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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Tribunal Regional Federal da 3ª Região reconhece possibilidade de o MPF requisitar informações diretamente à Receita e ao BC

Quarta, 27 de fevereiro de 2013
Do MPF
Com esse entendimento, Procuradoria Regional da República da 3ª Região obtém condenação de réu da Banestado que havia sido absolvido sob o argumento de que as provas seriam ilegais
 
Acolhendo o entendimento da Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PRR3), a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) em sessão realizada nesta terça-feira, 26 de fevereiro, julgou procedente apelação criminal do Ministério Público Federal contra sentença de primeira instância que havia absolvido réu do caso Banestado sob o argumento de que as provas seriam ilegais. Em sua decisão, o Tribunal reconheceu a possibilidade de o Ministério Público Federal (MPF) requisitar informações diretamente à Receita Federal e ao Banco Central, sem que isso se configurasse como quebra ilegal de sigilos fiscal e bancário. Com isso, foi reformada a sentença da 1ª Vara Federal de Campinas (SP) e o réu foi condenado a 2 anos e 2 meses, em regime aberto, pelo crime de evasão de divisas.

A ação penal decorre de desmembramento da Operação Farol da Colina, que investigou o uso de contas mantidas no exterior e utilizadas em operações fraudulentas. A denúncia apontava que o réu manteve depositados, em 2000, mais de US$ 1,5 milhão em contas num banco norteamericano, sem que houvesse prestado a devida declaração à Receita Federal ou ao Banco Central. Além disso, no mesmo período, suprimiu o pagamento do imposto de renda de rendimentos que estavam depositados nas contas bancárias mantidas no exterior.

O MPF requisitou à Receita que fossem encaminhadas cópias dos procedimentos fiscais decorrentes do caso, para os quais não tivesse sido formulada a respectiva representação fiscal para fins penais. A Receita encaminhou cópias do Termo de Constatação Fiscal e do Auto de Infração, além de outros documentos que demonstravam que o réu havia realizado movimentação financeira em moeda estrangeira sem declarar à Receita. Posteriormente, o MPF buscou informações, junto ao Banco Central, sobre eventuais depósitos e aplicações realizados pelo réu, entre os anos de 2000 e 2002. O Banco Central informou que não foi identificada qualquer Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior por parte do acusado.

Diante de tais informações, o MPF ofereceu denúncia contra o réu pelo crime de evasão de divisas. A denúncia foi recebida em novembro de 2009. No entanto, mais tarde foi proferida sentença que declarou a ilicitude das provas produzidas e, consequentemente, absolveu o denunciado. A decisão se fundamentava no fato de que teria havido quebra de sigilo fiscal e bancário do acusado sem autorização judicial.

O MPF em primeira instância recorreu da sentença e a PRR3, em seu parecer, defendeu que o entendimento da 1ª Vara Federal de Campinas não deveria ser acolhido. A Procuradoria emitiu seu parecer opinando que fosse julgada procedente a apelação do MPF e a sentença fosse reformada, reconhecendo a legalidade das provas e condenando o réu pelo crime de evasão de divisas.

Sobre a alegada ilicitude das provas, a Procuradoria contestou o argumento lembrando que a própria Lei Complementar 75/93, que dispõe sobre o Ministério Público da União, confere ao MPF a possibilidade de requisitar informações da Administração Pública direta ou indireta, vedando que seja negada qualquer informação sob o argumento de que as informações são sigilosas. Além disso, a lei que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras (Lei 105/2001) determina que o Banco Central informe ao MPF a ocorrência de indício de crime definido em lei, devendo instruir a comunicação com a cópia dos documentos necessários. No caso, portanto, o MPF procedeu a uma série de diligências previstas em lei para obtenção dos elementos necessários à elucidação dos fatos, dentre as quais se insere a requisição de informações à Receita e ao Banco Central, não havendo notícia de uso indevido ou vazamento de informações ou dados sigilosos.

A PRR3 lembrou ainda o papel dado ao Ministério Público no que diz respeito à iniciativa de colheita de provas. Conforme lembra o parecer, o texto constitucional "não deixa dúvidas sobre a possibilidade, não só de acompanhamento de diligências levadas a efeito no inquérito policial, mas de investigação direta, por meio da requisição de informações, documentos, certidões, procedimentos administrativos, enfim, de elementos que permitam a formação de sua convicção em relação à materialidade e à autoria de crimes de ação pública."

No que diz respeito à legalidade das provas apresentadas, a Procuradoria lembrou que a ação decorre de desmembramento da Operação Farol da Colina, que tramitou perante a 2ª Vara Federal de Curitiba (PR). No decorrer da operação, a Justiça Federal não só determinou o levantamento do sigilo bancário das contas mantidas por brasileiros nas instituições investigadas, suspeitas de serem utilizadas em operações fraudulentas, mas também o compartilhamento das informações com a Receita, o Banco Central e o Coaf. Portanto, as informações sigilosas dos correntistas brasileiros off-shore dessas contas foram legalmente levantadas, tendo sido ainda autorizada sua disponibilização aos órgãos interessados. Como aponta a PRR3, "o compartilhamento de tais informações entre os órgão encarregados da fiscalização dos crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro nacional é salutar, pois visa a ampliar a capacidade de investigação e diminuir a impunidade de tais delitos".

Além de argumentar em favor da licitude das provas, no mérito a Procuradoria apontou que estavam comprovadas nos autos a autoria e a materialidade do crime de evasão de divisas. "A manutenção de conta no exterior é fato incontroverso na presente ação penal", salientou em seu parecer, lembrando que o próprio acusado confirmou a abertura de conta, sustentando, no entanto, que ela teria sido aberta provisoriamente, apenas para receber valores da herança de um tio.

No entanto, tais alegações não correspondem à realidade. Como aponta a PRR3, comprovar tais alegações "não seria nada difícil, posto que todos os argumentos defensivos referem-se à transações realizadas através de documentos (procuração, alienação de imóvel e transmissão de herança). Todavia, nenhum documento que confirmasse as alegações foi juntado aos autos."

"As provas dos autos, portanto, não deixam dúvidas sobre a materialidade, a autoria e o dolo do apelado, razão pela qual a condenação é medida de rigor, uma vez que lastreada em documentação que comprova a prática do crime contra o Sistema Financeiro Nacional", concluiu a Procuradoria, ao defender a condenação do réu.

Seguindo a argumentação da PRR3, a 2ª Turma do TRF3, por unanimidade, proveu o recurso da acusação, condenando o réu a 2 anos e 2 meses em regime aberto.

Processo nº 2012.61.05.003577-3