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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 30 de abril de 2013

A crise e seus focos

Terça, 30 de abril de 2013
Por Ivan de Carvalho
Os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, deputado Henrique Eduardo Alves e Renan Calheiros, foram ontem à casa do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal e de lá saíram com a versão de que, além de uma conversa muito cordial, as relações entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal experimentam no momento uma distensão, após a crise que houve na semana passada.

         Um dos pontos principais é o de que o presidente da Câmara saiu analisando possíveis maneiras de desmanchar o malfeito perpetrado pela Comissão de Constituição e Justiça da Casa, que aprovara a PEC 33, uma espécie de monstro legislativo que pretende submeter o STF ao Congresso nos poderes mais essenciais da Suprema Corte.
         
         Enquanto o presidente da Câmara dava a entender, como hipótese para desfazer a aprovação da PEC 33 pela CCJ, que a sessão da Comissão de Constituição e Justiça poderá ser anulada por ter sido marcada por anomalias graves, o ex-presidente do Senado e da República, senador José Sarney, do alto dos seus 83 anos e do seu governismo peemedebista, fez declarações duras contra a PEC 33, dizendo que o Congresso “jamais” aprovaria uma emenda tão estapafúrdia (foi proposta pelo deputado Nazareno Fonteles, do PT).

         Já o atual presidente do Senado, Renan Calheiros, depois da conversa com o Gilmar Mendes, sugeriu que quando uma proposta legislativa contraria frontalmente a Constituição, especialmente ferindo uma de suas cláusulas pétreas, ela pode ser simplesmente arquivada pela presidência da Casa Legislativa. E acrescentou ele: “Não sei se é o caso”. Não sabe, mas levanta a bola para Henrique Eduardo Alves, após resolver a questão da aprovação da PEC 33 pela CCJ, determinar o arquivamento definitivo da proposta, alegando que fere a Constituição, inclusive em cláusulas pétreas, o que é verdadeiro.

         Bem, parece que há mesmo por enquanto uma distensão. Aparentemente foi aberta uma estrada para que o Congresso e o STF – onde já existe ação do PSDB e da Mobilização Democrática (a nova legenda surgida da fusão entre o PPS e o PMN) contra a PEC 33 – lidem com o assunto e cheguem à única conclusão racional, para a qual parecem marchar: a PEC 33 é lixo, uma monstruosidade legislativa, tentativa desavergonhada de golpe legislativo contra o Poder Judiciário, os fundamentos da Constituição e a democracia.

         Mas restarão ainda dois focos de crise. Um deles, que já está rolando há algum tempo no Congresso, é a PEC 37, que restringe as funções do Ministério Público e tem sido apelidada de “PEC da impunidade”. Impede que o MP (federal ou estaduais) tome a iniciativa de investigar, bem como de supervisionar as investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelas polícias civis estaduais. Tenta-se implantar no Brasil o que, no mundo, é uma raridade.

Em outras palavras, dá às polícias a exclusividade da investigação, impedindo a vigilância e, se necessário, interferência do MP. Como as polícias são submissas ao Poder Executivo (o que não ocorre com o MP, que é autônomo), as investigações poderão ser, eventualmente, totalmente manipuladas pelo Executivo, para descobrir ou encobrir, sem nada que se possa fazer para evitar as distorções.

Além dessa “PEC da impunidade”, a PEC 37, o outro foco de crise, este a curto prazo bem mais candente, é o projeto de lei que inibe a criação de novos partidos. A Câmara dos Deputados o aprovou, agora está no Senado, onde os governistas querem aprová-lo para bombardear a candidatura a presidente de Marina Silva e fragilizar as de Eduardo Campos (governador de Pernambuco e presidente do PSB) e Aécio Neves, do PSDB. Melhor dizendo, remover os principais obstáculos à reeleição da petista Dilma Rousseff.

O ministro do STF Gilmar Mendes paralisou a tramitação do projeto no Senado, através de medida liminar em mandado de segurança. Resta saber se ele reverá sua decisão ou se o pleno do STF a manterá ou não. Mantida a decisão contra o projeto casuísta, será foco de crise. Derrubada, ficará parecendo uma troca pela PEC 33.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.