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(Millôr Fernandes)

domingo, 23 de agosto de 2020

O Desequilíbrio na Composição Militar Brasileira

Domingo, 23 de agosto de 2020



Por
Salin Siddartha*

Há um grande desequilíbrio na composição militar brasileira, tanto em termos de efetivo a ocupar posições territoriais, quanto com relação à situação logística das três Forças. Existe alta proporção de oficiais-generais em nossas Forças Armadas (1 oficial-general para cada 971 militares, contra 1.400 nos Estados Unidos da América), e distorções nas distribuições de tropas no território nacional. É um problema administrativo grave, não só para a manutenção da lei e da ordem, como para a defesa nacional.
As defasagens foram-se acumulando com a desatualização do cenário de possíveis confrontos bélicos e com a diminuição gradativa do componente orçamentário destinado às FFAA. O deslocamento da Capital Federal do Rio de Janeiro para Brasília, o aumento de vagas no Almanaque do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, a ampliação do quadro de efetivo sem o devido planejamento, a mudança da ótica política em relação aos quartéis, a acomodação de um possível teatro de guerra que não se mostra à luz desde a Guerra do Paraguai, tudo isso foi afetando um quadro que se deformou a ponto de gerar, até mesmo pelo habito, uma visão estrutural míope. Em verdade, ficamos ultrapassados em quase todos sentido nesse campo.
Pior é notar que as demandas reprimidas e a limitação imposta pelo “Novo Teto de Gastos”, desde o Governo Temer, ampliarão a obsolescência e inviabilizarão cada vez mais as Forças Armadas em padrão militar de médio porte. É motivo de arrepios só o ato de pensar na possibilidade de um conflito que envolva nossas tropas em adversidade com outro país no próprio continente sul-americano.
O controle de nosso território depende da capacidade de controlar o panorama terrestre, o espaço aéreo e as águas jurisdicionais, inclusive para prevenir ilícitos, identificá-los e reprimi-los. Apesar de um atrito bélico na África do Sul ou no Sul do Oceano Atlântico poder militarizar o Atlântico Sul, com reflexos para as Linhas de Comunicação Marítimas prioritárias, sabe-se que possíveis ameaças de um inimigo externo têm muito mais probabilidade de virem pelo Norte, pelo Oeste e pelo mar, portanto deve-se priorizar a Região Amazônica, em vez de concentrar efetivos no Sul e no Sudeste, em especial no Rio de Janeiro, como, infelizmente, é feito. Ocorre que apenas 13% das tropas do Exército Brasileiro estão na Amazônia, 25% estão no Sul e 23% no Rio de Janeiro; na Marinha do Brasil, 71% dela situa-se no Rio de Janeiro; quanto à Força Aérea Brasileira, apenas 14,2% de seus efetivos localizam-se na Região Norte, enquanto 32,5% encontram-se no Rio de Janeiro. Assim, a Região Sudeste concentra metade dos militares das Forças Armadas. É preciso adensar a presença de unidades do Exército, da Marinha e da Força Aérea nas fronteiras, algo que não ocorre.
Outro aspecto que pesa negativamente em nossa capacidade de resposta à agressão externa é o fato de as fragatas da Marinha do Brasil já se encontrarem no limite de vida útil. É fato que a Marinha pretende substituí-las por corvetas, que são navios de combate menores, contudo essa medida é extremada em razão da realidade orçamentária (corvetas são bem mais baratas que fragatas) que dificulta a compra e equipagem de novas fragatas.
Outrossim, sem mobilidade célere não há defesa eficiente a qualquer ataque ou ameaça que devam ser dissuadidos. Para fortalecer a mobilidade, é preciso desenvolver a capacidade logística na Região Amazônica, pois não há como deslocar soldados rapidamente pela floresta sem bases, pistas de pouso, barcos etc. O vínculo entre aspectos tecnológicos e operacionais de mobilidade tem de aliar alta tecnologia e estratégia para concentrar e desconcentrar tropas com rapidez.
Cruzeiro-DF, 23 de agosto de 2020
SALIN SIDDARTHA
*Este artigo foi publicado originariamente neste domingo (23/8) no PorBrasília