Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 21 de maio de 2011

Obama e Palocci


Sábado, 21 de maio de 2011 
Por Ivan de Carvalho
Enquanto percorria alguns sítios da Internet para me informar do desastroso discurso do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, sobre a concordância que quer de Israel para que retorne “às fronteiras de 1967” como base para a criação de um estado palestino, em certo momento deparei com uma futrica, dessas que nem no Oriente Médio surgem, mas somente no meio político brasileiro.

            A futrica dizia que o escândalo detonado por matéria do jornal Folha de S. Paulo sobre o crescimento admirável do patrimônio de Antonio Palocci, durante os quatro anos em que o petista foi deputado federal e ex-ministro da Fazenda, deixara felizes diversos e importantes correligionários seus, animados com o presumido constrangimento ou enfraquecimento político do atual ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República.


            A futrica chegava ao detalhe de dizer, assim como se isso nada tivesse a ver com o resto da história, que o ex-chefe da Casa Civil do governo Lula, José Dirceu, a pessoa mais influente no PT depois de Lula (ainda segundo a futrica), tem andado muito sorridente.


            Ora, isso não deve ser verdade, pois Palocci e Dirceu são correligionários, ambos petistas históricos e de elite (elite petista, que isso fique bem claro, pois aqui não se intenta qualquer futrica) e foram colegas de ministério no governo Lula. Na verdade, enquanto ambos estiveram no governo, eram os dois ministros mais influentes e importantes, Dirceu dando as cartas no setor político e Palocci na economia. Depois os dois deixaram o governo, cada qual por seus próprios motivos, que não menciono por desnecessidade, pois a nação bem os conhece, mas não se tem notícia de que hajam brigado.


            Além disso, a ânsia nacional pela futrica pode ter levado a um erro de observação ou de interpretação. É que o ex-ministro José Dirceu, para se esconder dentro do Brasil dos olhares indesejados do regime militar, fez uma cirurgia plástica que lhe deu uma fisionomia sorridente, mesmo quando nenhum dente está aparente. Ele é sorridente, não está andando sorridente por aí.


            Mas, encerrando esta digressão, passando da pequena à grande política e voltando ao assunto lá do começo, Obama conseguiu eliminar Osama, mas – por métodos totalmente distintos e com intenções opostas, obviamente – fez o trabalho do inimigo vencido. Pois se Obama quer fomentar o desentendimento no Oriente Médio, excluindo as já quase nulas possibilidades de paz entre Israel e os palestinos, com suas organizações apoiadas por alguns Estados belicosos, a exemplo da Síria e do Irã, ele está conseguindo. Osama ficaria entusiasmado com isso.


            Israel não admite, em nenhuma hipótese, um acordo pelo qual tenha de voltar às fronteiras anteriores ao conflito árabe-israelense de 1967, conhecido como “a Guerra dos Seis Dias”. Isso implicaria, em primeiro e mais importante lugar, entregar Jerusalém oriental (a antiga Jerusalém). Isso Israel não faz. Até Jesus deu-se ao trabalho de avisar (ao traçar um quadro de guerra sem paz ali, no Final dos Tempos, que “Jerusalém será a pedra pesada”, vale dizer, aquela que não se conseguirá remover para chegar à paz).


            Israel, que declara Jerusalém sua capital “eterna e indivisível”, também insiste em “fronteiras seguras”, o que implica em preservar assentamentos judeus na Cisjordânia (que biblicamente eram Judéia e Samaria) e acertar a situação nas colinas do Golan, estratégicas em relação a um eventual ataque da agressiva (até hoje) Síria.


            O discurso de Obama alterou o quadro de um modo que deixou Israel sem alternativa – tem que dizer não. E isso é o avesso de qualquer acordo.
- - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.