Quarta, 31 de dezembro de 2014
Alex Rodrigues - Repórter da Agência Brasil
O
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski,
determinou, em caráter liminar, que o Ministério do Trabalho e Emprego
se abstenha de divulgar ao público a relação de empregadores flagrados
ao submeter trabalhadores a formas degradantes de trabalho ou a
condições análogas ao trabalho escravo.
A suspensão da publicação
da chamada Lista Suja do Trabalho Escravo foi pedida no último dia 22,
pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), em
ação direta de inconstitucionalidade (Adin). De acordo com informações
disponíveis no site do STF, Lewandowski apreciou o pedido
durante o recesso do Judiciário por estar de plantão e apresentou a
decisão no dia seguinte.
Juridicamente, a decisão de Lewandowski
suspende os efeitos da Portaria Interministerial 2, de 12 de maio de
2011, que estabelece as regras sobre o cadastro. A portaria é assinada
pelo Ministério do Trabalho e a Secretaria de Direitos Humanos. A
decisão também suspende o efeito da Portaria 540, do Ministério do
Trabalho, de 15 de outubro de 2004, já revogada pela publicação da
Portaria Interministerial 2.
As portarias não tratam diretamente
da divulgação dos nomes dos empregadores, mas da obrigação de manter e
atualizar a relação das pessoas físicas e jurídicas flagradas na prática
da manutenção do trabalho escravo, atribuição do Ministério do
Trabalho, que tem ainda o dever de dar conhecimento de seu conteúdo a
ministérios, ao Ministério Público Federal, Ministério Público do
Trabalho e a bancos públicos. Nenhuma das portarias prevê a divulgação
automática dos nomes ao público.
Na petição, a Abrainc alega que
as portarias ministeriais ferem a Constituição Federal e o princípio da
separação entre os Poderes, já que, na interpretação da entidade, seria
competência do Poder Legislativo editar lei sobre o assunto. A
associação também sustenta que os nomes dos empregadores são inscritos
na lista sem a existência do devido processo legal, de “forma
arbitrária”, ferindo o princípio da presunção da inocência.
“O
simples descumprimento de normas de proteção ao trabalho não é
conducente a se concluir pela configuração do trabalho escravo”, aponta a
Abrainc no pedido de liminar. “Assim como é inconcebível que
empregadores submetam trabalhadores a condições análogas às de escravos,
também é inaceitável que pessoas sejam submetidas a situações
vexatórias e restritivas de direitos sem que exista uma prévia norma
legítima e constitucional que permita tal conduta da administração
pública”, conclui a entidade.
Ao justificar sua decisão,
Lewandowski classificou como “odiosa” a prática subumana a que alguns
empregadores submetem seus funcionários, mas destacou que os gestores
públicos devem observar os preceitos constitucionais. “Embora se mostre
louvável a intenção em criar o cadastro de empregadores, verifico a
inexistência de lei formal que respalde a edição da Portaria 2 pelos
ministros de Estado”, alegou o presidente do STF.
A decisão ainda precisa ser publicada no Diário Oficial da União
para entrar em vigor e pode ser revertida quando for apreciada em
Plenário pelos ministros da Corte. Segundo a assessoria do STF, a
publicação da decisão só deverá ocorrer em fevereiro, quando o Poder
Judiciário retorna do recesso. A primeira sessão dos ministros do STF
está marcada para o dia 4 de fevereiro, mas não há previsão de quando o
processo será julgado. A relatora será a ministra Carmem Lúcia.
O Ministério do Trabalho retirou de seu site
a relação com os nomes dos empregadores flagrados explorando mão de
obra escrava. A lista deveria ter sido atualizada esta semana. Na última
atualização, feita em julho deste ano, a lista trazia 609 nomes de
pessoas físicas e jurídicas. A maioria dos flagrantes registrados até
então aconteceu no Pará, com 27% do total. Em seguida vinham Minas
Gerais (11%); Mato Grosso (9%) e Goiás (8%). Entre as atividades
econômicas nas quais os fiscais do trabalho encontraram mais condições
análogas à escravidão, estão a pecuária (40%); produção florestal (25%) e
indústria da construção (7%).
Procurado, o Ministério do
Trabalho informou, por meio de sua assessoria, que não comentaria a
decisão judicial e afirmou que irá cumpri-la até a decisão final do STF.
A Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República
destacou que a Comissão Nacional para a Erradiação do Trabalho Escravo
(Conatrae) está analisando a decisão e estudando as medidas jurídicas
cabíveis. Vinculada à SDH, a Conatrae é o órgão responsável por
coordenar e avaliar a implementação das ações previstas no Plano
Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, entre outras
atribuições. É composta por representantes de órgãos de Estado e da
sociedade civil.