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(Millôr Fernandes)

domingo, 24 de maio de 2020

É preciso tornar obrigatório o registro público de gravidez

Domingo, 24 de maio de 2020
Por
Salin Siddartha*

O sistema registral situa-se no âmbito jurídico da manutenção da ordem, pois sujeita um controle dos atos da vida civil, ao criar a presunção da veridicidade do que ali é declarado, além de ser formalidade necessária à constituição do próprio Direito. Assim, o registro público confere autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos.
O Brasil continua a prescindir de dados exatos a respeito de sua população, e é evidente a falta de controle da quantidade de gestantes em nossa nação por parte do Estado; então, resulta imperativo estabelecer um mecanismo que permita às autoridades sanitárias tomar conhecimento da totalidade de grávidas do País. Ademais, tendo o legislador omitido a obrigatoriedade de consignar civilmente a gravidez, deduz-se disso tudo a necessidade de tornar obrigatório o Registro Público de Gravidez, incluindo-o no Código Civil Brasileiro.
Detecta-se a omissão legislativa pelo fato de, embora o mesmo Código Civil, em seu artigo 2º, dispor que
A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
ele não o cumpre, porém, na parte tocante aos registros públicos, contemplados no artigo 9º, que se revela omisso quanto à salvaguarda dos direitos do nascituro, dificultando, assim, o exercício dos direitos daquele que vai nascer. Esse é um dos motivos pelos quais seria muito bem vindo o acréscimo de um inciso V ao artigo 9º daquele Código, de forma tal que assegure o Registro Público de Gravidez, porque, ao asseverar melhor domínio do quadro das gestantes, o Estado possibilita não só proteção à mulher grávida, mas também aos nascituros, especialmente a quem se encontre em situação de abandono social e desamparo econômico.
Logo, urge que o Congresso Nacional, por intermédio de seus parlamentares, ou o Poder Executivo, por meio do Presidente da República, encaminhem proposição legislativa capaz de preencher essa lacuna em nosso ordenamento jurídico, porquanto ser um legado de benefícios à saúde materno-infantil. A nova redação que pode ser inclusa no artigo 9º da Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro) teria o condão de corrigir a distorção legislativa que já apontamos e, consequentemente, preservar os interesses das parturientes e dos futuros rebentos provenientes do parto.
De mais a mais, o controle e salvaguarda da vida desde a concepção que a notificação obrigatória exercitaria permitiria ao Brasil conhecer realmente quantos poderão ser seus novos filhos a vir à luz da Nação. Inclusive tal registro público instituiria a compulsão de respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual enuncia, em seu artigo 8º, que
É assegurado (…) às gestantes (…) atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde.
Indo, desse modo, ao encontro do “caput” do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, que estabelece a proteção constitucional à vida. Nesse sentido, a garantia do atendimento após o parto dirimiria muitas das dificuldades com que o Estado se defronta na área da saúde pública.
Também seria possível acrescer, no mesmo Projeto de Lei, parágrafo(s) que contemplasse(m) o estabelecimento de um cadastro das gestantes que sirva de base para o planejamento de ações de assistência pré-natal, tais quais encaminhamento à unidade de saúde, atenção à saúde do recém-nascido e da mãe, programar vacinação e medidas indispensáveis para a armazenagem de células-tronco a ser retiradas do cordão umbilical. O cadastramento da gestante poderia ser feito mediante preenchimento de formulário contendo informações que fossem imprescindíveis para suprir o que urgisse como exigência a essas ações. Ele garantiria vários benefícios, anuindo uma planificação com relação à gestante e a seus filhos por parte da União, dos Estados e dos Municípios, a fim de possibilitar que gozem do direito à saúde e à assistência médica. Tal melhoria no atendimento da mãe e do recém-nascido seria um grande avanço que o cadastramento obrigatório de gestantes legaria para o desenvolvimento de políticas de assistência à saúde.
Quanto ao Registro Público de Gravidez, uma vez transformado em lei, passaria a ser obrigatório no momento em que fosse constatado o estado de gestante da paciente nas unidades de saúde. Visando ao assentamento desse Registro, seria emitido um atestado de gravidez a partir do qual teria lugar o referido Registro Público.
Atualmente, a gravidez pode resultar em assumir dificuldades. A inclusão da mulher gestante em um registro “ad hoc” ativará um protocolo que lhe permitirá acompanhar bem sua gravidez, principalmente no que tange às gestantes adolescentes desamparadas ou em situação de rua, traduzindo-se em uma mais bem resolvida proteção com base na informação oportunizada pelo cadastramento obrigatório. Desse modo, desde a notificação compulsória ensejada por essa oportuna proposta legislativa, tornar-se-ia provável, por exemplo, que fossem aprimoradas as políticas sociais e sanitárias, melhorando, com isso, diversos indicadores demográficos e epidemiológicos.
Conclui-se, então, que a criação de um Registro Público de Gravidez, seria de suma utilidade para que o Estado viesse a arcar com seu trabalho de cuidar da saúde, além de ajudar no planejamento de políticas de armazenamento de células-tronco, retiradas do cordão umbilical, com o intuito de avançar no estudo de biotecnologia e no desenvolvimento de pesquisas científicas, a fim de obter meios de cura mais viáveis e eficazes.
Fica aqui a sugestão para nossos Senadores e Deputados Federais ou para o Poder Executivo Federal colocarem mãos à obra a fim de prestar um relevante serviço reclamado pelo nosso País.
Cruzeiro-DF, 23 de maio de 2020
SALIN SIDDARTHA
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*Este artigo foi publicado originalmente hoje (24/5) no site https://porbrasilia.com.br/