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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 15 de março de 2010

Lula no estopim do mundo

Segunda, 15 de março de 2010 
Por Ivan de Carvalho
A penúltima viagem do presidente Lula ao exterior foi o clímax de um desastre para sua imagem internacional.
Lula vinha obtendo visibilidade e certo reconhecimento internacional, muito em função da importância crescente do país que governa, o que não é uma obra da sociedade – com todas as suas qualidades e defeitos – e dos que construíram o país desde 1500.
    Mas não se pode negar que a movimentação política e diplomática do atual governo teve forte e momentânea influência para essa visibilidade.
O governo Lula começou a brigar para valer com os Estados Unidos na OMC por causa do algodão. Emprestou uma merreca ao FMI e saiu soltando foguetes. Acumulou reservas capazes de pagar toda a dívida externa e, aplicando a maior parte dessas reservas em títulos do Tesouro americano, é credor dos Estados Unidos.
Mais. O Brasil, além de ter sido convidado na Era Lula para participar de reuniões dos países mais desenvolvidos do mundo, em Davos, ingressou no BRIC – grupo dos quatro grandes países emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China).
O Brasil do governo Lula encasquetou de cobrar um lugar de membro permanente, com direito a veto, no Conselho de Segurança da ONU, o que aumentou a visibilidade, e chegou a reconhecer à China comunista a condição de “economia de mercado” – o que agora tanto prejudica a economia brasileira – na esperança de receber do colosso da Ásia Central o apoio então insinuado, mas depois “esquecido”, para a nossa transformação em membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. Enganaram a diplomacia lulo-brasileira.
Mas tudo isso deu visibilidade a Lula, aumentada pela relativa suavidade (na comparação à maioria das outras grandes economias) com que o Brasil atravessou, ou vem atravessando, a grande crise financeira e econômica global. Lula foi escolhido pelo jornal esquerdista francês Le Monde “Homem do Ano” e pelo jornal espanhol El País, “Personagem do Ano”, “um homem cabal e tenaz”.
Todo esse patrimônio político internacional veio, no entanto, sendo solapado recentemente pelo relacionamento aloprado que aprofundou com o ditador-presidente Hugo Chávez e estabeleceu com o aloprado congênere, Mhamoud Ahmadinejad, da Venezuela e Irã, respectivamente. E desabou com as alopradas declarações durante sua última viagem a Cuba sobre a morte do preso político Orlando Zapata e na inacreditável entrevista que deu depois à Associated Press na tentativa de explicar o absurdo perpetrado. O jornal El País publicou um editorial baixando o sarrafo geral em sua “Personagem do Ano” passado.
Desde ontem Lula está no Oriente Médio. Visitando Israel, a Cisjordânia e a Jordânia. Não escolheu, desta vez, interlocutores aloprados. Mas o governo brasileiro vai fantasiar, soltar foguetes e ele mesmo correrá para apanhar as flechas.
Porque, mesmo tendo ao seu lado um judeu inteligente, hábil negociador e de mente aberta, seu amigo governador Jaques Wagner, nenhuma influência o bedelho brasileiro pode ter atualmente no conflito mais crítico do planeta – o estopim do mundo.
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.