Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 20 de junho de 2017

Sindicatos fazem pressão: A Falácia do Instituto Hospital de Base. Futuro está em jogo

Terça, 20 de junho de 2017
Do Blog do Sombra
Sindicatos fazem pressão: A Falácia do Instituto Hospital de Base. Futuro está em jogo
A proposta é inconstitucional, equivocada nas premissas e nas conclusões e oferece muito mais riscos que vantagens.
Por ANA VIRIATO-Correio Braziliense 
Futuro do Hospital de Base está em jogo

Executivo escala tropa de choque para garantir a aprovação de projeto que transforma o maior centro médico público do Distrito Federal em instituto. Já opositores, sindicalistas e servidores prometem resistência para barrar a polêmica proposta

Por ANA VIRIATO-Correio Braziliense

Um dos projetos de lei mais polêmicos do ano, a criação do Instituto Hospital de Base (IHBDF) será o principal tema da pauta de hoje da Câmara Legislativa. De um lado estão a base aliada e o alto escalão do GDF, que defendem a aprovação do projeto, classificado como a chave para a concessão da autonomia necessária ao maior centro médico da rede. Do outro, há críticas por parte de oposicionistas, sindicatos e especialistas em saúde pública, os quais apontam os riscos da experiência, como a formação de um cabide de empregos e a abertura de brechas para fraudes. Em plenário, a votação promete ser apertada e o debate, longo. Mas, pelas contas nos bastidores, o Palácio do Buriti deve levar a melhor.


Se aprovado o projeto, a gestão do Hospital de Base (HBDF) passará para uma pessoa jurídica, sem fins lucrativos. O centro médico, no entanto, continuaria público e o custeio, com um orçamento de R$ 550 milhões, responsabilidade do Estado. Referência em tratamentos de trauma, o Base seria comandado pelos Conselhos Administrativo (com nove membros) e Fiscal (com três integrantes) e pela Diretoria Executiva.

Embasado pelas diretrizes descritas na proposta, o governo promete acabar com a burocracia que rege o setor em Brasília — onde a compra de materiais pode levar anos — e promover, assim, um atendimento mais ágil e eficaz. Apesar das facilidades pontuadas, a proposição preocupa especialistas em saúde pública.

Presidente do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes), Ana Costa afirma não haver justificativa técnica para isolar o HBDF ao submetê-lo a um regime próprio de gestão. “Para o SUS, é extremamente nocivo, porque, mais uma vez, há um encastelamento de um centro médico de referência de uma rede que deveria funcionar de forma horizontal”. E acrescenta: “O que precisamos é desenrolar o trâmite dos pedidos na Secretaria de Saúde, onde uma decisão tem de passar por 20 mesas.”

O descontentamento entre especialistas, contudo, não é unanimidade. Promotor de Defesa da Saúde, Jairo Bisol afirmou ser necessária a mudança proposta pelo GDF. “No modelo centralizado atual o hospital está entrando em colapso diante dos olhos de todos. Deixar como está será uma grande irresponsabilidade. A única saída para o Base na situação atual da Secretaria de Saúde é descentralizar, dar autonomia administrativa e orçamentária ao hospital, com ferramentas de gestão mais ágeis. É o que propõe claramente o projeto”, defende.

Votação

Quarta-feira, quando foi adiada a votação sobre o instituto, o debate durou pouco mais de quatro horas. Desta vez, as discussões devem demorar mais. Antes de apreciar a proposta em primeiro e segundo turnos, os distritais terão de avaliar 23 emendas de plenário. A galeria estará lotada de sindicalistas de, pelo menos, sete categorias ligadas à Saúde. O GDF classifica como “certos” 10 votos e pretende abocanhar outros três. Há dois indecisos, que não estão nas contas do Palácio do Buriti. A oposição ao projeto conta com nove parlamentares, dos quais dois não estarão presentes. Entre as iminentes costuras, alguns acreditam que o pleito não seja concluído hoje.

Líder do movimento oposicionista, Celina Leão (PPS) discursará pela reprovação ao projeto. De acordo com a parlamentar, “a experiência é muito arriscada para ser aplicada primeiramente ao maior hospital de Brasília”. “Há inúmeras evidências de que esse modelo de gestão não funciona. Um exemplo é o Maranhão”, disse referindo-se ao desvio de R$ 1 bilhão dos recursos da Saúde no estado maranhense, provocado pelo Instituto de Desenvolvimento e Apoio à Cidadania, responsável por seis unidades.

O governista Agaciel Maia (PR) rebateu as alegações. “O sistema de fiscalização será mais rígido. O sistema de compras ficará mais eficaz e ágil, e a contratação de pessoal respeitará os requisitos legais.”

Tira-dúvidas
Respostas da Secretaria de Saúde do DF

Os funcionários terão metas diárias ou mensais?
Os formatos das metas serão definidos pelo Conselho de Administração.

O atendimento contará com 
servidores públicos e contratados sob o regime da CLT? 
Conviverão no Hospital de Base os dois regimes de contratação. Os atuais servidores que optarem por permanecer no hospital seguirão no mesmo regime que rege o serviço público. Os novos serão contratados em regime seletivo definido no Manual de Contratações pela CLT.

A carga horária dos novos 
funcionários será diferenciada?
Respeitará o determinado nas Convenções Coletivas.

A remuneração dos funcionários da mesma área será igual?
O contrato de gestão fixará níveis de remuneração de acordo com os valores de mercado de cada categoria. Os salários dos servidores públicos são definidos pela lei. Não há como determinar se os vencimentos serão iguais.

Como funcionará a nomeação dos servidores aprovados em concursos públicos anteriores?
De acordo com uma emenda apresentada pelo deputado Júlio César (PRB), poderá haver uma reserva de 30% das vagas na primeira contratação para os que foram aprovados no último concurso. Os certames não foram feitos especificamente para o Hospital de Base, mas para a Secretaria de Saúde. Os aprovados serão aproveitados nos demais espaços da rede de Saúde. O Base terá processo seletivo próprio.

Como a Secretaria de Saúde, com mecanismos próprios, 
realizará a fiscalização 
dos contratos e do pessoal?
A lei prevê a criação de um Conselho Fiscal e a contratação de auditorias externas. A Subsecretaria de Administração Geral também ficará responsável por fazer a fiscalização por parte da Secretaria de Saúde e enviar seus relatórios aos órgãos de controle.

O projeto prevê a celebração de contratos com quaisquer 
pessoas físicas e jurídicas 
sempre que o Instituto considerar necessário. Quem fiscalizará os vereditos, antes do firmamento de compromissos, para evitar possíveis direcionamentos?
O Manual de Contratações que será criado estabelecerá a forma de contratação. A fiscalização do cumprimento dessas normas será feita pelos mecanismos de controle.

Outras cidades que colocaram institutos à frente da 
administração de centros 
médicos fecharam as portas 
para alguns tipos de atendimentos. Todas as especialidades do Base
 permanecerão disponíveis ?
Em nenhum local onde se adotou o modelo de Serviço Social Autônomo – que é o modelo do Sarah Kubitschek, houve fechamento de serviços. Não há a menor intenção de se fazer qualquer alteração no serviço oferecido pelo Hospital de Base.

Como fica o Hospital de Base após a aprovação do projeto?
Só começará a funcionar integralmente como Serviço Social Autônomo nas regras definidas pela lei a partir da assinatura e vigência do seu contrato de gestão. Essa é a última fase do processo.

Por que o Base foi escolhido 
para esse modelo de gestão?
Porque é uma unidade de referência. Um ganho de eficiência no Base impacta em todo o restante do DF. Se fosse escolhido um hospital regional, só aquela região seria afetada e perceberia os benefícios.

Sindicatos fazem pressão
Sindicalistas e servidores prometem muito barulho contra a criação do Instituto Hospital de Base, que será votada hoje, na Câmara Legislativa. Para garantir mais gente, categorias anunciam a paralisação das atividades em todas as unidades de saúde

Por THIAGO SOARES

Como ocorreu em outras oportunidades, profissionais pretendem lotar as galerias da Câmara Legislativa

Mesmo com a garantia do Governo do Distrito Federal (GDF) de que o Instituto Hospital de Base (IHBDF) beneficiará o atendimento na maior unidade hospitalar da capital do país, os sindicatos da área de Saúde permanecem contrários à proposta. Eles prometem lotar hoje a galeria da Câmara Legislativa (CLDF), durante a votação em primeiro e segundo turnos da preposição que autoriza a constituição da organização. Os servidores de ao menos sete categorias devem paralisar as atividades em todas as unidades de saúde do DF, a partir da 13h. Só serão mantidos em totalidade os serviços de pronto-atendimento e as unidades de terapia intensiva. Para garantir a adesão da maioria dos funcionários públicos, algumas entidades vão garantir o transporte por meio de ônibus até a sede do legislativo. A concentração no plenário está marcada para as 14h. Tudo para aumentar a pressão sobre os distritais.

O HBDF é referência na residência de universitários da área. A criação do IHBDF é apontada por sindicalistas como uma ameaça ao serviço. “O projeto representa um risco de fechamento da residência clínica, uma vez que, do ponto de vista financeiro, não se compensa mantê-la”, afirma Gutemberg Fialho, presidente do SindMédico. Ele ressalta a possibilidade de fechamento de outros serviços na unidade de saúde. Diz que o projeto enviado pelo GDF à CLDF não garante o funcionamento da atual estrutura. “Os atendimentos de baixo custo poderão ser terceirizados ou até repassados a outros hospitais da rede pública. O fechamento do Pronto-Socorro é o que mais tememos.”

O governo alega que, com a criação do instituto, será garantida autonomia para compra de medicamentos, equipamentos e contratação de pessoal para o HBDF. No entanto, os sindicalistas defendem que essas aquisições já seriam possíveis, uma vez que toda a rede pública de saúde se encontra em estado de emergência. São quase dois anos e meio desde o primeiro decreto de emergência pelo GDF. “A desculpa para a constituição do projeto é desburocratizar, mas, nesse período de emergência, eles podem comprar sem licitação e não o fazem. Não é o instituto que vai resolver a questão de compras de materiais”, reclama o vice-presidente do Sindate, Jorge Viana.

Outro receio de servidores e sindicalistas é que o IHBDF tenha o mesmo fim do Hospital Regional de Santa Maria, apesar de, na época da crise (veja Memória), a unidade se tratar de uma Organização Social, diferentemente da proposta atual do GDF.

MEMÓRIA

Experiência ruim

Um acordo de janeiro de 2009 fez do Hospital Regional de Santa Maria a primeira unidade de saúde pública administrada pela iniciativa privada no DF. Mas a Real Sociedade Espanhola Beneficência, responsável pela unidade, virou alvo de investigações do Ministério Público.

O contrato valeria até janeiro de 2011. O GDF deveria repassar R$ 222 milhões à entidade. Porém, quatro meses depois da terceirização do HRSM, o MP considerou o contrato ilegal, por não ter havido uma licitação.

A liminar atrasou a inauguração e proibiu o repasse de qualquer recurso público para a execução do contrato. Mas o governo cassou a liminar e deu continuidade ao processo de terceirização, interrompido em 2011, quando o GDF retomou a unidade de saúde. Foi constatado também que a instituição deixou de prestar atendimentos conforme especificado em contratos. 


Artigos

Público. Gratuito. Autônomo. E mais eficiente

» Humberto Fonseca, secretário de Saúde

Em tempos de crise econômica, como a que atravessamos, torna-se mais desafiadora a tarefa de garantir saúde pública gratuita e de qualidade, como preceitua a nossa Constituição.

Em todos os estados, os gestores buscam modelos mais modernos e mais adequados à velocidade da saúde pública. É isso o que estamos propondo para o Hospital de Base. Dar não só a autonomia e a independência tão desejadas, mas proporcionar também os instrumentos para resolver com eficiência os problemas que hoje dificultam seu bom funcionamento.

O modelo de Serviço Social Autônomo, proposto no projeto de lei que cria o Instituto Hospital de Base, é usado com sucesso na gestão da Rede Sarah. O que se propõe é a adoção de uma ferramenta de gestão mais moderna, igualmente legal e controlada pelos órgãos de fiscalização, que garanta de forma mais efetiva a velocidade e a eficiência necessárias ao bom atendimento de saúde à população. Não se trata de venda, privatização ou terceirização, uma vez que o controle do Instituto segue sendo integralmente da Secretaria de Saúde e do Governo do Distrito Federal. O Hospital de Base continuará sendo 100% público, 100% gratuito, 100% SUS. E não haverá “porta fechada”. O hospital continuará atendendo com todas as portas que hoje lá existem igualmente abertas. Em todas as especialidades que hoje também lá existem. Continuará sendo um hospital terciário. Seguirá sendo a referência no atendimento de trauma.

O Hospital de Base apenas disporá de ferramentas mais ágeis para impedir que faltem medicamentos, materiais, equipamentos e pessoal para os atendimentos. Vai ampliar os atendimentos, desbloquear leitos e realizar todo seu potencial! Trata-se, portanto, de um avanço. Nesses momentos de crise, é preciso coragem para fazer as mudanças necessárias.

A Falácia do Instituto Hospital de Base

» Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador do Ministério Público junto ao TCU 

A proposta é inconstitucional, equivocada nas premissas e nas conclusões e oferece muito mais riscos que vantagens.Quando a administração resolve descentralizar alguma de suas unidades, o faz pela via da autarquia ou da fundação pública, regidas pelo direito público, observando a lei de licitações e os concursos públicos, garantidores da impessoalidade e da meritocracia nas contratações. Pretender vestir a “roupa” de serviço social autônomo numa entidade que, por sua própria natureza, integra a administração pública do DF é tentar fraudar a Constituição para fugir de seus controles, que visam concretizar os princípios da moralidade e da impessoalidade.

Agilidade e flexibilidade muitas vezes são buscadas como meio para agilizar e facilitar não a gestão, mas a corrupção e a captura política da instituição como cabide de emprego. Quem quiser se habilitar à condição de gestor público tem que fazê-lo segundo as normas da Constituição. Gerir uma rede de saúde não é tarefa simples, mas não impossível. A proposta de transformação do HBDF em serviço social autônomo é uma confissão de incapacidade gerencial da saúde. É como se o problema da saúde fosse apenas o regime jurídico dos servidores e o regime de compras e contratações pela Lei 8.666. 
De fato, a saúde no DF tem problemas de gestão, mas não necessariamente de modelo de gestão. Tanto pelo modelo da administração direta, como pelo modelo de fundação ou autarquia, formas canônicas de prestação de serviços públicos, ela pode ser prestada com qualidade e agilidade. Afirmar que a mudança de modelo transformará a saúde como vara de condão é enganar a população. 

Para quem é competente e bem-intencionado, o formato da administração direta, autárquica ou fundacional não é obstáculo para a boa gestão. Para quem é incompetente ou mal intencionado, o formato da iniciativa privada facilitará o roubo do dinheiro público e a prática de nepotismo. Enfim, não temos nada a ganhar com isso.