Sábado, 1 de novembro de 2012
Da Revista Época
Da Revista Época
De onde vinha a influência de Rosemary de
Noronha, a mulher que se apresentava como “namorada” de Lula – e, com
isso, nomeava afilhados, interferia em órgãos do governo e recebia
recompensas
(Trecho da reportagem de capa da edição de ÉPOCA desta semana)
Uma triste passagem de bastão marcou a política brasileira na semana
passada: saiu de cena um escândalo político; entrou outro. De um lado, o
Supremo Tribunal Federal fez história ao definir as penas dos
condenados do mensalão. Treze dos réus, incluindo o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu,
vão para a cadeia em tempo integral – uma rara ocasião na história
brasileira em que poderosos pagarão por seus crimes. De outro lado, uma
nova personagem irrompeu na cena política nacional: Rosemary Nóvoa de Noronha, ou Rose. Falando em nome de um padrinho político poderoso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
Rose trabalhou pela nomeação de vários afilhados no governo federal. Ao
se dirigir a diretores de empresas estatais ou órgãos do governo, Rose
frequentemente se apresentava como “namorada” do ex-presidente. Um dos
afilhados de Rose, Paulo Vieira, foi preso pela Polícia Federal (PF) na Operação Porto Seguro,
acusado de chefiar uma quadrilha que cobrava propinas de empresários,
em troca de pareceres jurídicos favoráveis em Brasília – fosse no
governo, nas agências reguladoras ou no Tribunal de Contas da União.
Rubens Vieira, diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac),
irmão de Paulo e outro dos afilhados de Rose, também foi preso. Tão logo
o caso veio a público, na sexta-feira dia 23 de novembro, Rose foi
exonerada do cargo que exercia, como chefe do gabinete da Presidência em
São Paulo.
Como foi possível que Rose, uma simples secretária do PT, acumulasse
tanto poder e prestígio, a ponto de influenciar nos rumos do governo
federal – e causar tamanho salseiro? “A investigação demonstra que o
poder de Rose advinha da relação dela com Lula. Não há elementos,
entretanto, de que o ex-presidente soubesse disso ou tivesse se
beneficiado diretamente do esquema”, afirma uma das principais
autoridades que cuidaram do caso. “Lula cometeu o erro de deixar que
essa secretária se valesse da íntima relação de ambos”, afirma um amigo
do casal Lula e Dona Marisa. “Deveria ter cortado esse caso há muito
tempo.” Os autos do processo, de que ÉPOCA obteve uma cópia integral, e
entrevistas com os principais envolvidos revelam que:
1) Lula, ainda presidente da República, prestou – mesmo que não
soubesse disso – três favores à quadrilha. Por influência de Rose,
indicou os irmãos Paulo Vieira e Rubens Vieira para a direção,
respectivamente, da ANA e da Anac. Lula, chamado em e-mails de “chefão”
ou “PR” por Rose, também deu um emprego no governo para a filha dela, Mirelle;
2) A quadrilha espalhou-se pelo coração do poder – e passou a fazer
negócios. Os irmãos Vieira, aliados a altos advogados do PT que ocupavam
cargos no governo, passaram a vender facilidades a empresários que
dependiam de canetadas de Brasília;
3) Rose, gabando-se de sua relação com Lula, tinha influência no Banco do Brasil. Trabalhou pela escolha do atual presidente do BB, Aldemir Bendine,
indicou diretores (um deles a pedido de Delúbio Soares, o ex-tesoureiro
do PT condenado no caso do mensalão), intermediou encontros de
empresários com dirigentes do BB e obteve um contrato para a empresa de
construção de seu marido;
4) Despesas do procurador federal Mauro Hauschild, do PT, ex-chefe de
gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli e, depois,
presidente do INSS, foram pagas pela quadrilha. É uma situação similar à
do recém-demitido número dois da Advocacia-Geral da União (AGU), José
Weber Holanda – que, segundo a PF, recebeu propina;
5) A PF, mesmo diante das evidências de que Rose era uma das líderes da
quadrilha, optou por não investigá-la. Não pediu o monitoramento das
comunicações de Rose e não quis detonar a Operação Porto Seguro no
começo de setembro, quando a Justiça autorizara as batidas e prisões.
Esperou até o fim das eleições municipais.
De acordo com o relato feito a ÉPOCA por um alto executivo que
trabalhou na Companhia das Docas do Porto de Santos (Codesp), Rose
evocava sua relação com Lula para fazer indicações e interferir, segundo
seus interesses, nos negócios da empresa. Nessas ocasiões, diz o
executivo, Rose se apresentava como “namorada do Lula”. “Ela jogava com
essa informação, jogava com a fama”, diz ele.