Terça, 24 de
março de 2015
Michèlle
Canes - Repórter da Agência Brasil
Os casos de assassinatos de jovens negros no Brasil foram
tema central de audiência pública da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA). O debate aconteceu em
Washington, nos Estados Unidos, na última sexta-feira (20), quando foram
abordadas denúncias de diferentes regiões brasileiras.
“Temos inúmeros casos denunciados pelos centros de Defesa da
Criança e do Adolescente (Cedeca), e a gente achou importante dar visibilidade
e pedir que a comissão faça recomendações ao governo brasileiro, no sentido de
adotar medidas para coibir essa violência que, na maioria das vezes, é
provocada por agentes públicos do Estado”, disse Denise Campos, membro da
coordenação colegiada da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e
do Adolescente (Anced), que participou da audiência.
Pedro Pereira, também da Anced, diz que os números de
assassinatos têm crescido no país. “A própria Anistia Internacional lançou uma
campanha, em novembro de 2014, divulgando a informação que de 30 mil jovens
entre 15 e 29 anos assassinados no Brasil, em 2012, 77% eram negros”. Segundo
Denise, duas organizações da sociedade civil participaram da audiência: a
Justiça Global, que tratou de temas como ou autos de resistência; e a
Quilombola X, que tratou do racismo. Ambas defendem que o governo brasileiro
precisa ter respostas mais efetivas para combater o racismo e conter as mortes
da juventude negra no país.
O debate teve a participação do governo brasileiro,
representado pelo secretário de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria
Especial de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Ronaldo Barros. Segundo ele,
o governo vem implantando ações como o Plano Juventude Viva, que inclui 44
projetos para diminuir a vulnerabilidade da juventude negra. “Não há demora [na
implementação de ações], há a necessidade de aperfeiçoar os mecanismos. O
Estado não está de olhos fechado para essa situação, e tem feito ações tanto no
Executivo, quanto no Judiciário e no Legislativo”. O secretário citou também a
assinatura de protocolo de redução de barreiras de acesso à Justiça e oficinas
junto a agentes públicos para combater o racismo.
Denise ressalta que apesar de o governo ter reconhecido o
problema das mortes, ainda é preciso colocar em prática ações mais concretas.
“Eles falaram sobre o Plano Juventude Viva, que tem uma série de ações, e a
própria comissão chamou a atenção do governo porque, na verdade, tem que
apresentar ações mais concretas. Ações que realmente se traduzam em questão
eficaz, e não ficar só no debate. Reconhecer é importante, mas não é
suficiente”. Ela conta que alguns pontos foram debatidos, como a
desmilitarização da polícia e os chamados autos de resistência.
“Nós estamos em período de ajustes, e não em período de
resolução imediata, e a gente espera que os novos ajustes, com ações
afirmativas – cotas, trabalho decente para as trabalhadoras domésticas –
consiga realmente incidir nesse índice de letalidade existente”, disse o
secretário. Para ele, o período de implantação das ações do plano ainda é curto
para poder avaliar se houve ou não eficácia na redução das mortes, e reforça
que os mecanismos precisam ser ajustados para serem cada vez mais eficientes.
Ronaldo Barros disse que a CIDH vai fazer um conjunto de
recomendações para que o governo brasileiro tenha ações não só na esfera do
monitoramento, mas também na incidência direta sobre o controle externo da
polícia, com promotorias específicas para melhorar a acessibilidade do jovem
negro à Justiça. Para ele, o problema precisa ser debatido também na sociedade,
e a participação dos movimentos sociais é importante para por as ações em
prática. Segundo o secretário, a audiência é um espaço para debater um assunto,
não significa um processo para o país.