Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O PAC e o espírito de porco

Sexta, 25 de novembro de 2011
Por Ivan de Carvalho
O Ministério da Fazenda dispara fogo amigo contra o ministério do Planejamento, atingindo em cheio a ministra Miriam Belchior e o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. Seria engraçado e até ridículo se não fosse uma coisa importante, mas é triste, porque mostra como o governo busca enganar as pessoas sobre a suposta eficiência e o propagandeado êxito de sua atuação.

            A notícia surgiu ontem, foi divulgada na Internet e por emissoras e, por sua relevância, deve ser replicada hoje nos jornais impressos. Não é o caso de repeti-la neste espaço, mas, no máximo, de fazer referência para lembrar o leitor do que se trata.

            A ministra Miriam Belchior desfilava, em cerimônia oficial, a catarata de cifras, gráficos e vídeos publicitários com que numerosos governos – inclusive o do Brasil – cuidam de obliterar a visão dos cidadãos que os sustentam e sobre os quais eles exercem o poder que lhes foi concedido pela sociedade e o que delas frequentemente usurpam.

            Na cerimônia, realizada no Palácio Itamaraty (que chique!) fazia-se o segundo balanço oficial do PAC 2, a etapa desse programa iniciada no governo Dilma Rousseff. Um calhamaço de 180 páginas (o que, a um tempo, “mostra serviço” e desestimula a perigosa leitura analítica, salvo pelos mais pacientes e determinados estudiosos) começava afirmando que o PAC 2 “tem sido determinante para a continuidade do crescimento sustentável da economia brasileira”.

            E caprichava o calhamaço: "Em 2011, o PAC 2 também alcançou volume de pagamento do Orçamento Geral da União 22% superior em comparação com o mesmo período de 2010, ano de melhor desempenho do programa", afirmava o material.

            Tudo uma maravilha. Mas o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, segunda pessoa na hierarquia da pasta, estava junto da ministra do Planejamento e assumiu a desagradável (para ela) função de espírito de porco. “Houve vários ajustes e reprogramações nos programas do governo, no PAC, no Minha Casa, Minha Vida, e essas reprogramações proporcionaram investimento relativamente estável em relação a 2010”.

            Quer dizer: os investimentos do PAC em 2011 equivalem aos feitos no mesmo programa em 2010 (já computando a previsão para o restante do ano atual, naturalmente). Isso já deixou a ministra Belchior com a cara mexendo, segundo se pode presumir com bastante margem de segurança.

            Mas o problema da ministra – e através dela, do governo – não acabara. O espírito de porco ainda animava o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, que aguardou ansioso ser questionado pelos jornalistas para expressar de forma mais objetiva sua avaliação do PAC 2. Os jornalistas não o decepcionaram, questionaram-no. E ele não se fez de rogado: “A manutenção do investimento do PAC no mesmo nível do ano passado significa que o PAC neste ano não contribuiu para acelerar o crescimento”.

            Bem, neste ano da graça de 2011 após o nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Programa de Aceleração do Crescimento não acelerou o crescimento, segundo o Ministério da Fazenda, ressalvado algum choro do ministro Guido Mantega ao pé da presidente Dilma para obter o perdão ante a bobagem dita por seu principal auxiliar ou uma exoneração do secretário executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, por ter dito uma barbaridade dessas.

            Qualquer das duas hipóteses nos permitirá acreditar na ministra Belchior e em seu calhamaço.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.