Redação
Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
09 de fevereiro de 2025Se estivesse vivo, Apolônio de Carvalho completaria 113 anos neste domingo (9). O histórico militante comunista nasceu em Corumbá (MS) e faleceu em 23 de setembro de 2005, aos 93 anos. Sua larga trajetória se confunde com a luta pela democracia.
Integrante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) até os anos 1960, ele fundou o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) em 1968, propondo a luta armada contra a ditadura militar. Em fevereiro de 1980, Apolônio assinou a primeira ficha de filiação do Partido dos Trabalhadores (PT).
O tenente-general participou da Aliança Libertadora Nacional (ALN) na década de 1930, e atuou como combatente na Guerra Civil Espanhola (1936-39) e na Resistência Francesa contra a ocupação nazista (1942-44).
Nesta memorável entrevista ao Brasil de Fato, conduzida por Igor Felippe Santos e Maíra Kubík Mano em agosto de 2005, ele traça orientações à esquerda, avalia o papel dos movimentos sociais e do primeiro governo Lula, além de explicar sua visão sobre o socialismo como uma forma superior de democracia, discussão que continua atual duas décadas depois.
"Democracia não apenas no sentido das bandeiras da Revolução Francesa, como liberdade, fraternidade e igualdade", ponderou. "A igualdade será produto de uma longa luta entre as classes que querem um mundo melhor, e as classes que têm receio de um mundo melhor, e querem guardar sua ligação com um presente muito próximo do passado."
Apolônio destaca ainda a importância da responsabilidade, especialmente entre os jovens, na luta por uma sociedade mais justa e igualitária, e a crescente participação das mulheres nesse processo.
Confira abaixo a entrevista na íntegra.
Essa entrevista histórica integra o livro "É Preciso Coragem para Mudar o Brasil", publicado pela editora Expressão Popular em 2006 e que reúne uma série de conversas com grandes nomes do campo popular, publicadas nos primeiros anos do Brasil de Fato. Este projeto de resgate da memória do nosso jornalismo é uma parceria com a Expressão Popular.
O tenente-general Apolônio Pinto de Carvalho, nascido em 9 de fevereiro de 1912, em Corumbá (MS), foi, sobretudo, um grande brasileiro que o país perdeu em 23 de setembro de 2005. Foram 93 anos de idade e mais de 60 anos de militância comunista. Sua trajetória se confunde com a história da luta pela democracia e, particularmente, da esquerda no Brasil. Para a entrevista, 30 minutos, foi o que sua companheira, Reneé de Carvalho, concedeu à reportagem, feita no dia 19 de agosto. Mesmo esses poucos minutos foram suficientes para ele reafirmar que o socialismo é a forma superior de democracia. E explicar por quê
Brasil de Fato – Que lições os movimentos de esquerda podem tirar do século 20?
Apolônio de Carvalho – Sou um velho militante, não de cultura tão ampla assim, nem dotado de capacidade de resumir ou fazer uma espécie de balanço desse quase um século que estou vivendo. Continuam as realidades de desigualdade e injustiças sociais, que vêm dos séculos anteriores. Convido vocês a fazer um passeio muito longo, desde a minha adolescência. Já nos anos 1920 do século passado, sentíamos o protesto do povo contra as arbitrariedades dos governantes, o desprezo pelas reivindicações e os desejos do povo. E sobretudo contra o contraste e as injustiças sociais. Iniciei a minha prática social antes da prática política, através dos movimentos sociais que pregavam a luta pela democracia, pelas liberdades e pela soberania nacional. Nós fomos sempre dominados pela pressão dos monopólios externos e internos. Deve ter sido difícil em outras épocas. Mas particularmente na nossa é difícil quando as contradições sociais se avolumam e se aguçam profundamente. Por exemplo, estamos saindo do século 20, que foi o mais cruel e contraditório de todos os séculos recentes. Todos os contrastes aguçados, uma sociedade marcada por duas guerras, terríveis extremos de pressão, genocídios racistas. Marcada por uma série de rebeliões e uma série de ditaduras militares e civis. No Brasil, 43 anos foram marcados por ditaduras militares ou civis. Mesmo assim, nosso povo foi abrindo caminho para a democracia. E os jovens, e depois os menos jovens (os que sendo velhos acreditam que a velhice é apenas a juventude amadurecida), continuamos na luta, que está cheia de promessas.