brasil Independente

Sexta, 30 de novembro de 2018
Por
Pedro Augusto Pinho
Repito, com enorme desgosto, o que me é possível ler de nossa História. Somos, há 518 anos, uma colônia.

Imigrantes praticamos o genocídio dos povos autóctones, como o fizeram os espanhóis, ingleses e todos os civilizados europeus nas Américas, na África e por onde andaram.

Para cá também transplantamos enormes populações africanas, para nos servir como escravas, e garantimos, com sociedade submissa, dependente, permanente colônia aos senhores da ocasião.

Os primeiros aventureiros agiram como corsários, apenas interessados nos bens mais facilmente disponíveis e transportáveis. Deram a este período uma roupagem econômica denominando-o ciclo do pau-brasil.

Mas verificaram que esta terra fértil e imensa poderia suprir a Europa de um produto caro: o açúcar. Foram-se formando as bases da sociedade brasileira: escravista, agroexportadora, ignorante e dependente do estrangeiro.

A força com que esta classe permeou o imaginário nacional só tem semelhança com o inexistente empreendedor estadunidense, desbravador do oeste selvagem.

Mesmo empobrecida, cercada pelas dívidas, que é a principal arma do colonizador inglês, esta classe rural impediu a industrialização brasileira e ainda conduz, de modo elitista e antipopular, os destinos da nação. Com o relho e o preconceito.

Assistindo programa de entrevista na TV Curta, canal fechado, cerca de 10 historiadores, pensadores, psicólogos expuseram suas compreensões sobre nossa história. Pareciam 10 países diferentes. Por que estas desinformações? Estas incompreensões tão gritantes? Estas óticas tão particulares e excludentes?

Nem pretendo, nem tenho a paranoia de dono da verdade. Usarei o último livro do maior sociólogo brasileiro vivo: Jessé Souza, “A classe média no espelho” (Estação Brasil, 2018), suas pesquisas e análises, para orientar minha reflexões.

Inicio com a citação crítica da Lava Jato, elogiada à esquerda e à direita como redentora do País:

“Não entra no cérebro desses lacaios servis aos interesses dos seus senhores que a corrupção era seletiva e definida pelo algoz, o que explica por que apenas um lado tenha sido prejudicado e o outro ficado só com as vantagens”

Quem perdeu? A industrialização, a engenharia, as empresas brasileiras. Quem ganhou? O sempre impune sistema financeiro e os interesses empresariais estrangeiros.

Vamos nos deter em dois pontos, vitais para a soberania, para a independência de qualquer país: energia e indústria, intimamente ligados.

Dois brasileiros e apenas eles merecem a qualificação de estadistas: Getúlio Vargas e Ernesto Geisel, não por mero acaso governaram com regimes autoritários, chamemos, para agradar gregos e troianos, ditatoriais. E ambos foram vítimas de golpes, pelas mesmas forças externas que lutam com uma parcela da classe dirigente brasileira pela manutenção do Brasil Colônia.

Não me deterei, já o fiz em outras artigos, sobre a formação da elite agroexportadora, que se colocou acima do Estado Nacional, desde 1808, e jamais, a não ser nos breves momentos de governo autoritário, saiu desta posição de mando e controle das decisões nacionais.

Repito que não há esquerda e direita no Brasil, há os que se submetem, hoje à banca (sistema financeiro internacional), e os que se voltam contra os colonizadores, até 1990 Estados Nacionais centrais (Europeus e os Estados Unidos da América - EUA).

Apenas um exemplo em Estado Central, para que se veja a ignorância e a desinformação que nos domina. Na Suécia, apenas 8% da hotelaria, por decisão de governo, pode estar em mãos estrangeiras. Absurdo? De modo algum. Protegendo a indústria nacional de mobiliários, materiais e equipamentos domésticos e toda cadeia produtiva a estes associada. Assim a Suécia garante emprego e renda para seus nacionais. Imagine se este setor estivesse em mãos alemães, onde estariam os empregos e as rendas?

A industrialização sempre foi combatida no Brasil. Não de modo franco e aberto como de Eugênio Gudin que dizia ser a siderurgia “coisa de branco”, não era para os mestiços brasileiros. Eram leis, regulamentos, orientações que, na prática, impediam o desenvolvimento industrial nacional. Veja a diferença das políticas de Vargas e da ação do BNDES nos Governos Médici e Geisel.

Vamos rever/reestudar a política de substituição de importações, tão brilhantemente conduzida por Marcos Pereira Vianna. Ao invés de desindexar despesas para cumprir o estúpido teto de gastos, como declarou ao Valor Econômico o “futuro ministro” Paulo Guedes (30/11/2018).

Voltemos à questão básica e estratégica da energia. Nossos dois estadistas criaram as empresas que se tornaram referência internacional de capacitação técnica para conduzir a energia no Brasil: Petrobrás, Eletrobrás, Nuclebrás e o programa do Pró-álcool. Todas em processo de desestruturação, de infiltração política, de privatizações e desnacionalizações desde 1990, não por acaso o ano que a banca chegou, pelo voto, ao poder no Brasil.

O que nos leva - pois a ação administrativa é sistêmica, todos elementos estão de algum modo interligados, interdependentes - à questão da comunicação de massa. Quem controla a comunicação de massa, a indústria cultural no Brasil? Pois é esta força de comunicação que irá criar expressões, modismos, hábitos que influenciarão nosso modo de pensar e fornecerão os dados que corroborem suas farsas, seus preconceitos e desinformações.

Para ficar no exemplo da Petrobrás, foram seus técnicos que descobriram campos gigantes, no Brasil e no exterior, depois que as grandes empresas de petróleo - as majors - abandonaram estas áreas pela “inexistência” de petróleo.

Foi o caso do Campo de Majnoon, no Iraque, e vários, inclusive o pré-sal, no Brasil. Hoje Majnoon está entregue à Royal Dutch Shell (anglo-holandesa) e à Petronas, da Malásia. E o pré-sal sofre o assédio das estrangeiras, estatais e privadas, no Senado.

Não sei se Lênin ou Stalin quem pronunciou a frase muito citada em artigos sobre energia: socialismo é igual a poder soviético mais eletrificação.

Mas sem dúvida, o poder nacional está intimamente vinculado à energia. Privatizar (o que significa internacionalizar o controle) a Petrobrás, a Eletrobrás, a Nuclebrás, os programas de biocombustíveis, é colocar o Brasil de joelho.

A privatização vai também se infiltrando em novas formas de estrutura societária. A Vale (ex-Vale do Rio Doce, uma riqueza brasileira sem semelhança no mundo), recebida em quase doação por empresário nacional e Fundos de Pensão de empresas de economia mista, está hoje desnacionalizada, legalmente mas ilicitamente, por jogadas com ações, vinculação ao “novo mercado” da Bolsa de Valores, acordos de acionistas, que entregaram 52,9% do capital para mãos estrangeiras e com outros prejuízos à participação nacional com conclusão, já definida, em  2020.

Mesmo o agronegócio exportador, que tão ardentemente defende e sempre apoiou a manutenção colonial, não percebe que a terra produtiva e a água doce já estão na mira dos interesses estrangeiros, transformando-os em “bens de mercado”, ou seja, para serem propriedade dos BlackRock, Vanguard, State Street Global Advisors (SsgA), Fidelity e outros trilionários fundos de investimentos de difusa propriedade pelos países centrais. Contra eles Blairo Borges Maggi, Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias e outras importantes personalidades da agropecuária brasileira não terão qualquer força.

Tratemos de mais um tema sensível à independência nacional: o tráfico de drogas, de armas e ilícitos associados.

De acordo com o órgão da ONU para Drogas e Crimes (UNODC - UN Office on Drugs and Crimes), em 2010, este complexo econômico movimentou 3,6% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Apenas o narcotráfico,representava R$ 490 bilhões (14%), dos R$ 3.480 bilhões, que circulavam no sistema financeiro do país, segundo o ex-Ministro Chefe da Casa Civil (1995-1999), Clóvis Carvalho, no relatório da Comissão Especial de Estudos sobre o Sistema Financeiro, por ele presidida.

Engana-se quem vê o negócio das drogas, armas, tráficos de pessoas e órgãos humanos, lavagem de dinheiro e crimes semelhantes como ação de cartéis ou “famílias” mafiosas. É um imaginário que a comunicação de massa ajuda a divulgar na proteção deste trilionário negócio. É uma sólida cadeia integrada de produção, comercialização e finanças.

Com as desregulações de Thatcher/Reagan, ao longo dos anos 1980, os ilícitos fizeram “surgir no mercado”, entre 1990 e 2000, cerca de US$ 4 trilhões. Foi grande upgrade para a banca. Já nadando em petrodólares.

Parte desta fortuna está nas corrupções que um sistema parlamentar facilita, ainda mais num estado aparelhado.

Também tenho lido no facebook (pode não ser fonte confiável, mas relatórios bancários o seriam?) que as igrejas, notadamente as neopentecostais, que são abundantes em áreas carentes, estão sendo atraídas e incluídas no sistema de lavagem do tráfico. As “doações”, isenções tributárias, ausência de fiscalizações muito ajudam.

Toda esta gestão do crime, dos ilícitos, desagua na violência urbana, que foi dos temas mais importantes da última eleição.

É muito fácil ser técnico na segunda-feira, como sabe todo amante de futebol, mas é muito pertinente o que escreveu o sociólogo Francisco de Oliveira, em “O momento Lênin” (Novos Estudos CEBRAP, nº 75, julho/2006), cuja conclusão resumo a seguir.

Em 1917, Alexandre Kerensky assume a direção da Rússia (primeiro-ministro), uma república parlamentar, com o fim do czarismo. Tenta salvar as instituições, cujo modelo desacreditado colocava sua autoridade diluída. Havia comandos independentes em diversos segmentos do Estado. Fracassa e é substituído pelos bolcheviques, liderados por Lênin, que derrubam aquele modelo parlamentar.

Não há repetição histórica, mas semelhanças em contextos diferentes.

Lula assume em 2003 um Estado já tomado pela banca. Não tenho certeza, talvez uma pesquisa histórica aprofundada nos esclareça porque não promoveu a reforma necessária ao controle do Estado. Compromisso na manutenção da situação encontrada? Falta de condição - técnica ou política - de alterá-la? Conivência? O fato é que seu destino, naquele momento, ficou traçado.

Kerensky foi derrubado pela liberdade parlamentar; Lula pela dinâmica do capitalismo financeiro. O Estado Nacional Brasileiro, em 2018, ainda é uma questão em aberto.

O que nos aguardará 2019?

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado