Segunda, 27 de fevereiro de 2012
De "Rumos do Brasil" Propostas para um país melhor
Por Paulo Metri
Os mais maduros
certamente lembram-se da propaganda de meados do século passado, das
“pílulas de vida do Dr. Ross”. Era um simples laxante vendido como sendo
a cura milagrosa para problemas de uns três órgãos e do sangue, além de
trazer paz ao espírito. Com exceção de eventual “paz de espírito”
advinda do desaparecimento da prisão de ventre, era uma propaganda
enganosa. Mas tão enganosa que o remédio era chamado de “pílulas de
vida”, insinuando que tiravam da morte iminente quem as tomasse.
“Democracia”, da forma como é pregada desde muito tempo atrás, é a
pílula de vida enganosa da humanidade, pois seria a solução para quase
todos os seus problemas, desde o desenvolvimento econômico até a
distribuição de renda, além de pretender acarretar um alto índice de
bem-estar social. Entretanto, este modelo, da forma como implantado
mundo afora, não traz o propalado bem-estar.
Só um louco seria contra a verdadeira democracia. Contudo, temos aí
somente os plágios permitidos pelo capital. São cópias tão bem
camufladas que podem até enganar os inadvertidos, mas, se eles prestarem
bastante atenção, descobrirão que são ditaduras de poderosos, grandes
usufrutuários dela. A bem da verdade, democracia não é um bem que só
possa ser classificado de duas formas: “existente” e “não existente”. Os
países têm graus de democracia diferentes, o que ocorre, também, com
muitos outros valores.
Em muitas das proclamadas democracias existentes, há dominação das
informações que chegam aos cidadãos pelos meios de comunicação de
massas. Elas chegam filtradas e manipuladas, conforme o interesse de
grupos econômicos e políticos, e não há democracia quando só há
informações truncadas para as tomadas de decisão dos cidadãos.
A falta de informações confiáveis se faz presente também no processo
eleitoral, uma vez que a comunicação necessária é corrompida por
marqueteiros e escondida do público por quase todos os veículos: canais
de televisão, rádios, jornais e revistas. Eles levam o eleitor a votar
influenciado por questões acessórias, por informações erradas, por
conceitos impostos por repetição, como dogmas, e nunca analisados.
Assim, o eleitor vota muitas vezes contra seus próprios interesses,
manipuladamente, elegendo grande número de péssimos representantes, que
deverão seus mandatos somente aos financiadores das campanhas. Desta
forma, a democracia eleitoral, em muitas situações, trata-se de uma
farsa.
Em geral, o governo e a oposição buscam ganhar, por qualquer meio, a
aprovação da população sobre diversos temas e, raramente, tal aprovação é
obtida com todos os dados por convencimento racional. A mídia do
capital sempre apresenta versões distorcidas dos fatos, com análises que
pinçam partes da realidade, pois o que está em jogo é muito poder e
dinheiro. Marilena Chauí, em entrevista, disse: “Não há debate público
de idéias em entes privados.”
Por que os países colonizadores pregavam, recentemente, a luta pela
democracia no Iraque, no Egito e na Líbia? E, agora, a pregam para a
Síria? Sem querer defender sistemas autoritários, os países centrais
pregam democracia para estes não por serem amantes dos direitos humanos,
mas porque tal democracia é o melhor sistema para as forças locais
serem cooptadas e suas empresas fazerem bons negócios. Existe ditadura
na Arábia Saudita que nunca é recriminada, porque o ditador do país já
faz grandes negócios com as empresas estrangeiras.
Contingentes humanos pediam recentemente, e ainda pedem, em diversas
nações, por democracia. Sem esquecer seus sofrimentos, entristece-me ver
quanta ilusão estão lhes passando, quando a verdade é que estrangeiros e
locais mal intencionados desejam somente lucrar com os recursos
naturais, os mercados e as mãos-de-obra baratas destes países,
aproveitando suas inocências. Chegam notícias recentes da Líbia contando
que o terror continua por lá, sendo as milícias que chegaram ao poder
com a queda de Kadafi os novos aterrorizadores da população.
Assim, a democracia pregada por países com pretensão hegemônica faz
parte do arcabouço de um sofisticado processo de espoliação dos
colonizados. O máximo da ousadia do plano dos países usufrutuários é a
dominação cultural, através da qual os explorados passam a achar que as
coisas têm que ser assim mesmo, inclusive eles, subdesenvolvidos. Hoje,
em raras situações, a dominação se dá pela força bruta, bastando as
mentes dos explorados serem dominadas. Para isto, o papel da mídia não é
o suficiente, mas o fundamental. Com a população iludida, sem valores e
referências, crendo na predestinação do seu país ao fracasso e
aceitando a cultura alienista, não se reage quando decisões prejudiciais
a ela são tomadas por uma elite entreguista. Trata-se de uma situação
deprimente, que só será revertida se os enganados se tornarem
conscientes.
Sugiro a todos que queiram mudar o status quo e buscam evoluir para
um melhor entendimento das questões nacionais e internacionais
desligarem o interruptor que os mantém no mundo virtual, criado pelo
atual sistema de mídia, exatamente para transformá-los em colaboradores
alienados.
Devem começar por escolher criteriosamente as novas fontes de
informação. Em primeiro lugar, prestar atenção que a maioria das
informações que chega à sua percepção é originada nas seguintes agências
de notícias: Associated Press, CBS News, France Presse, BBC News,
Reuters, CNN, Bloomberg e mais umas poucas, todas atreladas ao capital.
Fugir do oligopólio das agências internacionais de notícias é difícil,
entretanto, existem publicações internacionais sérias.
No país, temos excelentes revistas e sites informativos e analíticos,
se bem que temos também péssimas revistas e sites. Praticamente, não
existem canais de televisão e rádios interessantes, sob o ponto de vista
da comunicação confiável. As exceções que são feitas referem-se
exatamente aos canais estatais, que também têm áreas de jornalismo
contidas. Não opino sobre os canais de televisão e rádios, sob o ponto
de vista do entretenimento, porque este não é o tema, aqui. Quanto aos
grandes jornais impressos, são todos desinteressantes. Existem jornais
alternativos impressos de boa qualidade.
Um exemplo real de como os grandes veículos de comunicação da nossa
sociedade, dominados pelo capital, podem e conseguem desinformar ou mal
informar os cidadãos foi dado no dia 03/02/2012, através de um grande
jornal, em um artigo radical, no qual se pode ler que a Petrobrás está
atrasando o desenvolvimento do Pré-sal e deveria existir pressa para
esta produção acontecer, além de outras barbaridades. Se eu mandasse um
artigo em que os erros conceituais de tais afirmativas fossem expostos, o
tal jornal não o publicaria, por experiências passadas que tenho de
situações análogas.
Os grandes jornais impressos só apresentam, em editoriais e em
artigos, uma única posição para a política do petróleo. O tema
“royalties” veio a calhar para eles, porque alguma divergência de
pensamento é mostrada, quando se trata de apenas uma questão dentre
tantas tão importantes do setor. Assim, os jornais tradicionais, devido
às suas subordinações ao capital, principalmente internacional, não
promovem um “debate público de idéias”, só dizendo meias verdades e
inverdades, omitindo a verdade.
A falta de democracia na disseminação de informações fidedignas,
parte da democracia política, leva à constituição, em última instância,
do Brasil do analfabetismo funcional, da má distribuição de renda, da
exploração entre classes, de um mundo político corrupto, enfim, das
nossas mazelas. São muitos os conceitos errados difundidos pela mídia
para possibilitar a exploração da sociedade. São tantos e repercutem
tanto que não seria exagero chamar a luta pela democratização da
comunicação de massas como a “mãe de todas as lutas”.
- - - - - - - - - - - - - - - - - -
Paulo Metri, Engenheiro. Mestre em Engenharia Industrial. Trabalhou
na FINEP, no MME, na FAPERJ, na ANP, na INB e, atualmente, trabalha na
Comissão Nacional de Energia Nuclear. É diretor técnico do Clube de
Engenharia e conselheiro da Federação Brasileira de Associações de
Engenheiros.