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(Millôr Fernandes)

sábado, 27 de março de 2010

Palácio do Planalto: Presidência gasta R$ 3 milhões para compra de novo mobiliário

Sábado, 27 de março de 2010
Leandro Kleber - Do Contas Abertas

Na reta final das obras de restauração do Palácio do Planalto, previsto para ser reaberto em 21 de abril, aniversário de Brasília, a Secretaria de Administração da Presidência da República empenhou (reservou em orçamento) R$ 3 milhões para a compra de novo mobiliário. Na lista estão 1.150 cadeiras, 102 poltronas, 16 sofás e 54 mesas que levam as assinaturas do arquiteto Oscar Niemeyer e do designer Sergio Rodrigues (clique aqui para ver detalhes de todos os móveis).

 O item mais caro é uma mesa com a marca Oscar Niemeyer, no valor de R$ 26,5 mil. O móvel é de “madeira especial, para reunião, em formato ‘U’, com módulos de saída para microfones, revestimento externo em folha de madeira wengue natural, internamente revestida em folha de madeira curupixa, acabamento com fundo em poliuretano”, entre outras características descritas na nota de empenho emitida pela PR na última quarta-feira para a realização da despesa. 

Também na lista dos mais caros estão nove sofás de espera desenhados por Sergio Rodrigues, empenhados pela PR por R$ 12,3 mil cada. Os itens são de “estrutura em imbuia maciça com almofadas soltas sobre chassis de molas horizontais estofadas em espuma de poliuretano e revestimento em couro natural preto primeira linha (flor integral)”.

Duas empresas serão as responsáveis por fornecer o material: a Lin Brasil Indústria e Comércio de Móveis LTDA, à qual a PR reservou R$ 2,6 milhões, e a Teperman Design Comércio Móveis Representações LTDA, para a qual a Presidência comprometeu R$ 396,7 mil.

Para prestar os serviços, as entidades não precisaram passar pelo processo de licitação porque, segundo a assessoria de imprensa da Casa Civil, a Comissão de Curadoria responsável pela restauração “priorizou artistas da época da construção do Palácio do Planalto, Oscar Niemeyer e Sergio Rodrigues, que estão vivos e têm a comercialização de seus móveis com exclusividade”. “Portanto, não haveria concorrência em uma licitação. Esses móveis são complementares aos que foram resgatados [originais do Palácio]”, informa a assessoria.

 Para o professor do Departamento de Arquitetura da Universidade da Brasília (UnB) Cláudio Queiroz, os preços dos móveis adquiridos pela Presidência não estão caros. Segundo ele, designers renomados no país costumam cobrar esses valores. “É claro que alguns móveis do Planalto que vieram da antiga capital [Rio de Janeiro] não podem ser descartados, pois são patrimônio histórico. Mas o Planalto é uma obra moderna tombada como patrimônio cultural, e não histórico. Isso faz com que ele possa sofrer alterações estruturais sem perder o tombamento”, afirma.

 Quanto à restauração do Planalto, Queiroz afirma que a obra é pertinente. “É uma pena que prédios públicos no Brasil, mesmo sendo país de terceiro mundo, não recebam manutenção regularmente”, lamenta.

 "Móveis antigos deveriam ser mantidos"
Já para o cientista político Lúcio Castelo Branco, os móveis do Palácio do Planalto não deveriam ser trocados, pois, segundo ele, são tombados como patrimônio cultural. “Os móveis do palácio não podem ser substituídos. O mobiliário tombado deve ser utilizado por todos os presidentes da República: os do passado, presente e futuro. Substituí-lo é um desrespeito à lei e à República e um atropelamento total da cultura nacional”, afirma.

 Segundo Castelo Branco, os móveis do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, foram usados por diversos presidentes da República e não foram substituídos. “Essa situação do novo mobiliário no Planalto me faz lembrar alguns diplomatas brasileiros que, talvez por vaidade, assim que assumem os postos, mandam reformar as embaixadas como lhes convir, mesmo que elas já tenham passado por manutenção recente. Esses gastos são feitos com recursos públicos, nosso dinheiro”, diz.

 Ele é “totalmente” a favor da restauração do Planalto, pois acredita que a instalação era muito precária. “Na época dos governos Sarney e Itamar, por exemplo, o palácio era uma vergonha, cheio de defeitos em itens como ar-condicionado. Parecia a UnB hoje, infelizmente. A reforma é necessária, mas não desse jeito que está sendo feita [em referência ao novo mobiliário]”, conclui.

 Comissão de Curadoria
 Segundo a assessoria de imprensa da Casa Civil, os R$ 3 milhões reservados para a compra dos móveis complementa o que a Comissão de Curadoria do Palácio do Planalto não conseguiu no trabalho de resgate de móveis originais que foi feito em toda a administração pública federal. “A Comissão, criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009 com o objetivo de ambientar o Palácio do Planalto e harmonizar a reforma do mobiliário original da época da construção, conseguiu, inclusive, a doação de mais de 400 itens da Câmara dos Deputados e do Senado Federal”, afirma.

De acordo com a assessoria, o planejamento de restauração do Planalto previa a compra dos móveis, “mas o projeto apresentado pelo escritório de Oscar Niemeyer partia de móveis contemporâneos de designers estrangeiros e estava orçado, em preço de partida, em R$ 6,5 milhões”. No entanto, segundo a assessoria, a Comissão de Curadoria decidiu que o Palácio do Planalto, sede do governo brasileiro, deve ser vitrine de produtos nacionais, no caso mobiliário brasileiro modernista, em razão da restauração.

Quanto ao preço da mesa de reuniões desenhada por Niemeyer (R$ 26,5) e dos sofás de Rodrigues (R$ 12,3 mil), a assessoria afirma que o primeiro item foi feito exclusivamente para o Salão Oval e os sofás são de imbuia maciça e forrados em couro de primeira qualidade. “O preço tanto de um como de outro está abaixo do preço de mercado para móveis com esse padrão de qualidade de materiais. Sergio Rodrigues, inclusive, abriu mão de seus direitos autorais, o que possibilitou que a Lin Brasil praticasse um preço abaixo do que praticaria normalmente”, argumenta a assessoria.

Ainda segundo a assessoria de imprensa da Casa Civil, se for preciso, obras de complementação no Palácio do Planalto serão executadas nas semanas seguintes à comemoração dos 50 anos de Brasília.