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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

O Mensalão e o martelo

Quinta, 11 de outubro de 2012
Por Ivan de Carvalho
O governador Jaques Wagner tem revelado mais sensatez ou mais sinceridade (disposição para reconhecer a verdade) do que muitos dos seus mais preeminentes correligionários. Assim é que ele admitiu, sem ressalvas, que o julgamento do processo do Mensalão pelo Supremo Tribunal Federal influiu nas eleições do último dia 7.

            Conscientemente, claro, na contramão do discurso de líderes e dirigentes nacionais do PT, o governador da Bahia afirmou o julgamento do Mensalão como um de um conjunto de fatores que direcionou as eleições de domingo, acrescentando, com bom senso, que, no entanto, não é possível medir quanto e onde influiu mais ou menos ou até se determinou ou não pontualmente resultados.

            Foi esse, pelo menos, o entendimento que tive dos comentários que Wagner fez para a imprensa sobre o tema. Não os fez antes das eleições, adiando-os para ontem, certamente porque tal análise teria efeitos prejudiciais para o PT nos resultados e os adversários políticos até poderiam explorar essas declarações.

            Talvez por isto mesmo haja falado ontem na influência que o julgamento do Mensalão “teve” nas eleições, apenas a título de uma constatação e uma análise, com o verbo no passado, sem mencionar a influência que o processo do Mensalão ainda vai ter nos lugares onde o PT disputará o segundo turno eleitoral, no dia 28. Talvez pelo mesmo motivo o ex-ministro-chefe da Casa Civil em parte do primeiro governo Lula e que teve sua sentença condenatória por corrupção ativa (ainda falta o julgamento por formação de quadrilha) recomendou aos seus admiradores do PT que deixem para discutir (leia-se, contestar) o processo do Mensalão depois das eleições e que até lá se preocupem apenas com a campanha eleitoral.

            Para o PT, ficar falando de Mensalão durante a campanha para o segundo turno das eleições é abominação. Ainda mais diante dos escores avassaladores registrados no pleno do Supremo Tribunal Federal, com condenação de 8 votos contra 2 para José Dirceu e 9 a 1 contra José Genoino.

Notando-se que um dos dois votos absolutórios – naturalmente fundado na consciência jurídica do autor, com base na prova dos autos – partiu do ministro-revisor Lewandowski, sendo fato conhecido que sua nomeação para o STF pelo então presidente Lula foi estimulada pelas relações, sempre louváveis, de amizade da então primeira dama Marisa Letícia. Notando-se ainda que o outro voto absolutório, igualmente fundado na conviccão do julgador com base na prova dos autos, foi dado por um ministro que fora subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil de 2003 a 2005, durante o período em que o ministro-chefe da Casa Civil era o atual réu José Dirceu.

Na realidade, o Mensalão, se for inteligentemente usado na campanha eleitoral, inclusive a eletrônica, pelos oponentes do PT (e nem a lei eleitoral nem a Constituição fornecem qualquer instrumento ou fundamentação jurídica para evitar isso) pode se revelar uma enorme pedra no sapato do partido neste segundo turno. É que o julgamento já está definido, o “núcleo político” petista do Mensalão já foi condenado numa parte das acusações, mas o processo continuará durante a campanha eleitoral, com a votação de mais imputações, atingindo esse chamado “núcleo político”, e com a dosimetria das penas de todos os réus condenados. Um cenário infernal para uma campanha eleitoral.

E há algo que equivale a uma martelada – não daquelas que Stalin mandou aplicar em Trotsky – na cabeça. Mas uma martelada nos malfeitos que se quis fazer à democracia. Usou o martelo o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Carlos Ayres Britto, que, aliás, antes de ir para o STF tinha, como vários outros, conhecidas ligações com o PT. Ele disse que o Mensalão foi um projeto de golpe: o objetivo dos réus era colocar em prática “um projeto que vai muito além de um quadriênio quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto”.

Acrescentar o que? Uma frase bíblica, talvez. “Tudo o que plantares, certamente colherás”. 
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta
Ivan de Carvalho é jornalista baiano