Domingo, 22 de março de 2015
Da Tribuna da Internet
Carla Kreefft
Carla Kreefft
Ninguém é eternamente responsável por aquilo que cativa, como
quiseram e ainda querem ensinar aos pequenos. Da mesma forma, ninguém
pode ser punido eternamente por um mesmo erro. As penas devem ser
cumpridas integralmente, e ponto final. Depois do cumprimento, o que
deve ficar é liberdade. Da mesma forma, quem nunca foi punido por seus
tropeços nunca terá a absolvição – seja de si própria ou da sociedade.
A Lei da Anistia brasileira é um bom exemplo disso. O que aconteceu
durante o período do governo militar, marcado por forte repressão,
prisões arbitrárias, torturas e assassinatos, nunca foi investigado
adequadamente pelo poder público. Somente agora, com o instituto da
Comissão da Verdade, é que o assunto vem à tona de forma efetiva.
Os defensores da lei afirmam que não há motivo nenhum para abrir
investigação em relação aos crimes das Forças Armadas naquele período. É
como se a legislação já tivesse caráter punitivo. Mas a única “punição”
que os agentes da ditadura tiveram até o momento foi o esquecimento.
Esse mesmo contra qual a Comissão da Verdade luta bravamente.
MEMÓRIA TRISTE
Trata-se de um trabalho de reconstituição de uma memória triste e
dolorida. Muito já se perdeu pelo tempo, ficou trancado no sofrimento
silencioso dos sobreviventes da época, que, agora, buscam uma
sinalização de reparação. Não é apenas uma questão financeira, aliás, é
muito mais do que isso, trata-se de devolver a dignidade a cidadãos
brasileiros que foram condenados à morte e sentenciados à tortura sem
nenhum julgamento. Seus destinos foram decididos pela vontade dos
agentes da ditadura – senhores e donos do poder.
A realidade é que essa triste passagem da história do Brasil ainda é
um ponto obscuro e, à medida que aqueles sobreviventes envelhecem e
morrem, mais oculto ficará. Talvez essa obscuridade seja o motivo pelo
qual, com tanta facilidade, brasileiros ainda vão para as ruas pedir
intervenção militar. Os jovens, certamente, não têm memória. Também não
aprenderam na escola nada sobre o golpe militar e suas consequências.
Até há bem pouco tempo, o golpe era tratado como revolução de 1964 nos
livros didáticos.
ESQUECERAM 64?
Agora, fica uma pergunta. Se os jovens não sabem o que aconteceu, os
brasileiros com cerca de 50 anos ou mais – muitos deles nas ruas,
clamando pela intervenção militar – se esqueceram de tudo aquilo? Por
que esses, atualmente, senhores e senhoras defendem algo que fez tão mal
ao país quando jovens eram? Onde eles estavam? Ou, talvez, o que fazem
hoje que os leva a pedir ditadura militar?
Todos têm que ir para as ruas quando insatisfeitos. Protestar é ato
democrático. Protestar para acabar com a democracia é o quê mesmo?