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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Direito de presos à integridade física não pode ser limitado pela reserva do possível

Quarta, 25 de fevereiro de 2015
Do MPF
Janot defende que, quando há risco a direitos fundamentais, o Poder Judiciário pode expedir ordem para que o Executivo concretize políticas públicas
Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirma que a integridade física dos presos é direito fundamental e que, por isso, não pode ser limitada pela chamada reserva do possível, quando o Poder Executivo deixa de executar políticas públicas alegando restrições orçamentárias. Para Janot, se há risco para direito fundamental, o Poder Judiciário pode expedir ordem para que o Executivo concretize políticas públicas, sem que isso configure interferência indevida. Segundo ele, a existência de direito fundamental desrespeitado por ação ou omissão do Estado torna jurídica a questão.

O tema está em discussão no Recurso Especial 592.581/RS, de autoria do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. O recurso questiona a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) de julgar improcedente ação civil pública que pedia determinação judicial para reforma no Albergue Estadual de Uruguaiana, estabelecimento prisional sem condições mínimas de salubridade. O MPF já havia se manifestado no recurso especial, mas, como o Plenário do STF reconheceu a repercussão geral do caso, o PGR pediu nova manifestação.
 Segundo Janot, o artigo 1º da Constituição estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. “Significa isso que o poder constituinte originário elegeu a dignidade da pessoa como finalidade e a própria razão de existir do Estado Brasileiro”. Já no artigo 5º, inciso XLIX, a Constituição assegura aos presos o respeito à integridade física e moral.
Janot defende que o respeito à integridade física e moral é direito fundamental dos presos. E os direitos fundamentais têm “núcleo intangível, que deve ser assegurado, protegido e promovido pelos entes estatais”. De acordo com ele, “a repercussão disso é que, mesmo em condições adversas, de limites financeiros ou de colisão com outros direitos fundamentais, o conteúdo do direito fundamental deve ser preservado, sendo inaceitável sua redução ou ponderação”. Assim, o Poder Executivo não pode alegar  restrições orçamentárias  (a chamada reserva do possível) para deixar de assegurar o direito dos presos.
Para o PGR, quando o Poder Executivo não observa direitos e garantias fundamentais, o Poder Judiciário pode sim determinar a realização de política pública, sem que isso cause desequilíbrio institucional. “Em casos limítrofes, em virtude de mandados constitucionais expressos e observada a madura e cautelosa autocontenção por parte dos órgãos competentes, pode – e deve – o Judiciário, de forma legítima, impor a adoção de políticas e medidas administrativas a órgãos executivos”, sustenta.
O parecer defende que a reforma do Albergue Estadual de Uruguaiana traria benefício para toda a sociedade. “O cumprimento desses deveres redunda não apenas em benefício dos presos, mas no da própria sociedade, pois a erradicação das condições degradantes de boa parte do sistema carcerário brasileiro tende a reduzir a geração de violência, de criminalidade e de reincidência nos egressos das unidades penitenciárias”
Como o STF determinou a repercussão geral no caso, a decisão no recurso deverá ser aplicada posteriormente pelas instâncias inferiores, em situações idênticas.