Quinta, 31 de março de 2016
Ação é resultado de inquérito que apurou andamento de três recursos apresentados pelo Banco Safra
O Ministério Público Federal (MPF) em Brasília denunciou à
Justiça seis pessoas por envolvimento na manipulação de julgamentos
junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A ação
penal integra a Operação Zelotes e é a terceira apresentada desde o
início das investigações da Força Tarefa. Neste caso, a denúncia é
resultado do inquérito instaurado parar apurar suspeitas de
irregularidades no andamento de três processos administrativos de
interesse da empresa JS Administração de Recursos – sociedade
empresarial do grupo Safra. Os recursos apresentados pelo contribuinte
questionavam a cobrança de tributos que, em valores de agosto de 2014,
somavam R$ 1,49 bilhão e que, atualmente, chegam a R$ 1,8 bilhão. O
pedido do MPF é para que os envolvidos respondam por corrupção ativa,
corrupção passiva e, ainda, falsidade ideológica.
Na denúncia, os procuradores da República detalham a atuação
dos seis envolvidos, sendo dois servidores da Receita Federal (Lutero
Fernandes do Nascimento e Eduardo Cerqueira Leite), dois ex-servidores,
que seriam os intermediários (Jorge Victor Rodrigues e Jeferson Ribeiro
Salazar) e dois representantes do grupo empresarial interessado nos
julgamentos (João Inácio Puga e Joseph Yacoub Safra). A partir da
análise de conversas interceptadas em meados de 2014 e de documentos
apreendidos durante as investigações – ambas medidas autorizadas pela
Justiça – os investigadores concluíram que os quatro primeiros (Lutero,
Eduardo, Jorge e Jeferson) pediram propina de R$ 15,3 milhões para
conseguir decisões favoráveis junto aos conselheiros do Carf.
A intenção criminosa do grupo é evidenciada a partir da citação de
várias conversas e de troca de mensagens mencionadas na ação. A
documentação reunida deixa claro, por exemplo, que uma das primeiras
providências tomadas pelo grupo foi a interferência para que o Carf
acatasse um pedido de preferência para o exame de admissibilidade de um
recurso. Embora a empresa tivesse um advogado formalmente constituído
para atuar junto ao tribunal administrativo, foi Lutero quem sugeriu a
apresentação do pedido e elaborou a minuta do texto apresentado. Na
época, Lutero era chefe do Serviço de Assessoria Técnica e Jurídica do
Carf. “Seu acesso a informações internas e aos sistemas de informática,
seus contatos com diversos conselheiros e suas competências
administrativas dentro do Conselho foram fundamentais para os interesses
processuais da JS Administração de recursos SA”, afirmam os
procuradores em um dos trechos da ação.
Ao longo de 28 páginas, a ação transcreve dezenas de conversas
trocadas entre os integrantes do grupo. Também menciona o fato de os
envolvidos atuarem em dois núcleos, sendo um em Brasília e outro em São
Paulo. A realização de várias reuniões presenciais nas duas cidades,
algumas, inclusive, fotografadas pela Polícia Federal é outro aspecto
mencionado pelos procuradores como elemento de prova da atuação
criminosa do grupo. Além disso, chamou a atenção dos investigadores o
nível de detalhes discutidos durante a fase de negociações. Nas
conversas interceptadas, os intermediários do negócio mencionaram, por
exemplo, o fato de que, por exigência do contratante, nada seria
documentado. No mesmo diálogo, os dois (Jorge e Jeferson) falam da
imposição de uma espécie de multa que seria cobrada em caso de atraso na
entrega do “serviço”. Para os investigadores, essa conversa revela que o
valor da propina seria reduzido em R$ 1 milhão por mês se o problema
junto ao Carf não fosse solucionado até dezembro de 2014.
Ainda na ação encaminhada à Justiça, os procuradores justificam o
fato de terem incluído na denúncia o nome do empresário Joseph Yacoub,
embora o banqueiro não tenha tratado diretamente com os intermediários
ou servidores da Receita. Segundo os autores da ação, em pelo menos três
conversas interceptadas fica claro que João Inácio Puga - diretor que
negociava em nome do Grupo Safra – se reportava ao superior. Além disso,
os procuradores citam o fato de os processos em andamento no Carf
envolverem valores que representam mais de 40% do capital do grupo,
estimado em R$ 4,3 bilhões. “Um mero diretor não poderia, como realmente
não o fez, tomar as decisões que envolviam dívidas correspondentes a
41,26% do capital social”, resume.
Crimes praticados - A ação penal é assinada pelos
procuradores da República Frederico Paiva, Hebert Mesquita e Marcelo
Ribeiro. Eles pedem que os dois servidores da Receita (Lutero e Eduardo)
respondam por corrupção ativa, cuja pena pode chegar a 12 anos de
reclusão além de multa. Já os outros quatro são acusados de corrupção
passiva, que tem pena idêntica, segundo o Código Penal.
Ainda na denúncia, os procuradores pedem que João Inácio Puga e
Jeferson Salazar também respondam por falsidade ideológica, cuja pena
pode chegar a cinco anos de reclusão. As investigações mostraram que, ao
longo das negociações criminosas, eles usaram os dados de um
funcionário do grupo Safra (sem o seu conhecimento) para comprar e
habilitar uma linha de celular, usada com o objetivo de dificultar a
interceptação das conversas. As investigações revelaram que a linha
telefônica foi cancelada, em 2015, pela operadora. O motivo? Mais de 180
dias sem recarga.
A ação penal foi protocolada nesta quarta-feira (30) e será analisada
pela 10ª Vara Federal em Brasília, onde também tramitam os outros
processos da Operação Zelotes.
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