Quarta, 22 de maio de 2013
Por Fernanda Melchionna
A Organização das Nações Unidas (ONU) lançou um programa, no dia 13 de
maio deste ano, para estimular o consumo de insetos para combater a fome
no mundo. Interessante é que a mesma organização em recente estudo,
traz que pela primeira vez na história, não existe escassez da produção
de alimentos em âmbito mundial e que a produção existente hoje, seria
suficiente para alimentar 12 bilhões de pessoas. Ora, como então 18
milhões de pessoas morrem por ano pela falta de alimentos? Ou seja, mais
pessoas do que as que moram numa cidade como São Paulo perdem a vida
por fome anualmente.
No mesmo dia em que a ONU lançou seu programa, o sociólogo suíço Jean
Ziegler, em debate na própria cidade de São Paulo apontou as raízes do
problema: as sociedades extremamente desiguais como expressão do modo de
produção capitalista e sua concentração. Ele afirmou que 10 empresas
controlam a produção de 85% dos alimentos de base comercializados no
mundo. Diz ele “O poder político dessas empresas foge ao controle
social. 85% dos alimentos de base negociados no mundo são controlados
por 10 empresas. Elas decidem cada dia quem vai morrer de fome e quem
vai comer”. Sem contar a concentração da terra na mão de grandes
latifúndios e a utilização da mesma para a produção de combustíveis,
mesmo quando temos 1 bilhão de pessoas que passam fome no mundo.
O mais grave é a especulação financeira nas Bolsas de Valores, que
fez com que, em tempos de crise econômica do capitalismo, aumento do
desemprego e piora das condições de vida dos países atingidos
centralmente pela mesma, o valor dos alimentos aumentasse
vertiginosamente e se dificultasse o acesso e o consumo a eles.
É evidente que falar em “deliciosos gafanhotos e suculentas baratas”
disfarça o problema de fundo que é a concentração da produção e da
distribuição de alimentos nas mãos de pouquíssimas empresas
capitalistas, que na mesa de jantar de suas famílias certamente não
degustam escorpiões à milanesa. Longe disso, no afã de aumentar seu
capital, ainda especulam com o feijão e o arroz de cada dia na Bolsa de
Valores como se estivessem num cassino. Ou pior, chegam a botar formol e
ureia no leite para ganhar mais!
Os mesmos que “embelezam” o fato milhões de pessoas serem obrigadas a
comer insetos como única forma de ingerir nutrientes necessários à
vida, são os que estão consumindo os recursos naturais de forma
irracional e insustentável. Na imensa coleção de mercadorias que eles
pretendem transformar o mundo, tudo pode ser motivo de negócios:
direitos, pessoas e até mesmo comida. O capitalismo como forma de
organizar a vida está cada vez mais provando sua falência. No entanto,
os que ganham com ele, para manter seus privilégios, avançam sobre os
direitos sociais e trabalhistas.
Certo é que o capitalismo não será superado por constatar sua própria
falência, a tendência é que, para manter as taxas de acumulação,
aumente a exploração sobre os trabalhadores do mundo. Certo também, que
por ser uma forma específica de organização social, é também possível
superá-lo. Somente a partir de suas próprias forças é que a maioria da
população pode buscar o controle sobre a economia e a política, e é
preciso lutar por isso.
Como disse Ricardo Antunes recentemente em Porto Alegre, as janelas
de construção do futuro estão abertas, para tempos melhores ou para
tempestades. Ideias como a da ONU reforça a nossa indignação, ao mesmo
tempo movimentos anticapitastalistas no mundo nos enchem de esperança.
Que a nossa geração consiga construir esta ponte entre a indignação e a
esperança para que um dia a produção seja para garantir as necessidade
de todos e não para a lógica perversa do lucro privado de alguns. Como
diria Karl Marx sobre o socialismo “de cada qual, segundo sua
capacidade, a cada qual, segundo suas necessidades”.
Fernanda Melchionna é vereadora do PSOL em Porto Alegre e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal