Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 23 de outubro de 2010

Rentistas exigem juros mais altos para compensar alta do IOF

Sábado, 23 de outubro de 2010
Deu na "Auditoria Cidadã da Dívida"
O Jornal Valor Econômico mostra um fato já várias vezes denunciado pela Auditoria Cidadã da Dívida: o poder de chantagem dos mercados sobre o governo - por meio do aumento dos juros exigidos para a compra de títulos da dívida interna - caso seja implementada qualquer medida que, mesmo minimamente, afete seus interesses. Nas últimas semanas, o governo elevou de 2% para 6% o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre a entrada de capital estrangeiro destinado às aplicações da dívida interna. Como resultado, ontem os investidores já exigiram juros mais altos para comprar títulos da dívida interna.

Ou seja: sem se reduzir os juros, sem controlar os fluxos de capital, e sem fazer a auditoria da dívida pública, fica difícil para o país ter autonomia em sua política econômica, pois a dívida sempre continuará sendo um instrumento de chantagem diária dos mercados.

Não por acaso, o próprio Ministério da Fazenda divulgou ontem um estudo mostrando que o Brasil está em terceiro lugar no ranking mundial dos países que mais atraem a especulação financeira, nas chamadas “operações de carry-trade”, ou seja, tomar dinheiro emprestado em países com juros baixos para aplicar em países com juros altos. Conforme notícia do jornal Estado de São Paulo:

“Em 12 meses até o fim de setembro, o Brasil garantiu aos investidores um ganho de 14,5%. Na África do Sul, a rentabilidade em um ano foi de 18,2% e, na Austrália, de 15,8%. Na 8.ª edição do boletim "Economia Brasileira em Perspectiva", divulgada ontem pelo Ministério da Fazenda, a equipe econômica apresentou um ranking dos ganhos (no jargão econômico, chamado de carry return) com aplicações em renda fixa em vários países e alertou para o problema cambial dessas operações. No documento, a Fazenda diz que o governo "usará todos os instrumentos para eliminar novo movimento especulativo no câmbio". O aumento da liquidez internacional (maior quantidade de recursos disponíveis) e os juros brasileiros, destacou o boletim, atraíram investidores que buscam retorno nos juros e no mercado de câmbio.”

Porém, conforme comentado anteriormente, medidas como o aumento do IOF são retaliadas pelos especuladores, que aumentam os juros exigidos para comprar títulos da dívida interna.

Com juros altíssimos, a dívida não pára de crescer, conforme mostra o Portal G1. Segundo o Tesouro Nacional, a dívida pública federal subiu em setembro para R$ 1,62 trilhão, sendo R$ 92 bilhões de dívida externa pública federal e R$ 1,53 trilhão de dívida interna (conforme a tabela do Tesouro, Anexo 2.1).

Porém, segundo a Nota para a Imprensa de Mercado Aberto do Banco Central, Tabela 11, devem ser acrescentados a estes R$ 1,53 trilhão de dívida interna os R$ 378 bilhões das chamadas “Operações de Mercado Aberto”, que também representam dívida interna na mão dos rentistas. Portanto, a dívida interna chegou, na verdade, a R$ 1,912 trilhão em setembro. E se contabilizarmos todos os títulos do Tesouro em poder do Banco Central (sobre os quais o Tesouro paga ao Banco Central juros e amortizações, que são utilizados pelo BC para a cobertura dos prejuízos que tem junto aos investidores privados), verifica-se que a dívida interna já ultrapassou os R$ 2 trilhões.

Segundo o Tesouro, os estrangeiros já detêm R$ 154 bilhões da dívida interna, porém, nunca é divulgada a metodologia que gerou tal informação. Ou seja: os estrangeiros podem estar detendo uma parcela bem maior da dívida interna.

O Tesouro também afirmou que a dívida interna cresceu em setembro principalmente devido às altas taxas de juros. Porém, a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, alheia a esta realidade, afirmou ontem que pretende reduzir a dívida, para que só então a taxa de juros possa cair, conforme mostra outra notícia do Portal G1. Ou seja: dentro desta política, a taxa de juros jamais cairá, e a dívida continuará crescendo.

Por fim, o jornal O Globo traz a notícia de que a taxa de desemprego é a menor em 8 anos, e que a renda aumentou 6,2% nos últimos 12 meses, o que poderia dar a entender que a política econômica estaria indo bem, mesmo destinando a maior parte do orçamento para o pagamento da dívida.

Porém, é preciso ressaltar que metade dos trabalhadores empregados não possuem carteira assinada, que a renda do trabalho está apenas 8,8% acima do que era em 2002 (após permanecer de 2003 a 2007 em níveis inferiores a 2002, conforme tabela do IBGE), e que a taxa de desemprego ainda está em níveis equivalentes ao vigente em alguns momentos do governo FHC, ou Collor.

Ou seja: o que está ocorrendo atualmente representa bem a imagem da “retirada do bode da sala”, ou seja, o país apenas está retornando a níveis existentes anteriormente, durante governos neoliberais.
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