Tempestade perfeita
foi como os serviços de meteorologia dos EUA designaram um fenômeno
ocorrido em outubro de 1991, quando condições de tempo incomuns
maximizaram a contundência de uma grande tempestade vinda do Atlântico
Leste; os ventos superaram a força de furacão, as ondas foram além dos 9
metros de altura.
O título original do filme que aqui se chamou Mar em Fúria (dirigido por Wolfgang Petersen e estrelado por George Clooney), The perfect storm,
popularizou mundialmente a expressão, significando um evento desastroso
resultante da sinergia de uma série de fatores adversos.
Segundo o cientista social Marcus André Melo, PhD pela Universidade
britânica de Sussex (cuja entrevista ao repórter Fernando Canzian, da Folha de S. Paulo, pode ser acessada aqui), é algo assim que se desenha para o Brasil em 2015:
"...há três elementos fundamentais em curso: políticas de austeridade, as pessoas indignadas com escândalos e um possível desdobramento disso nas ruas, como nas manifestações pró impeachment marcadas para o próximo dia 15 pelo país.
No caso de Dilma, isso deve se manifestar de forma muito intensa. Vai haver um descontentamento difuso colossal, mas sem um espaço institucional, as eleições, para a demonstração desse descontentamento. Mas existem as ruas.
Haverá manifestações, e se elas podem ou não levar ao impeachment, isso vai depender de surgirem evidências mais duras de implicação pessoal da presidente nos escândalos...
...o governo perdeu o controle político das duas casas no Congresso, na Câmara e no Senado. O partido de sustentação do governo, o PMDB, agora é quase um adversário".
Resumindo: "É um cenário de tempestade política perfeita, com políticas de austeridade ceifando empregos, escândalos enormes e gente na rua".
Com exceção da nova postura adotada pelo PMDB a partir da eleição de
Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, tudo isso era facilmente
previsível durante a campanha presidencial do ano passado, daí eu ter
vislumbrado uma oportunidade interessante quando Marina Silva despontou
com força na corrida eleitoral.
Era a chance de atravessarmos um período muito difícil com uma cara nova
(também pertencente ao campo da esquerda) no Palácio do Planalto, ao
invés de uma Dilma Rousseff desgastada pela longa permanência do PT no
poder, pelo mau primeiro governo e sem grandes metas para propor,
capazes de incutir esperança nos brasileiros.
A desconstrução de Marina com jogo sujo e propaganda enganosa, erro
crasso do PT que poderá ter consequências terríveis adiante, nos colocou
na direção da tempestade perfeita. E, como não adianta chorar sobre o
eleito derramado, temos agora é de refletir sobre como sairmos da
enrascada.
Até agora não caiu para Dilma e os grãos petistas a ficha de que a
política de conciliação de classes, estabelecida por Lula na década
passada, só teve sucesso devido a circunstâncias que não existem mais.
A conjuntura econômica internacional favorável permitiu que se
aumentasse um tantinho o quinhão do bolo destinado aos mais pobres, sem
que, com isto, fossem reduzidos os lucros do grande capital (o caso dos
modernos agiotas é emblemático: nunca antes neste país os bancos
ganharam tanto como entre 2002 e 2008!).
Agora é a fase das vacas magras, e só não vê quem não quer: por mais
agrados e concessões que o governo do PT faça ao poder econômico, nunca
serão suficientes para tê-lo como sustentáculo nos instantes dramáticos
que se avizinham. Tudo leva a crer que, pelo contrário, verá com bons
olhos o impedimento de Dilma, desde que não seja traumático a ponto de
prejudicar os negócios.
Daí eu ter proposto, no meu artigo dominical,
que o PT reassuma as abandonadas (para dizer o mínimo...) bandeiras de
esquerda, pois os que as seguem são os únicos contingentes com os quais
poderá contar no momento da decisão.
Os magnatas que o toleravam em troca da capitulação macroeconômica, os
políticos que comprou para "garantir a governabilidade" embora fossem
antípodas ideológicos e os coitadezas que nele votavam por causa do
Bolsa-Família de nada lhe servirão na hora H. Quem viver, verá.